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Crítica | 13 Horas: Os Soldados Secretos de Benghazi

por Matheus Fragata
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Apesar de condenarmos clichês mal utilizados, nós, críticos de cinema, cometemos clichês. Isso varia desde picuinhas com roteiristas ou diretores. Mas a modalidade favorita de muita gente que analisa cinema é falar mal de Michael Bay, com ou sem razão. Para mim, Bay é um diretor que oscila muito em sua qualidade. Parece ser um cara que se empolga tanto com seus projetos que os acaba estragando. Dando um hiato de sua péssima cinessérie Transformers, Bay volta a trabalhar com uma história baseada em fatos reais. Seu último filme desse nicho foi o impagável Sem Dor, Sem Ganho comédia de humor negro que eu recomendo, um dos meus guilty pleasures favoritos.

Em 13 Horas, Bay e o roteirista estreante Chuck Hogan trabalham em cima do livro de Mitchell Zuckoff sobre o ataque de terroristas contra uma espécie de embaixada americana provisória e ao complexo secreto da CIA em Benghazi, na instável Líbia pós-revolução. A narrativa centra justamente nas treze horas de ataques incessantes que seis soldados de operações especiais – SEALS e Rangers, tiveram que repelir enquanto aguardavam um socorro incerto.

Como em praticamente todos os roteiros dos filmes de Bay, o texto de 13 Horas é repleto de clichês. Porém, todos são funcionais e, segundo a produção do filme, necessários já que a principal proposta da longa é contar os fatos exatamente como eles ocorreram naquela noite fatídica de 11 de setembro de 2012.

Como todo bom filme de evento, circunstância ou disaster movie, temos uma enxurrada de personagens. Hogan até consegue fazer um trabalho decente com os dois protagonistas Jack Silva e Tyrone Woods centrando dramas familiares relevantes que tiram os soldados da superficialidade ao denotar como nenhum deles realmente queria estar no então local mais perigoso da Terra.

O filme pode ser encarado como duas partes. Temos a longa introdução para inserir os estabelecimentos de narrativa definindo heróis, antagonistas e seus dramas, além da apresentação de coadjuvantes e sugerir o conflito principal. Nisso, 13 Horas é um diferencial dos longas de Bay, pois o diretor aposta muito nesse longo primeiro ato que mesmo ágil, foge dos tiroteios habituais de seus longas. Essa primeira parte, aliás, é o que ele tem de melhor. A decupagem é boa, o roteiro se comporta com postura clássica, as atuações são satisfatórias, a trilha musical funciona bem.

Então, quando finalmente as treze horas de terror começam, o longa, pouco a pouco, vai perdendo sua força, apesar de contar com uma história poderosa e incomum. Dessa vez, Bay não é o único culpado. Chuck Hogan falha miseravelmente em tornar o jogo de sobrevivência em algo menos enfadonho e repetitivo. Boa parte do longo clímax se centra no confinamento dos soldados no complexo secreto da CIA, repelindo os ataques dos terroristas que chegam em ondas – exatamente como um modo horda presente em tantos videogames, além da similaridade com o clímax do ótimo Corações de Ferro.

Nisso, há a preocupação em definir os atos de bravura, estratégias, preocupação com munição e principalmente, no lance mais esperto do filme, na constante confusão dos soldados em reconhecer qual força armada é aliada ou inimiga já que a comunicação entre os grupos é dificultada. Ou seja, há uma atmosfera de paranoia eficiente, mas que poderia ser melhor aproveitada com toda a certeza.

Por conta do modo narrativo dessa escolha de tower defense, o filme passa a ficar monótono com a repetitividade dos eventos, tudo torna-se muito previsível e formulaico, infelizmente. Nas intermitências dos ataques, Hogan também não construir elementos relevantes limitando-se em massacrar seu roteiro com um festival sem fim de frases de efeito. 13 Horas consegue ter mais one liners do que Transformers: Era da Extinção. E olha que superar o trabalho esdruxúlo de Erein Krueger é difícil. Pelo menos esses diálogos de frases de efeito não são tão calhordas quanto os apresentados no último filme dos robôs alienígenas.

