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Crítica | A Mulher que Eu Amo

Elvis sem pudor de interpretar ele mesmo.

por Ritter Fan
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O segundo longa estrelado por Elvis Presley – desta vez recebendo crédito principal, o que continuaria até o final de sua carreira em Hollywood – tem a grande vantagem de ser uma obra preparada, desde o início, para ser um “filme de Elvis Presley”, ou seja, diferente de Love Me Tender, em que os números musicais foram encaixados tardiamente para surfar na onda do sucesso meteórico do cantor e da canção em questão, A Mulher que Eu Amo (também lançado por aqui como Estranhos na Cidade) foi concebido para ser um receptáculo e um veículo do astro multimídia. Afinal, mesmo que baseado em um conto literário, o filme é, também, uma semi-biografia de Elvis, algo curioso considerando que estamos falando ainda do começo de sua carreira, mas que permitiu a inserção orgânica de uma série de números musicais diferentes, com sete canções no total, algumas delas cantadas mais de uma vez, inclusive e especialmente (Let Me Be Your) Teddy Bear e a música-título Loving You, lados A e B do single lançado quase em concomitância e que, mais uma vez, chegaria à marca de um milhão de exemplares vendidos.

O roteiro é básico e muito simples, quase que uma completa irrelevância que segue como mera cola narrativa para as performances de Elvis, mas ele funciona talvez justamente por isso. Em um palanque da campanha eleitoral de um candidato a governador do Texas em uma cidadezinha do estado, o jovem Deke Rivers (Presley), entregador de cerveja, ao subir para cantar uma canção graças à insistência de seu amigo, é descoberto como um talento por Glenda Markle (Lizabeth Scott), que agencia o experiente líder de banda country Walter “Tex” Warner (Wendell Corey). Encantada pela beleza, jovialidade e talento de Rivers, Glenda passa a fazer de tudo – inclusive alguns truques sujos – para alavancar a carreira do inocente e inexperiente rapaz que tem um passado trágico que aos poucos vai sendo descortinado.

O papel de Scott como agente de Rivers foi ampliado no roteiro a partir da participação de Elvis Presley no Louisiana Hayride, programa de rádio em que um pouco dos estratagemas de seu agente, o infame Coronel Tom Parker, foram descortinados, ganhando um verniz de mitologia benigna ainda que, em retrospecto, saibamos muito bem que não foi bem assim. Com isso, Glenda até ensaia um caminho de grande vilã, mas, ao longo do desenvolvimento do filme, vemos que ela, na verdade, faz o que faz com muito amor no coração daquele jeito bem brega e de revirar os olhos que podemos imaginar. É claro que essa “mudança” na personagem faz absoluto sentido, pois Parker, sempre muito “zeloso” por sua “propriedade”, jamais deixaria sua imagem ser manchada já no segundo filme de Elvis.

Filmado em Technicolor, o diretor de fotografia Charles Lang usa e abusa de cores fortes, trazendo para o filme toda a exuberância das apresentações de Elvis Presley na televisão e em shows, com a equipe de figurino esmerando-se em peças quase  folclóricas para o personagem que ele vive. Aliás, é aqui neste filme que Elvis adota sua “aparência cinematográfica definitiva”, ao pintar os cabelos completamente de preto e lambuzá-los de uma quantidade que não pode ser saudável de brilhantina, ao ponto de ele, de costas, parecer estar usando um capacete lustroso, deixando apenas a franja “solta” para compor seu estilo inconfundível. E, de quebra, graças ao roteiro e ao personagem que é construído a partir dele, o cantor transformado em ator consegue escapar de sua incapacidade de “sumir” em seu papel, como aconteceu em Love Me Tender, e criar um bom equilíbrio entre Elvis e Deke, ainda que, na prática, seja tudo a mesma coisa.

Pelo menos o elenco de apoio, especialmente Scott e Corey, mas também a então estreante Dolores Hart como Susan Jessup, interesse romântico de Deke, realmente ajuda a destacar o trabalho de Elvis de maneira orgânica, sem parecer mera plataforma para o ainda claudicante ator. No final das contas, o núcleo da fita tem boa química e transparece naturalidade na medida do possível, pois, como tudo gira ao redor do show business, essa naturalidade é sempre relativa, por razões óbvias, facilitando o trabalho de todo mundo, inclusive o do espectador.

A Mulher que Eu Amo talvez possa ser considerado como o começo efetivo da carreira de Elvis Presley no cinema, pois é aqui e não em sua estreia no ano anterior, que ele compõe sua persona para a Sétima Arte que, por sua vez, passaria a ser sua nova – ainda que não muito diferente – versão para toda sua carreira musical. É, como eu mencionei na crítica de Love Me Tender, um dos raros exemplos de retroalimentação bem sucedida entre o mundo musical e o mundo cinematográfico em que os personagens e o astro que vive esses personagens se fundem em uma figura única e monolítica.

A Mulher que Eu Amo (Loving You – EUA, 1957)
Direção: Hal Kanter
Roteiro: Herbert Baker, Hal Kanter (baseado em conto de Mary Agnes Thompson)
Elenco: Elvis Presley, Lizabeth Scott, Wendell Corey, James Gleason, Ralph Dumke, Paul Smith, Ken Becker, Jana Lund, Dolores Hart
Duração: 101 min.

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