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Crítica | A Barraca do Beijo 3

por Iann Jeliel
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A Barraca do Beijo 3

  • Contém SPOILERS. Confira aqui as críticas de todos os filmes da trilogia.

A Barraca do Beijo virar uma trilogia é certamente um dos grandes mistérios da humanidade. No entanto, longe do que a má vista prévia do gênero adolescente e qualidade dos antecessores indicava, fui aberto a seu terceiro capítulo como vou a qualquer outra continuação: sem julgamentos precoces ou pretextos de que elas já começam ruins ou abaixo do que veio antes por serem continuações, genuinamente esperando que A Barraca do Beijo 3 oferecesse seu conteúdo próprio com qualidade, nem que fosse no simples divertimento jovial, que ao menos o primeiro entregava de modo minimamente envolvente. Mas se as ideias do diretor e criador Vince Marcello já eram escassas lá, e só tiveram uma sobrevida por uma polêmica extra filme a respeito da abordagem de relacionamento tóxico do seu casal principal, Elle (Joey King) e Noah (Jacob Elordi), forçando o segundo a corrigir isso, este agora simplesmente não tem o que contar. Nessa falta, o roteiro retroativamente repete o que os outros propunham, contradizendo-os e tirando qualquer chance de coerência da obra enquanto trilogia.

A primeira metade é basicamente dedicada a cenas dos jovens curtindo a vida adoidado – Ferris Buller que me perdoe por estar o mencionando na crítica de um filme desses… –, mas diferentemente do primeiro, em que se tinha uma atmosfera colegial contagiante pelo jogo dinâmico da montagem, aqui, essa mesma linguagem não só não funciona mais como esvazia o momento de descontração por atropelamento rítmico. Mesmo o segundo, que acho tenebroso por decisões temáticas, tinha uma organização de storytelling com mínima base estrutural colocada pela edição dinâmica geradora de conflitos, seja os dramáticos ou os burlescos. Aquela competição de dança no fliperama, em que Elle treinou ao longo da história e através dela alimentou sua paixonite por Marco (Taylor Zakhar Perez), que gerava o embate com Noah. Enfim, havia algo. Aqui, essa base poderia ser a lista de afazeres para a protagonista e seu melhor amigo, irmão do seu namorado, Lee (Joel Courtney), cumprirem antes do dito “último verão” em que estariam juntos, afinal, a faculdade batia na porta, mas boa parte dos afazeres daquele papel passa rapidamente num videoclipe que mal dá para estimular com a “ostentação” colocada, que já acaba.

Bem como não temos o proveito da premissa inicial, do “trisal”, junto a Rachel (Meganne Young), namorada de Lee, terem a casa de praia, onde viveram boa parte das memórias de infância, somente para eles fazerem as festas que quiserem e curtirem à vontade, sem restrição dos pais ou de qualquer adulto no meio do caminho, essas últimas férias antes da iminente separação de cada um para o seu futuro. Ainda que sejam bastante vergonha alheia os poucos momentos em que A Barraca do Beijo 3 realmente se entrega à cafonice da vivência do sonho de juventude em sua condição financeira mais alta – com ênfase de quase não ser assistível, na cena da corrida de Mario Kart e na dança à la High School Musical em restaurante de luxo –, preferia que o filme assumisse esse caráter antiquado e “prosa ruim” em toda a duração, porque é algo condizente com sua proposta de início, ao invés de investir por necessidades de ser um “fechamento de trilogia” na compreensão e relevância inexistente dos dramas cheios de frescura dos seus personagens.

O problema não está nem na inutilidade dos arcos – afinal, digo sempre isso, tratando-se de mentalidade adolescente, o tom de exagero e dramatização de problemas fáceis é parte fundamental para o espectro comunicacional desses com a geração do momento -, mas no modo como o filme se posiciona como maduro e não consegue ser em nenhum momento. Uma maturidade vinda de viradas escancaradamente óbvias, usando processos que já acabaram e não faziam sentido em voltar. De novo, temos a amizade contra o namorico, seja entre Noah e Lee ou entre Noah e Marco, com Elle tendo que decidir qual dos irmãos ela vai querer acompanhar para escolher sua faculdade, e o outro honestamente não tem explicação, porque já tinham colocado Marco na friendzone no anterior, para que reciclar algo já resolvido? Nem para ter o mínimo de evolução ali, demonstrando que é possível ser amigo de um caso, “ex” ou algo do tipo. Não, é de novo a mesma coisa, uma paixão que não será correspondida e nem ameaça ser, só deixa Marco mais inútil na trama, tendo que ouvir chororô de Elle com raivinha do pai (Stephen Jennings) por ter um interesse romântico que ela não vai com a cara, sem poder “pegá-la” e ainda deixando Noah morrendo de ciúmes, que era para ele já ter superado a esta altura do campeonato.

