Home LiteraturaConto Crítica | A Pata do Macaco (A Mão do Macaco), de W. W. Jacobs

Crítica | A Pata do Macaco (A Mão do Macaco), de W. W. Jacobs

Quando um desejo concedido traz um grande perigo consigo.

por Luiz Santiago
1,6K views

Publicado originalmente na revista literária Harper’s Magazine, em setembro de 1902, A Pata do Macaco (também conhecido aqui no Brasil pelo título A Mão do Macaco) é uma produção interessante na bibliografia de W. W. Jacobs, especialmente pela influência que gerou, ganhando enorme importância no gênero, além de uma gigantesca capacidade referencial e antológica, com o passar dos anos. A criação de uma atmosfera de medo e incitação da imaginação do leitor, no desfecho do conto, são momentos repetidamente citados por críticos e estudiosos da obra, e esses são apontamentos com os quais eu devo concordar — embora o encerramento do conto tenha me causado uma grande estranheza quando o li pela primeira vez.

A subversão da expectativa está no  mistério que Jacobs faz dos “elementos de assombração“. Quando as coisas estranhas começam acontecer na casa da família White, temos definições breves do que o patriarca vê na fogueira, do que ele sente mexer em sua própria mão e da sensação de que uma presença, uma força, uma lufada de ar “diferente” está tomando o cômodo. Essas composições medonhas, no entanto, não brotam apenas no bloco onde o clímax acontece. Elas são inseridas progressivamente, desde a abertura da história. Notem que a primeira coisa que o autor entrega é justamente a ambientação da casa, com pai e filho jogando xadrez e a mãe costurando. Fala também do pleno isolamento da casa e de como o tempo está frio. Um bom cenário de “história de terror“, não?

Embora eu consiga lidar com a economia do escritor, no desfecho, não consigo digerir por completo as reticências que ele deixou no desenvolvimento, começando com a chegada do Sargento-Major Morris, um amigo da família que regressa à Inglaterra, após servir, pelo Exército britânico, na Índia. Pode-se criticar aqui o caráter de “povo exótico, com costumes exóticos” que Jacobs utiliza, citando faquires e uma espécie de magia ligada à tal mão mumificada de um macaco: um talismã capaz de fornecer 3 desejos para a pessoa que o possui. Este, no entanto, é um aspecto comum das aventuras sombrias que tratam do contato entre indivíduos europeus e o misticismo de povos distantes. Não deixa de ser uma generalização coberta de paternalismo colonizador, ar de superioridade civilizacional, etc., mas essencialmente para este propósito literário, o uso é menos social (e negativo) e mais ancorado em mitos e fantasias ligadas a práticas  religiosas estrangeiras.

Caberia um pouco mais de detalhes sobre a mão do macaco e talvez algumas poucas falas de contexto com o militar. Porém, o pouco que ele diz deixa um grande suspense no ar e estabelece a espera angustiante da tragédia. O que eu não previa, por exemplo, era o nível de malignidade da tal mão do macaco, que realiza os desejos usando dos mais vis artifícios. O ponto alto da história é o momento em que o representante da fábrica onde o filho do casal White trabalhava, entra em cena para anunciar um acidente. O que vem a partir daí, segue, um pouco mais distanciado, o estilo inteligente do autor na criação do medo, mas vai se abstendo de fornecer contexto, detalhes ou descrição de sensações, expressões ou até mesmo diálogos claros, fazendo o leitor sentir-se um pouco afastado da obra.

A conclusão de A Mão do Macaco, entretanto, é aplaudível. O autor deixa que a imaginação do leitor crie a visão medonha do que poderia estar batendo à porta. A isso, soma-se uma informação que nos foi dada na primeira parte do conto, ao falar do destino e das “coisas horríveis” que os desejos realizados pela mão do macaco poderiam trazer. O ardil da criatura que fornece esses desejos é justamente atrelar o prazer a uma desgraça para o humano que desejou — e aparentemente a exceção é aquilo que o militar disse para o Sr. White: “peça algo que faça sentido“.

Penso que o terceiro desejo do Sr. White foi realizado sem nenhum tipo de reação negativa — ou pelo menos nada além do trauma e do peso na consciência que ele terá pelo resto da vida. Como sempre, a descrença de uma pessoa (ou nesse caso, de uma família) em relação a coisas misteriosas, acaba trazendo muita dor e sofrimento a todos os envolvidos. Somado a desejos mesquinhos ou insanos, isto é um prato cheio para o desencadeamento de coisas terríveis, sendo este o caminho narrativo tomado por Jacobs num final que gera debates, mas que é inesquecível.

A Pata do Macaco / A Mão do Macaco (The Monkey’s Paw) — Inglaterra, setembro de 1902
Autor: W. W. Jacobs
Publicação original: Harper’s Magazine
Tradução: Rubem Fonseca
Edição lida para esta crítica: Contos de Horror do Século XIX (Alberto Manguel), Companhia das Letras; 1ª edição (2005)
17 páginas

Você Também pode curtir

Este site usa cookies para melhorar sua experiência. Presumimos que esteja de acordo com a prática, mas você poderá eleger não permitir esse uso. Aceito Leia Mais