Home TVTemporadas Crítica | A Bela e o Padeiro – 1ª Temporada

Crítica | A Bela e o Padeiro – 1ª Temporada

Uma divertida série sobre doces, amor e relacionamentos familiares.

por Leonardo Campos
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Havana e Miami. Pontos geográficos de países com culturas distintas e posturas políticas considerados por muitos como antagônicas. Numa distância de apenas 367 quilômetros do território cubano, a ensolarada cidade estadunidense é o espaço cênico para as aventuras amorosas e as confusões dramáticas dos personagens estereotipados, mas focos e cativantes, da série A Bela e o Padeiro, adaptação da história homônima do israelense Assi Azir. Criada por Dean Georgaris, a versão 2020 da história conta com nove episódios de arcos relativamente fechados, mas com impossibilidade de ganhar novos rumos, face ao informe sobre a não renovação do produto, notícia anunciada pelos executivos da ABC. Sem a audiência esperada, o programa ficou apenas na primeira temporada, mas por apresentar abertura e desfecho devidamente organizados, consegue dar conta dos conflitos explanados, sem deixar muita coisa perdida na bruma do cancelamento. Ademais, mesmo com o clima novelesco e as situações clichês, a série é uma ótima opção diletante que reflete em meio aos seus clichês, a importância das raízes culturais e o apego aos meandros das tradições numa sociedade cada vez global.

Exibida entre abril e junho de 2020 e atualmente, disponível em plataformas de streaming, A Bela e o Padeiro nos conta a história de Daniel Garcia (Victor Rasuk), um jovem empreendedor que batalha juntamente com a família para a manutenção dos negócios da família. Ele é inteligente, bem-humorado, bonito e está sempre em destaque visual em cena, trajado pelas roupas justas dos figurinos assinados por Jessica Flaherty e Rebecca Gregg, setor que delineia o seu corpo de maneira a deixa-lo atraente em cena, não apenas por isso, mas por seu sorriso cativante, somado ao desempenho dramático carismático de Rasuk. É esse mesmo setor que põe em destaque as curvas sinuosas de Noa Hamilton (Nathalie Kelley), celebridade do mundo da moda que está sempre bem-humorada, com os melhores vestidos, maquiada como uma deusa, pronta para ser surpreendida a qualquer momento pelos fotógrafos das mais variadas revistas e jornais.

Eles se apaixonam numa noite muito peculiar para a vida do padeiro. Depois de uma situação vexatória com Vanessa (Michelle Veintimilla), atual namorada de Daniel que resolve pedir a mão do amado em casamento num restaurante lotado e acaba recebendo um desagradável não como resposta, o jovem rapaz segue pelas ruas da cidade desolado, literalmente ensopado da comida que a sua candidata a esposa despejou em sua roupa após se sentir humilhada. É quando ele recebe o convite de Noa, numa abordagem bastante sensual, para acompanha-lo em sua noitada. Ela está com as amigas e o produtor numa missão de manchar determinada publicidade que usou a sua imagem sem a devida autorização. Essa, por sua vez, é apenas uma das tantas aventuras do casal que parece se formar. Obstáculos, no entanto, não faltam. Noa acabou de terminar um relacionamento com um ator que a traiu publicamente, homem também atraente e que parece habitar um pequeno pedaço de seu coração sentimental.