Desperdiçou um filme inteiro para esse rapaz evoluir e deixar de ser o “machão” tóxico para neste já querer voltar a brigar sem motivo nenhum com Marco. Chloe (Maisie Richardson-Sellers), a amiga negra à qual o texto finge que liga dando uma subtrama que ninguém liga, ela triste com os pais se separando, até o aconselha da mesma forma que antes, se confia na namorada, não tem por que ter medo ou ciúmes da traição. Se Elle não tinha motivos para não querer algo diferente de amizade com Marco, não importa a “maldosa” intenção dele, se ele gosta dela ainda ou não, ela não queria nada mais e pronto, era suficiente, mas não, o filme realmente coloca de novo essa rivalidade masculina pela posse da mulher como mote de conflito, entre eles e entre o casal, e ainda tem a pachorra de colocar a independência de Elle como resolução para a climática de tudo ao final. Ora, se Noah achava sua namorada tão independente assim a ponto de apoiar a decisão final de escolher a faculdade por conta própria – sério que demorou três filmes para ela chegar nessa conclusão? E ainda pela sogra? Molly Ringwald, o que você foi fazer nesses filmes?! –, por que ele não confiou nela desde o princípio dessa ocasião?

Mesma coisa vale para Lee, “chateadinho” que a amiga só está querendo fazer a lista deles de infância para compensar uma decisão que ela já tomou de ir com o namorado para a faculdade, descumprindo uma promessa que fizeram quando pequenos, mas ele parecia compreensível num primeiro momento – e tinha que ser, afinal, ele passou o anterior no mesmo dilema com a sua namorada –, o que teoricamente poderia dar credibilidade para o “arco” de independência de Elle em cuidar da própria vida dentro da A Barraca do Beijo 3, isoladamente. Contudo, convenientemente ele resguarda isso, para num determinado momento de sucessão de “tragédias” na vida da protagonista, jogar na cara dela, gratuitamente – isso é que é amizade! Fica difícil para qualquer espectador simpatizar com ele, Elle ou qualquer outro personagem, especialmente porque, como manda o figurino, tudo vai acabar bem, porque “assim é a vida”. Dito e feito, em um epílogo, A Barraca do Beijo 3 ignora as consequências dadas pelo clímax, fornecendo de brinde outra conexão forçada com o local que dá título ao filme – a tal da Barraca do Beijo – e retirando completamente o peso já não existente na tentativa de finalizar a história em tom melancólico, “realista” e aparentemente corajoso.

O problema pior não é contradizer isso com um salto temporal, finalizando de maneira clichê e romântica à la contos de fadas, mas ter terminado assim sem os personagens evoluírem em nada no percurso, ficando do mesmo jeito que começaram. A longa jornada deles é absolutamente em vão, desnecessária, sem nem ter o benefício do impacto emocional da última nostalgia aos tempos “perfeitos” da adolescência dos dois, porque, repito, o filme não aproveita isso direito enquanto pode. Os aprendizados finais, como a própria afirmação de Elle enquanto mulher, não soam como progresso, mas como algo que sempre esteve ali e por escolha ou esquecimento não foi usado. Quando foi lembrado, já era tarde, e incrivelmente faz com que A Barraca do Beijo 3 seja uma conclusão alheia à própria ideia da trilogia, se é que se pode dizer com tantas incoerências que ela tinha alguma, afinal. Aliás, tem: ser exponencialmente mais constrangedor a cada filme. Espero que este seja a última tortura.

A Barraca do Beijo 3 (The Kissing Booth 3 | EUA, 2021)
Direção:
 Vince Marcello
Roteiro: Vince Marcello, Jay Arnold (baseado na obra de Beth Reekles)
Elenco: Joey King, Joel Courtney, Jacob Elordi, Molly Ringwald, Taylor Zakhar Perez, Maisie Richardson-Sellers, Meganne Young, Stephen Jennings, Carson White, Morné Visser, Bianca Bosch, Camilla Wolfson, Zandile Madliwa, Judd Krok, Sanda Shandu, Hilton Pelser, Frances Sholto-Douglas, Evan Hengst, Joshua Daniel Eady, Trent Rowe, Michelle Allen, Nathan Lynn, Byron Langley
Duração: 132 minutos

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