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Crítica | (500) Dias com Ela

por Gabriel Carvalho
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“Esta crença originou-se pela exposição precoce a triste música pop britânica e uma total má interpretação de A Primeira Noite de um Homem”

Contém spoilers.

Comédias românticas com protagonistas masculinos tendem a seguir uma estrutura narrativa predeterminada. Jovem fracassado, porém apaixonado, conhece garota dos sonhos. Jovem apaixonado, porém atrapalhado, acaba fazendo com que garota dos sonhos se apaixone por ele. Garota dos sonhos e jovem apaixonado vivem uma linda história de amor. Um obstáculo surge e então, jovem apaixonado e garota dos sonhos passam por um conflito comum. Enfim, a incrível história de amor encontra uma conclusão. A óbvia, transposta em boa parte da filmografia de Adam Sandler. E a menos óbvia, mas ainda sim frequente, pseudo subversão da conclusão, ou seja, jovem apaixonado e garota dos sonhos seguindo caminhos diferentes. A subversão do gênero, de fato, seria uma abordagem não usual do desenvolvimento da relação, propondo em diversos casos uma discussão mais profunda acerca dos caminhos que os personagens da obra tomam.

(500) Dias com Ela é, no caso, uma perfeita exploração de um relacionamento mal sucedido. Por tal, o filme permite com que um espectador que tenha passado por uma decepção amorosa sinta-se em casa. Na trama, somos apresentados a Tom Hansen (Joseph Gordon-Levitt), jovem fracassado, porém apaixonado, que se encantou por Summer (Zooey Deschanel), sua garota dos sonhos. Os dois acabam namorando, até que ela termina o relacionamento, por nenhum motivo aparente, fazendo o mundo daquele jovem sonhador desabar. A narrativa então começa no ducentésimo nonagésimo dia desde que Tom olhou pela primeira vez os olhos azuis e brilhantes de Summer. No fatídico dia do término, Rachel (Chloë Grace Moretz), após ser chamada pelos amigos de Tom, é encarregada de ir para a casa de seu irmão mais velho, conversar com ele e entender o que de fato aconteceu. Somos jogados para dentro de memórias anteriores, e a história daquele casal recomeça no seu primeiríssimo dia. Garoto conhece garota.

Fugindo de uma narrativa linear, os 500 dias de Tom com Summer são expostos de forma dispersa, deixando a história ainda mais palpável, orgânica. Sem em nenhum momento, porém, confundir os espectadores frente à cronologia dos acontecimento, essa jogada inteligente funciona de modo a manipular seus olhos perante a situação e, principalmente, deixá-los ainda mais indignados com Summer, o par romântico do protagonista e antagonista mor do filme. Pelo menos, supõe-se um antagonismo, visto que o argumento tem mais para expor do que um simplório preto no branco. No mesmo passo, o diretor Marc Webb é extremamente competente em tornar Tom um protagonista simpático. Após a primeira noite de sexo dele com Summer, surge um extraordinário número musical que expressa muito bem a alegria que o personagem está sentindo. Lúdica, a sequência tem no seu final um abrupto contraste com o futuro nada alegre no qual o personagem de Joseph Gordon-Levitt encontra-se agoniante, acabado; digno de pena.

“Como eu vou saber se você não vai acordar amanhã e pensar diferente?”

Sendo assim, após a inventiva e belíssima abertura, ao som de Us, de Regina Spektor, o diretor nos presenteia com várias montagens que fogem do convencional. A presença de um narrador (Richard McGonagleé eficiente, verbalizando alguma situações que precisavam ser verbalizadas, sem as deixar, no entanto, expositivas. Adiante, é com o término da relação que Tom consegue, mesmo sem querer conseguir, superar, mesmo sem querer superar, a presença, e consequente, saída de Summer de sua vida. Reencontrando-a, em uma ocasião inesperada, todos aqueles sentimentos retornam. Bons momentos são brevemente vivenciados. Sem entender sinais, Tom é convidado para uma festa pela garota, e toda a chama do jovem apaixonado, sonhador e atrapalhado retorna. A montagem conflituosa entre as expectativas e a realidade, nua e crua, é dolorosamente amarga, mas honesta. Tom é um romântico, convicto de que quando o coração ama alguém, aquilo é destinado a ser amado para sempre, e principalmente, amado por ele. Tom está equivocado.