Do lado de Daniel, temos a vida de alguém simples que passa a viver um cotidiano transformado por situações midiáticas intrusivas, numa trajetória sufocante de cuidado absoluto com a imagem e com qualquer ação/emoção/fala exposta em público. O controle é cobrado até mesmo na metafísica das redes sociais. Assim, temos nesta narrativa um clima ao estilo Um Lugar Chamado Notting Hill, isto é, a saga de um homem comum diante de uma paixão avassaladora por uma mulher midiaticamente poderosa, sufocada constantemente pela falta de privacidade comum ao seu trabalho enquanto atriz, empresária, modelo, etc. Ao longo da jornada destes personagens em busca do amor em seu estado mais puro, passeamos pelos espaços captados pela direção de fotografia da dupla formada por Albert Torres e Nayna Agrawal, ambientação que capta a atmosfera de contrabalanceamento entre a latinidade cubana e a costumeira americanização dos costumes dos estadunidenses. Fruto da diáspora promovida pela ditadura de Fidel Castro, uma forte movimentação política do século XX nas relações entre Estados Unidos e Cuba, a cidade empresta a sua cenografia natural, mas também ganha muitos arremates do design de produção de J. Mark Harrington para ambientes onde boa parte da ação se desenvolve, tais como a padaria, a casa de Daniel, as boates e restaurantes visitados pelos personagens, dentre outros locais que surgem como constantes pontos cenográficos da série.

Acompanhados pelo ritmo dinâmico da trilha sonora assinada por Joachim Horsley e Sidd Khosla, os personagens de A Bela e o Padeiro completam o mosaico de choques culturais e costumes locais, abordados num ritmo novelesco que pode incomodar aos mais exigentes no quesito dramático, mas que acredito, não causem impacto negativo naqueles que já optam pela série como uma proposta de entretenimento sabendo exatamente o tipo de material que irá encontrar para consumo. Destaque para Lewis (Dan Bucatinsky), mescla de adjuvante com antagonista, pois ora ajuda a protagonista a viver intensamente o seu amor, ora atrapalha o avanço da relação com Daniel, temendo sempre por escândalos de Relações Públicas ou mágoas para a garota que é herdeira de um império, mas no fundo é uma garota com desejos de pessoas comuns; Mateo Garcia (Daniel Del Rio), o irmão de Daniel, cunhado aqui como DJ Cubano, jovem cheio de sonhos e idealizações, alívio cômico nos momentos dramáticos da produção, importante elemento conflituoso por ser interessado romanticamente por Vanessa, a cunhada repelida pelo irmão; Rafael Garcia (Carlos Gómez) e Mari Garcia (Lisa Vidal) formam o casal que é puro sangue forte latino, estereotipados como o patriarca machista de bom coração e a burlesca mãe superprotetora. Eles não chegam a atrapalhar, mas são um pouco barulhentos demais, contraponto da ótima Natalie (Belissa Escobedo), irmã mais nova do lar, jovem em fase de ajustes em sua sexualidade, par romântico da jovem Amy (Madelyn Sher).

Dirigidos por uma equipe de realizadores composta por Steve Pearlman e David Frankel, majoritários no que se refere ao número de episódios comandados por cada, as nove unidades dramáticas de A Bela e o Padeiro são divertidas, equilibradas em sua proposta de entregar ao público personagens carismáticos em situações corriqueiras do cotidiano. Há as habituais mensagens edificantes sobre família, amor ao próximo, valorização das coisas simples da vida e outros mantras que servem como bálsamo para uma existência que é praticamente movida por batalhas otimistas diante da carga constante de desesperanças, violências físicas e simbólicas, traumas não resolvidos adequadamente e outras celeumas que representam o lado amargo da vida. Aqui, por sinal, essa dualidade entre doçura e amargura (ou azedume) estão presentes na dinâmica da padaria da família de Daniel, local de produção com histórico enraizado das tradições que acompanham este grupo que migrou de Havana para uma vida em um território geralmente hostil para estrangeiros. O doce aqui representa o caráter regional, um elemento cultural que envolve o consumo local de produtos realizados com base em receitas transmitidas entre gerações, sendo um aparentemente passageiro, mas na verdade um importante elemento para a composição das reflexões étnicas e sociais que engendram A Bela e o Padeiro.

A Bela e o Padeiro (The Beauty and The Baker, Estados Unidos/2020)
Criação: Dean Georgaris
Direção: Dick Wolf
Roteiro: Vários
Elenco: Dean Georgaris, Victor Rasuk, Nathalie Kelley, Carlos Gomez, Dan Bucatinsky
Duração: 42 min. (Cada episódio – 09 episódios no total)

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