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Crítica | 120 Batimentos por Minuto

por Rafael W. Oliveira
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Antes de qualquer outra palavra, preciso deixar claro o quão duro foi analisar 120 Batimentos por Minuto de forma racional. Com um baque muito inesperado, o filme apresentou para este que vos escreve diversas situações em comum as quais fui obrigado a enfrentar não muito recentemente (algumas cenas quase como uma reprodução exata do que passei, JURO), e foi inevitável chorar e sofrer assistindo ao filme, que me arremessou numa reflexão sobre tudo o que eu havia encarado desde então. De qualquer forma, a análise que vocês lerão aqui tentará se ater, ao máximo, às especificidades puramente cinematográficas da obra, por mais que, inevitavelmente, muita gente deverá encarar 120BPM como um reflexo fílmico de suas vidas.

Num ano em que Pedro Almodóvar presidia o júri no Festival de Cannes (mas obviamente não apenas por isto), era esperado que 120 Batimentos por Minuto jamais saísse de mãos abanando. Agraciado com o Grand Prix e tendo ainda conquistado outros prêmios ao longo de sua jornada, o novo projeto do cineasta Robin Campillo (de Meninos do Oriente) é um olhar de ativismo, prevenção e clareamento sobre o grupo francês ACT UP, movimento formado nos anos 90 por jovens engajados na luta pela defesa e auto-prevenção da AIDS. É um ponto de partida simplista, porém tematicamente relevante, para que Campillo monte seu mosaico de personagens que servirão para a narrativa desnudar as diversas facetas da doença e suas facetas diante dos que a contraíram, assim como para os que não carregam o vírus. Para isto, Campillo faz de Nahuel Pérez Biscayart e Arnaud Valois os inevitáveis protagonistas da trama.

Correndo o risco de ser confundido com didatismo, Campillo não é econômico na verborragia que o filme toma para si a fim de explicitar aquela instituição organizacional encarada pela sociedade sob um ponto de vista marginal, de condenação, e logos nos primeiros planos de 120BPM somos bombardeados com diversas informações, rostos em cena e decisões já sendo discutidas/tomadas pelos integrantes do movimento, tudo com muita câmera na mão, iluminação natural, closes fechados e construção seca das cenas, uma urgência latente. Se tais opções estéticas e narrativas causam certo estranhamento de início, não demora para que Campillo clareie os rumos de suas ideias e revele seu filme como um retrato extremamente amplo do painel homossexual da época, que passeiam entre a inconformidade com o tratamento que os soropositivos recebem do governo, os embates que nascem entre si mesmos e a ininterrupta entrega aos prazeres carnais e aos sentimentos amorosos, sempre com a consciência dos cuidados a serem tomados.

Falando assim, fica a impressão de que 120BPM se assume como um mero filme panfletário e denunciativo da época, mas a habilidade do roteiro de Campillo ao lado de Philippe Mangeot é tão denso na representação das várias vertentes existentes e tão humano sobre os caminhos percorridos pelos personagens que o filme se torna igualmente relevante em termos cinematográficos. O olhar do diretor é isento de julgamentos, e se faz de todo o seu vasto conhecimento sobre cada forma de agir da organização para firmar seu panorama como uma recriação audiovisual de um momento importante na história da luta contra a AIDS, passeando entre a esperança e as perdas inevitáveis cruzarão tantos caminhos. Campillo enriquece seu filme com o despertar da emoção e comoção que apenas o cinema é capaz de extrair de uma história com tamanho alcance.

Claro que é questionável o quanto o diretor alonga seu filme mesmo depois de tudo já ter sido dito (num desejo de ser perfeitamente claro, talvez), e os 140 minutos se fazem sentir quando a repetição dos discursos trava a narrativa e o desfecho, óbvio porém não menos doloroso, causa menos impacto do que deveria, e o que era macro, nos instates finais, se torna micro. Mas enquanto obra de valor humanitário e de consciência social, 120BPM pode se fazer facilmente arrebatador para grande parte do público, e em tempos tão preconceituosos e intolerantes como o que vivemos, este é um filme que em sua realização consciente e cuidadosa, se faz necessário e comovente.

120 Batimentos por Minuto (120 battements par minute) – França, 2017
Direção
: Robin Campillo
Roteiro: Robin Campillo e Philippe Mangeot
Elenco: Nahuel Pérez Biscayart, Arnaud Valois, Adele Haenel, Antoine Reinartz, Félix Maritaud, Médhi Touré, Aloïse Sauvage, Simon Bourgade
Duração: 140 min.

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