Crítica | 300

por Rafael W. Oliveira
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Mesmo antes de conseguir levar a graphic novel 300 para as telas, Zack Snyder já havia manifestado o desejo de transformar a violenta obra de Frank Miller em um filme. Mas obviamente, os estúdios consideravam pouco apropriado transformar em celuloide uma história tão explosiva em termos de sanguinolência, o que inviabilizava o desejo de Snyder. Mas foi após a inesperada boa recepção do remake de Madrugada dos Mortos feita por Snyder que a situação mudou, e 300 pôde, enfim, alcançar a tela grande.

E a adaptação da HQ é, claramente, uma declaração apaixonada do realizador pela obra original. Snyder é extremamente fiel á brutalidade, verocidade e agressividade que marca a graphic novel de Frank Miller, utilizando para isto um visual arrojado e extremamente estilizado, de cores explosivas (o vermelho e o dourado reinam durante todo o filme) e nível de testosterona nas alturas. Aqui, Snyder viria a começar exercitar o estilo que o tornaria tão odiado e/ou amado: o uso constante de câmera lenta, visual grandiloquente, e um certo fetiche em explorar os corpos desnudos dos atores (algo que só viria a se repetir da mesma forma no incompreendido Sucker Punch – Mundo Surreal).

De trama pífia (um grupo de 300 soldados liderados Leônidas marcha em batalha contra o exército do ambicioso Xerxes), 300 é uma ode ao espetáculo, ao heroísmo e à poesia do sacrifício. É um épico regado com anabolizantes. Os soldados gritam, ferem, mutilam, e enxergam a glória nisso. Snyder ressalta isto através de sua câmera sempre meticulosa em exibir os detalhes mais sanguinolentos, onde seu slow motion, para muitos um artifício gratuito e desnecessário, exibe cada gota de sangue que é derramada no chão. Mais do que isso, Snyder faz questão de ressaltar as próprias armas utilizadas pelos soldados para conseguirem a vitória – e quando me refiro a “armas”, não me restrinjo apenas a lanças, espadas e escudos.

Um dos principais fatores que tornaram 300 uma obra tão divergente (impossível ficar indiferente à proposta do diretor) é a forma com que a câmera de Snyder namora os corpos impecavelmente esculpidos dos soldados, onde bíceps, tríceps e abdomens “sarados” são exibidos a todo instante, e tal exploração pode tanto fazer parte do olhar apaixonado de Snyder sobre a obra, quanto também pode indicar uma óbvia fascinação homoerótica sobre o corpo masculino. A resposta para tal indagação depende de cada espectador.

Mas obviamente, Snyder busca trazer reações inesperadas para o espectador, objetivo este que não se restringe somente ao uso da violência extrema. Vejamos, por exemplo, a figura de Xerxes, interpretado pelo brasileiro Rodrigo Santoro: alto, de voz cavernosa, com um corpo banhado à ouro que também é coberto de piercings e correntes, cílios e sobrancelhas impecavelmente bem delineados, a imagem de Xerxes causa uma fascinante estranheza desde o primeiro momento de sua aparição, numa contraponto a excitação (ao menos para as mulheres e alguma parcela dos homens) que os corpos esculturais dos soldados provocavam.

Com suas imagens provocantes (sejam de violência, sejam de sexo), Snyder cria uma espécie de ligação entre o filme e seu público, que certamente reagiram de alguma forma a tudo o que é exibido. É impossível passar incólume. O diretor desafia os sentidos e ultrapassa o limite do bom senso a uma construção tradicional de narrativa, tudo em prol da singularidade da experiência. E quando lembramos do icônico grito de Leônidas (“This is Sparta!”), notamos que Snyder, de uma forma ou de outra, atingiu seu objetivo.

300 (idem, EUA, 2007)
Roteiro: Zack Snyder, baseado na graphi novel de Frank Miller
Direção: Zack Snyder
Elenco: Gerard Butler, Rodrigo Santoro, Lena Headey, David Wenham, Dominic West, Michael Fassbender
Duração: 117 min.

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