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Crítica | A Árvore dos Tamancos

por Guilherme Rodrigues
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A imagem conjurada inicialmente pelo título A Árvore dos Tamancos é um tanto exótica, e parece prometer uma produção com ares de fantasia, talvez algo inspirado no realismo mágico. Mas a obra do diretor Ermanno Olmi, lançada em 1978 e vencedora da Palma de Ouro em Cannes, vai pelo caminho contrário, já que o longa está concentrado no no real.

Tanto que o letreiro logo após o nome do diretor informa “interpretado pelos habitantes do interior de Bergamo”, ou seja, temos aqui mais uma obra do cânone do neorrealismo italiano, mesmo que distante cronologicamente do auge do movimento. O longa acompanha quatro famílias camponesas no final do século 19 que habitam uma fazenda no interior da Itália, elas ocupam aquele espaço devido a um acordo com o senhorio: tudo que ali é produzido deve ser dividido com ele.

Não há aqui uma história devidamente estruturada, já que o foco é menos em uma trama e sim no cotidiano dessas pessoas, que estão ali mais para representar a totalidade da existência camponesa do que seres individuais, já que muito mal nos é dito seus nomes. Os nomes existem, é claro, mas não há é feito questão de evidenciá-los. Observamos essas pessoas realizando cada um de seus afazeres, entre o trabalho e os momentos de lazer.

Para isso, Olmi aposta em uma linguagem semi documental, que busca imprimir o mínimo possível de estilização na imagem do filme. É uma câmera sempre recuada, que aposta em planos médios e abertos, que permitem que as situações diante dela simplesmente transcorram, dando ênfase ao quão trabalhosas são as atividades em cena. É um filme de planos longos, que se preocupa em retratar em todo o processo de plantar tomates ou uma ida até a cidade, por exemplo. Uma situação dessa envolve três ou quatro planos longos, em que é possível sentir o tempo passando.

Essa decisão de preservar o tempo e o trabalho em cena é presente até nas situações menos “idílicas” relacionadas a vida do campo, como a longa sequência em que os camponeses abatem um porco, com direito aos guinchos do animal inundando a cena. A fotografia mais aberta também serve para mostrar a natureza comunal dessas atividades. Ninguém faz nada sozinho e raramente está só. Seja para matar um animal ou nos momentos de lazer, em que todos se reúnem para contar histórias e fofocar.

Mesmo que o grosso de A Árvore de Tamancos seja esse aspecto rotineiro da vida do campesinato, há, aqui e ali, algumas pequenas histórias relacionadas a alguns dos personagens, como o romance entre um jovem casal, a tentativa de curar uma vaca doente ou a preocupação de um pai com o calçado que o filho usa para ir às aulas. Apesar de algumas serem interessantes e até mesmo divertidas, como a aliança entre um avó e a neta para plantar tomates fora de época, a abordagem estética acaba resultando em certo afastamento dos momentos mais dramáticos. É difícil se preocupar com situações particulares em uma obra tão pautada pelo coletivo, pelo universal. Uma pena que esse aspecto não seja tão bem integrado ao todo, já que é justamente nessas situações “menores” que o filme melhor explora a fragilidade da situação daquelas pessoas.

A seu modo, A Árvore de Tamancos remete um pouco a Amarcord, em sua estrutura mais focada em mais focada no geral do que na especificidade, construindo um retrato daquela época, de uma comunidade. Mas enquanto Fellini se apoiou no aspecto da memória para sua obra, Olmi está interessado em nada menos que o real, da maneira mais “sem filtro” que ele puder.
A Árvore de Tamancos (L’Albero degli zoccoli, Itália – 1979)
Direção: Ermanno Olmi
Roteiro: Ermanno Olmi
Elenco: Luigi Ornaghi,Francesca Moriggi, Omar Brignoli, Antonio Ferrari, Giuseppe Brignoli,Pasqualina Brolis, Giuseppina Langalelli
Duração: 186 min.

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