A interpretação do público, considerando a intenção da obra, é mais direcionada para o que se passa na mente de Summer, e não para o que se passa na mente de Tom, a qual já nos familiarizamos de cara. Por que ela teria deixado Tom amá-la tão intensamente se não compartilhava do mesmo sentimento? E por que ela teria criado novas expectativas ao garoto se a realidade não se equivaleria a elas? A resposta é tão simples de ser entendida quanto complexa de ser absorvida. Os bons momentos que os dois tiveram realmente existiram. A paixão existiu. Mas aquilo não seria para sempre. Summer desconfiava disso, enquanto Tom, jovem apaixonado, que um dia interpretou A Primeira Noite de um Homem errado, não. Por que aquele garoto seria diferente de todos os outros amantes que ela já tivera? Um dia a resposta veio. Para ela. O exímio diálogo final entre a garota dos sonhos e o jovem apaixonado amarra as pontas deixadas, complementando o discurso da história, que se finaliza com a descoberta de uma nova estação.

O longa, infelizmente, não consegue conciliar os personagens coadjuvantes com a história principal, sendo que Rachel, a irmã mais nova de Tom, poderia ter sido simplesmente descartada, sem oferecer muito à obra, senão como um artifício da narrativa. A exceção à regra está na cena na qual é apresentada diferentes concepção de amor, por diferentes personagens, como McKenzie (Geoffrey Arend), Paul (Matthew Grey Gubler) e Vance (Clark Gregg). Nela, uma boa jogada é feita com esses coadjuvantes, apresentando uma metalinguagem que se reapresenta em uma graciosa conjuntura de pequenas interações de Tom com filmes que ele está assistindo no cinema. Referencia-se assim desde o icônico Charlie Chaplin, ao filme de Ingmar Bergman, O Sétimo Selo. Um espetáculo à parte. Além disso, é importante notar que reside-se no longa o clichê da importância da garota dos sonhos para a criação de uma nova perspectiva profissional, que no caso seria a saída de Tom da empresa de confecção de cartões, para a entrada do garoto no ramo arquitetônico; seu sonho. Contudo, nada que ofusque o brilho do resto da obra.

“Tom finalmente aprendeu que não existem milagres. Não existem coisas como o destino. Nada está destinado a ser. Ele sabia. Ele tinha certeza disso agora.”

Puxando bastante de Noivo Neurótico, Noiva Nervosa, (500) Dias com Ela é uma celebração dos amantes apaixonados, das músicas pop, dos filmes românticos, dos poemas romancistas. Não é uma história de amor, em seu aspecto mais juvenil e pueril. É uma história sobre relacionamentos e como bons momentos continuam a ser bons momentos, mesmo que eles não possam mais serem criados com a mesma pessoa. In My Life, do grupo britânico The Beatles, comenta sobre uma vida repleta de amores e amigos. A canção fala de como esses amores e amigos, foram todos amados, e tiveram seus momentos em seus respectivos lugares, alguns ainda existentes e outros não. Lugares que a memória ainda consegue se lembrar. O afeto pelos que já se foram – vivos ou mortos – continua, apesar de que agora, há um novo alguém no qual o amor é maior do que todos os anteriores. O amor se recria, como se fosse algo novo, surgindo do nada, assim como o outono surgiu do verão.

(500) Dias com Ela (500 Days of Summer) — EUA, 2009
Diretor: Marc Webb
Roteiro: Scott Neustadter e Michael H. Weber
Elenco: Joseph Gordon-Levitt, Zooey Deschanel, Geoffrey Arend, Chloë Grace-Moretz, Matthew Gray Gubler, Clark Gregg, Patricia Belcher, Rachel Boston, Minka Kelly, Richard McGonagle
Duração: 95 min.

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