Somente em um trecho, há um bom diálogo entre Silva e Tyrone que definem o sentimento antiguerra e antipatriótico, afinal, mesmo com ações consideradas patrióticas, os soldados questionam a todo momento a razão do governo americano não responder tantos e tantos pedidos de socorro. Aliás, esse fato é muito controverso até hoje na política americana e assombra a candidatura de alguns presidenciáveis tanto que houve um frisson fora do normal sobre a repercussão que esse filme poderia trazer para eles. Por medo de processos ou “decência”, nomes de políticos ou responsáveis de alto escalão nunca são citados – também não faria sentido dentro da narrativa, menos mal.

Estranhamente, mesmo centrado em apenas um espaço de tempo curto, Hogan consegue tornar o filme em uma experiência muito fragmentada no início do longa. Não chega a ser confuso, mas incomoda. Ele também aposta em conflitos histéricos e caricatos. Sempre há a demonização do supervisor geral Bob e da agente secreta Sona. Os personagens são muito limitados e, também, repetitivos. Quando vemos um dos protagonistas entrar em conflito com algum deles pela enésima vez, é difícil não soltar uma bufada de impaciência. A verve cômica de Hogan também fracassa. O roteirista tenta quebrar a tensão com diversas piadas mal inseridas que mais prejudicam a experiência do que colaboram na construção de cena.

Assim como o roteiro inconstante, temos uma direção igualmente problemática por parte de Michael Bay mesmo que ele nos engane no início do longa quando sugere que seguirá uma linha mais racional como a de Sem Dor, Sem Ganho. Até o terceiro ato, Bay consegue manter uma qualidade superior na sua técnica. Sim, finalmente você poderá notar que ele é sim um diretor razoável com momentos bons.

Primeiro, sua técnica de gravação é um desafio tremendo de infraestrutura e lógica de planificação. Ao contrário do uso de câmera convencional em longas metragens que contam apenas com um aparato, Bay trabalha, sem exceção, com três câmeras. Logo sempre há três pontos de vista para diversos momentos do longa o deixando com uma abundância visual. O problema sempre é o purismo de Bay na montagem que tenta incluir ao menos um segundo de todos os planos dentro do filme.

Isso resulta na típica montagem frenética de seus filmes conferindo a aparência de um trabalho apressado e indelicado. De fato, Bay é mais estética crua do que algo refinado a la Fincher. Seus planos, em geral, não são elaborados visualmente limitando-se na função primaria da cinematografia: a exibição pura e simples. Porém, em alguns momentos, há um escape desse vício maluco de Bay. Em 13 Horas há uma preocupação em captar um material de cotidiano relevante que mostra detalhes de Benghazi e sua população. Em establishing shots, há até uma acuidade estética delicada que presenteiam nossa visão.

Assim como a loucura da decupagem em triple take aliada ao frenesi das três câmeras, Bay também ama gravar com steadicams usando a técnica da shaky cam, a bendita câmera nervosa – enquadramentos muito instáveis para refletir o estado de espírito do personagem ou da situação perigosa da qual ele faz parte. Aqui, a técnica também se faz presente, porém melhor utilizada. Aliás, há uma sensível melhora na compreensão da ação que ocorre em tela – algo que muita gente reclamava na franquia Transformers.

Bay aprendeu a definir melhor os eixos da ação e também conta com o auxílio de imagens aéreas feitas por drones para estabilizar os lados dos tiroteios. A própria natureza do conflito já ajuda a focar melhor o material gravado. Porém, ainda há momentos nos quais Bay força muito nosso raciocínio nos deixando perdidos em algumas explosões. Seu melhor momento fica restrito nas ótimas perseguições de carros nas ruas estreitas de Benghazi.

Cessando os reconhecimentos onde Bay de fato acerta, hora da parte mais divertida do texto: apontar as trapalhadas típicas do diretor. Quando o terceiro ato enfim chega, nós já estamos cansados de tanta frase de efeito e explosões para todos os lados. Mesmo tentando variar a última onda de ataques e até mesmo a encurtando, Bay deixa tudo insosso. O final do filme é incrivelmente chato, pois a ação é repetitiva. Pior, o diretor repete um plano sequência já utilizado em Pearl Harbor flertando com uma auto referência esdrúxula.

