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Crítica | A Liga Extraordinária

por Ritter Fan
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Ah, como eu queria conseguir gostar de verdade da versão cinematográfica de A Liga Extraordinária, incrível série de graphic novels concebida por Alan Moore e Kevin O’Neill… Fiz realmente força para isso tanto na época do lançamento do filme no cinema quanto depois, em revisitas razoavelmente periódicas ao filme de Stephen Norrington. Afinal, não só o conceito de uma “Liga da Justiça” de personagens da literatura vitoriana é por si só espetacular, como a grande estrela era Sean Connery, um de meus atores favoritos (apesar de reconhecer que ele não é nem de muito longe um dos melhores), no que acabaria sendo o último papel de sua longeva carreira.

O mais que consegui, porém, foi não achar a adaptação um lixo tóxico imprestável. E essa impressão continuou na nova conferida especialmente para a presente crítica. O conceito de Moore e de O’Neill permanece razoavelmente intacto, com um design de produção por vezes até interessante, que é o melhor que consigo afirmar sobre a fita, mas a execução chega a ser amadora. E isso não deveria ser uma surpresa se olharmos para a carreira de Norrington, que começou como especialista em efeitos especiais e que, quando migrou para a direção, revelou-se ao mundo com Blade: O Caçador de Vampiros  e afundou-se aqui, com A Liga Extraordinária, sem jamais voltar para essa cadeira. E o mesmo pode ser dito de James Robinson, responsável pelo roteiro.

E olha que eu jamais exigiria que a complexidade e a profundidade do trabalho quase literário de Alan Moore fosse transposto para as telonas. Seria pedir demais. Bastava uma aventura eficiente com Allan Quatermain (Connery), protagonista de As Minas do Rei Salomão, escrito por H.R. Haggard em 1885, Mina Harker (Peta Wilson), personagem-chave de Drácula, escrito por Bram Stoker em 1897, Capitão Nemo (Naseeruddin Shah), antagonista (ou quase) de Vinte Mil Léguas Submarinas, escrito por Jules Verne em 1872, o Homem Invisível (Tony Curran) do livro homônimo de H.G. Wells, de 1897 e Dr. Jekyll e Sr. Hyde, a personalidade bipartida que é protagonista e antagonista de O Médico e o Monstro, de Robert Louis Stevenson, escrito em 1886. Mesmo a adição de Dorian Gray (Stuart Townsend) e do americano Tom Sawyer (Shane West), algo visto como heresia por muitos, é bem-vinda e não afeta o espírito do que poderia ser uma diversão descompromissada, mas a grande verdade é que A Liga Extraordinária é derrubada por uma direção e roteiro menos do que ordinários, certamente não mais do que medíocres e inábeis, como se a produção realmente achasse que bastaria reunir um elenco razoavelmente respeitável dentro de uma produção cheia de CGI e efeitos práticos até bonitos para que a “mágica hollywoodiana” fosse feita.

No entanto, glosar os problemas da obra é fechar os olhos para um roteiro que cria uma ameaça genérica e muito mal apresentada e desenvolvida e uma história que é muito simples – a aparição da ameaça, a reunião do grupo e a pancadaria que se segue -, mas que nem em sua simplicidade e atmosfera camp ela se sustenta. São diálogos que se resumem a frases de efeito e a construção nula de personagens que impedem que o elenco crie conexão ou estabeleça a famosa “química” por mais que eles tentem. Tudo, portanto, acaba sendo substituído por fogos de artifício exageradíssimos que, mesmo sendo razoavelmente bem feitos em uma mistura saudável de CGI com efeitos práticos, retiram do espectador qualquer possibilidade de imersão no arremedo de narrativa que o texto de Robinson tenta passar.

E a direção de Norrington, apesar de manejar bem a fotografia escurecida – mérito de Dan Laustsen, na verdade – é uma mixórdia. A decupagem é paupérrima e o que resulta daí é a impressão cinética de uma montanha-russa daquelas que nos fazem sair enjoados. Lá pela metade da projeção, já estamos exaustos e com vontade de tomar um Engov para suportar o resto. Até mesmo o carisma natural de Connery esvai-se pelo ralo juntamente com a curiosidade pela versão monstruosa do Dr. Jekyll, pelo mistério ao redor de Mina Harker e por todo o esplendor de tudo que gravita ao redor do Capitão Nemo. Falta ritmo ao filme, pois tudo parece estar em apenas dois níveis: o rápido demais e o ininteligível.

É, portanto, até estranhamente curioso que a reconstrução da Londres vitoriana com uma pegada cyberpunk seja cuidadosa e fascinante na medida que podemos parar para apreciá-la. Os figurinos da equipe são exatamente como deveriam ser e o Náutilus é uma verdadeira maravilha que merecia, sozinho, um spin-off. O design de produção merece todas as comendas, ainda que seja frustrante ver todo esse ótimo trabalho ser desperdiçado pela inabilidade dupla de Norrington e Robinson.

A Liga Extraordinária tinha um enorme potencial inato e o que chegou às telas não consegue nem de longe realizá-lo. Fiz de tudo para gostar mais do que gostei e a conclusão é simples: apesar de eu ser terminantemente contra reboots, sou o primeiro na fila a desejar um para a fenomenal criação de Alan Moore e Kevin O’Neill. Quem sabe um dia?

A Liga Extraordinária (The League of Extraordinary Gentlemen, EUA/Alemanha/República Tcheca/Reino Unido – 2003)
Direção: Stephen Norrington
Roteiro: James Robinson (baseado em graphic novel de Alan Moore e Kevin O’Neill)
Elenco: Sean Connery, Peta Wilson, Naseeruddin Shah, Tony Curran, Stuart Townsend, Shane West, Jason Flemyng, Richard Roxburgh, Max Ryan, Tom Goodman-Hill, David Hemmings, Terry O’Neill
Duração: 110 min.

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