Home TVTemporadas Crítica | Doctor Who – 4ª Temporada (2008)

Crítica | Doctor Who – 4ª Temporada (2008)

por Luiz Santiago
1,4K views

Após o término da 4ª Temporada de Doctor Who, creio que todo espectador e fã da série buscou através do tempo e do espaço uma palavra que definisse com exatidão este ano do show. A conclusão imediata é que a Temporada foi simplesmente épica, e que tanto os episódios regulares do ano, quanto os Especiais, principalmente o duo End of Time, onde temos, ao término, a regeneração do 10º para o 11º Doutor, são verdadeiras pérolas da Nova Série. Pela grande quantidade de surpresas, aparições especiais e situações inusitadas, a temporada se tornou um presente para os whovians, considerada por muitos a melhor fase do show desde o retorno, em 2005.

O fato é que Russell T. Davies e os outros produtores resolveram dar uma finalização poderosa para a Era do 10º Doutor, e, tendo em vista a regeneração e a mudança de Executivos, criaram uma temporada que fosse um grande evento e que tivesse, desde os primeiros episódios, a essência de “fim dos tempos”. Além disso, não houve medo algum no uso de easter eggs através dos episódios, o que certamente deu uma riqueza monumental à temporada, ampliando as histórias e costurando narrativas entre companions, locais do planeta Terra e através do Universo.

Temos aqui o retorno de Donna Noble à vida do Doutor, a noiva do Especial de Natal de 2006. Cansada do marasmo de seu dia a dia, ela resolve pesquisar e investigar todas as coisas que possivelmente poderiam ter a ação de alienígenas; situações onde provavelmente poderia reencontrar o Doutor. No primeiro episódio da temporada, Partners in Crime, a dupla se desencontra o tempo inteiro em uma série de situações, apesar de estarem geograficamente muito próximos. No decorrer da temporada, percebemos que essa ligação de encontros e desencontros entre Donna e o Doutor tinha um motivo vital para ambos e para a própria humanidade.

Após a chegada dessa nova companion e a resolução do caso envolvendo os simpáticos Adiposes (situação na qual já vemos os adesivos da ATMOS nos carros, algo que entenderíamos melhor em The Sontaran Stratagem), a aventura começa a ganhar contornos bastante perigosos. Um exemplo disso é o incrível episódio acontecido em Pompeia, primeiro porque traz o tema da profecia sobre o futuro, elemento recorrente nessa temporada; e depois porque demarca uma modificação psicológica muito evidente no Doutor. Donna já havia notado isso por ocasião dos bebês Adiposes, mas a volta do Time Lord para buscar a família em Pompeia – quebrando a sua regra nativa de “não interferir nos eventos fixos” – foi uma prova definitiva dessa mudança de perspectiva e modo de olhar o mundo ou a própria História. Essa mudança o faria agir de maneira similar em The Waters of Mars, resultando numa interferência que teria um resultado desastroso.

Ainda em The Fires of Pompeii temos duas presenças importantes para o futuro de Doctor Who. A primeira delas é uma das profetisas de nome Soothsayer, interpretada por Karen Gillan, que dois anos depois voltaria à série como Amy Pond, no episódio The Eleventh Hour (2010). A outra presença é a do ator Peter Capaldi, que vive Caecilius, o chefe da família que o Doutor salva. Em 2013 o ator seria anunciado para o mundo como o 12º Doutor, aparecendo pela primeira no famoso cameo de regeneração, no Especial de Natal 2013.

Talvez por estar perto do fim de sua vida, o Doutor tenha se tornado menos egoico e mais afável, com exceção dos seus momentos de luta em que há vidas inocentes em jogo – nesse caso, sua raiva o empurra para direções de profunda ira, com resultados nada amigáveis. E sobre essa diferença entre os momentos comportamentais do 10º Doutor, poderíamos citar a facilidade com que o seu Metacrise explode os Daleks em Journey’s End, uma prova de que ao “nascer” e sem a companhia de alguém para barrá-lo, ele pode ser um viajante bastante perigoso e violento, nada parecido com o alienígena que vemos ao final da temporada. E só para citar mais uma coisa que nos indica a modificação no comportamento do Doutor, e ainda, mais uma revelação de profecia, falaremos dos eventos na Esfera Ood.

Muita gente considera os Oods vilões, opinião da qual não compartilho. Essas criaturas são bastante sensíveis psicologicamente (como os Sensorites, da Série Clássica), e após a modificação que sofreram pelas mãos dos humanos, tornaram-se influenciáveis ou manipuláveis, declarando-se até como “nascidos para servir”. Todavia, são originalmente dóceis e agradecidos a quem lhes fazem o bem. O cântico que compõem para o Doutor e para Donna, e a presença de um deles olhando pelo Doutor nos momentos finais antes da regeneração, são coisas realmente tocantes e provas irrefutáveis da índole original desses seres. E para constar: Murray Gold faz um trabalho de grande beleza na trilha sonora das canções dos Oods, com uma melodia bastante triste, mas ao mesmo tempo inspiradora. Cantada e tocada nos episódios, elas complementam a escala de beleza e emoção para esses momentos.