O pior erro de Bay reside em citar a ótima comédia Trovão Tropical. Toda a áurea ridícula do longa de guerra de Ben Stiller parece rondar o fim do clímax. A maquiagem certamente não ajuda em algumas mutilações, além da atuação do elenco pender muito para o caricato incluindo até mesmo o bom John Krasinski tornando toda aquela agonia da dor física e psicológica em algo tão histérico que chega a ser risível – claro, caso você lembre da performance afetada de Downey Jr. E Jack Black. Além disso há completa falta de sensibilidade do diretor em retratar um herói caído com o corpo intacto após um morteiro ter explodido a meio metro da cara do sujeito enquanto outros comparsas agonizam com suas mutilações e queimaduras. Isso prejudica muito o realismo que Bay tenta almejar.

Essa linha tosca de encenação e elenco já havia sido apresentada quando um personagem recebe uma notícia importante de sua mulher, porém nunca que eu imaginaria que Bay barbarizaria dessa forma justamente no momento mais importante do longa e da vida das pessoas retratadas.

Aliás, durante esse confinamento, sempre ele volta a ação no terreno batizado como Zumbilândia onde os terroristas chegam para metralhar os americanos. Nos diálogos, sempre um personagem diz que eles têm a vantagem já que possuem óculos de visão noturna. O problema é que o ótimo diretor de fotografia, Dion Beebe, enfia dois aparatos de iluminação gigantescos que iluminam o campo inteiro e além. Logo não faz o menor sentido o personagem se vangloriar daquilo já que é possível enxergar muito bem toda a linha de combate graças ao auxílio da cinematografia.

Apesar desse deslize chulo de Beebe, o cinematografista se apropria bem do estilo de iluminação e cor dos filmes de Michael Bay. Ainda temos forte presença de ruído alto, cores muito saturadas, ocasionais slow motions, iluminação dura e pontual, além dos muitos lens flares. No geral, é um trabalho visual satisfatório que tem mais a assinatura do diretor do filme do que propriamente do diretor de fotografia.

Além de errar, ocasionalmente, com a fotografia, o diretor também consegue tornar a satisfatória trilha musical de Lorne Balfe em algo incomodo e intrusivo. Os ritmos de temas mais acelerados dificilmente casam bem com as cenas, infelizmente. Entretanto, no lado positivo, sempre há a competência da mixagem e edição sonora dos filmes de Bay deixando as explosões e tiros mais vivos do que nunca. A experiência sonora neste longa é algo a ser destacado.

13 Horas é um filme que começa muito bem e gradativamente vai perdendo a sua qualidade até terminar mal. É uma pena, pois Michael Bay dava sinais no início que este trabalho seria mais autoconsciente e cuidadoso, afinal houve toda a dedicação da equipe e pesquisa em torná-lo algo crível, palpável e emocionante mesmo que nunca tente virar um estudo de geopolítica. Aliás, acho louvável como Bay se preocupa em tornar o longa em uma material apolítico centrando somente na vida dos soldados, sua agonias e temores.

Para os amantes de bons filmes de ação, este aqui é uma boa pedida, apesar de cansativo graças a longa duração que é mal equilibrada diante da repetição de situações ao decorrer da história. No fim, além do tranquilo hang loose favorável, o que prevalece é a promessa de que o diretor esteja se tornando alguém mais competente tanto na técnica quanto no conteúdo, pois a preocupação em deixar claro que a guerra é um conflito que não há vencedores é bem evidente. Eis que, enfim, Michael Bay caminha para uma fase mais interessante, adulta, em sua carreira bem-sucedida – financeiramente.

13 Horas: Os Soldados Secretos de Benghazi (13 Hours: The Secret Soldiers of Benghazi, EUA, 2016)
Diretor:
Michael Bay
Roteiro: Chuck Hogan adaptando o livro de Mitchell Zuckoff
Elenco: John Krasinski, James Badge Dale, Pablo Schreiber, David Denman, Dominic Fumusa, Max Martini, Alexa Barlier, David Costabile, Peyman Moaadi
Duração: 144 minutos.

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