Outros bons momentos envolvendo personagens ou criaturas “curiosas” nessa temporada poderiam ser comentadas mais detalhadamente, porém, o texto ficaria ainda maior, por isso vou apenas citá-las: os Hath, aquelas criaturas boníssimas e bem feias, sendo que um deles chega a dar a vida para salvar Matha Jones de um atoleiro; a filha do Doutor, Jenny, que dispensa qualquer comentário, tamanho o impacto que a personagem tem sobre espectador e o modo como ela “termina”; e o avô de Donna, que é companheiro do Doutor em sua “última viagem”.

Parênteses sobre um fato curioso: Georgia Moffett, a atriz que interpreta Jenny em The Doctor’s Daughter, é esposa de David Tennant, o 10º Doutor, que nesse episódio interpretada seu pai. Mas não acaba aí. Georgia Moffett é na verdade filha de Peter Moffett, mais conhecido pelo seu nome artístico: Peter Davison. Como sabemos, Davison esteve em Doctor Who, de 1981 a 1984, onde interpretou o 5º Doutor. E uma coisa legal acontece: quando Jenny aparece na tela, a sua primeira fala, numa direção quase que diretamente para a câmera é: “Hello, dad!“. E agora, voltando à 4ª Temporada…

O que fica evidente para o público é que neste ano houve um extremo cuidado em relação aos roteiros, trazendo elementos que tinham como função abrir caminho para a despedida de Tennant no papel principal da série, sendo que alguns desses elementos novos voltariam nas temporadas seguintes, especialmente a enigmática e incrível River Song.

Antes de falar dos episódios finais, gostaria de escrever algumas linhas sobre The Unicorn and the Wasp, o episódio em que temos Agatha Christie como personalidade histórica visitada.

Embora eu tenha gostado bastante das histórias com Charles Dickens e William Shakespeare, o episódio com Agatha Christie foi uma verdadeira epifania para mim. Primeiro, porque consegui captar todas as indicações literárias, já que a autora é a minha favorita, e depois, porque o roteiro com a motivação alienígena veio coroar na verdade toda uma situação de mistério, que ao final do episódio, tem uma brilhante forma de resolução, um misto entre os métodos de Miss Marple (que na época ainda não existia nos livros de Christie) e Hercule Poirot. Definitivamente um dos meus episódios sobre artistas mais queridos da Nova Série (perdendo, pelo menos até agora, apenas para o de Van Gogh, na 5ª Temporada).

Há pessoas que odeiam esse episódio porque tem a abelha ou vespa gigante com seus horrorosos efeitos especiais. Nesse ponto concordamos que são horrorosos, mas… não estamos falando de Doctor Who? Antes da 7ª Temporada e especialmente na Série Clássica, a série não foi conhecida justamente por eles, que apesar de horrorosos tinham histórias tão boas que acabaram ficando bons?

O Fim

A situação começou a se estreitar para o Doutor no episódio Turn Left. O reaparecimento da profecia insinuada no planeta dos Oods, o maravilhoso trabalho com o paradoxo temporal e os toques extra-dimensionais de Rose Tyler já alertavam para um problema de grandes proporções que estava por vir. A certeza disso vem logo em seguida, no episódio The Stolen Earth, onde aparece Davros, o segundo vilão de Doctor Who de quem eu realmente tive medo (o primeiro foi Satã, que aparece na 2ª Temporada, no episódio em que há um planeta orbitando um Buraco Negro).

A batalha contra o medonho Davros e os Daleks foi uma das melhores que já pude ver na série até então, e já não guardava mais segredos sobre a morte futura do Doutor. Mas o melhor de tudo foi realmente a união de todas as forças possíveis para a salvação da Terra, e o crossover de DW com Torchwood e Sarah Jane Smith Adventures, suas duas spin-offs. Ver o Doutor, Donna Noble, Rose Tyler, Martha Jones, Jack Harkness, Sarah Jane Smith, Mickey Smith e Jackie Tyler dentro da TARDIS foi uma verdadeira epifania para mim. Jamais esperaria o encontro de personagens tão incríveis dentro da mitologia de Doctor Who, e como bônus, ter ainda o aparecimento de Gwen Cooper, Ianto Jones, Luke Smith e Harriet Jones! Com certeza, um dos momentos inesquecíveis de toda a Nova Série.

O díptico End of Time, exibido fora da programação corrente do show, foi literalmente um excelente final para a temporada e para o 10º Doutor. O cumprimento das profecias espalhadas por todas as aventuras, o reaparecimento do Mestre, o caminho para a canção final, tudo recebeu uma atenção mais que especial dos produtores, da equipe técnica e de David Tennant, cuja atuação foi tocante e selou com beleza e tristeza a sua partida, numa das mais brilhantes cenas de regeneração que já tivemos. Dávamos adeus a um Doutor e a uma Era dos quais nunca mais esqueceríamos.

Doctor Who – 4ª Temporada (UK, 2008)
Showrunner: Russell T. Davies
Roteiro: Vários
Direção: Vários
Elenco: David Tennant, Billie Piper, Freema Agyeman, Catherine Tate, John Barrowman, John Simm, Noel Clarke, Elisabeth Sladen, Julian Bleach, Bernard Cribbins OBE
Duração: 50 min. (cada episódio)

Você Também pode curtir

Este site usa cookies para melhorar sua experiência. Presumimos que esteja de acordo com a prática, mas você poderá eleger não permitir esse uso. Aceito Leia Mais