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Crítica | A Roda do Tempo – 1X08: O Olho do Mundo

A Roda medíocre.

por Kevin Rick
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  • Há spoilers. Leia, aqui, as críticas dos demais episódios.

O Olho do Mundo é um capítulo claramente dividido entre duas tramas. A primeira com Rand e Moiraine indo enfrentar o Dark One, enquanto o restante do grupo fica para trás e assume a tarefa de ajudar na proteção da cidade fortificada de Fal Dara, que está sendo atacada pelos exércitos do antagonista principal. É difícil não se lembrar de Frodo e Sam indo destruir o anel, enquanto os outros membros da sociedade combatiam a enxurrada de inimigos sombrios. É um desenvolvimento de clímax bastante clichê na fantasia, mas extremamente eficaz. Você tem duas linhas narrativas que se influenciam, uma mais épica com a batalha em grande escala, enquanto a outra é o desfecho do conflito moral da Jornada do Herói, a provação final do protagonista após uma série de aprendizados.

O episódio faz um bom trabalho em intercalar entre os dois núcleos. Me lembrou bastante a ótima montagem do quarto episódio, que se fragmentava em diferentes locais com um senso de ritmo muito inteligente. Aliás, mesmo não gostando tanto do capítulo final da temporada, O Olho do Mundo é um dos poucos episódios da série que não sinto a narrativa se arrastando até o final. Há fluidez da história. Nós vemos conflitos, antagonistas, senso de urgência, sacrifício e aventura. Em suma, existe algo acontecendo para além de diálogos expositivos e genéricos sobre romances desinteressantes. Desde O Dragão Renascido, este é o primeiro capítulo da série que parece entender seu próprio gênero.

No entanto, é um entendimento tardio. A sensação que esta season finale me passa é a de que nenhuma linha narrativa individual foi tecida forte o suficiente ao longo da temporada para deixar algum impacto dramático no clímax. Veja, o maior foco da season finale é o conflito moral de Rand, correto? Sua escolha impacta as bases deste universo e delinearão a trajetória do enredo. É o típico momento de decisão da Jornada do Herói. Mas a questão é que Rand não teve um bom desenvolvimento dramático, um arco narrativo bem construído para que nos importássemos com seu conflito. Ele é um herói sem uma jornada. Seu único drama envolve seu relacionamento com Egwene, que foi superficialmente trabalhado nos três primeiros episódios, e posteriormente escanteado ao ponto de Rand sequer aparecer ou ter diálogos por grande parte da temporada, e então desenvolvido na correria no episódio anterior.

É por isso que fico repetindo e repetindo que Rafe Judkins construiu uma péssima narrativa. Vou dar um exemplo claro de como o showrunner está completamente perdido na sua estrutura da temporada e na costura dramatúrgica. É só pegarmos o papel de Lan no desfecho. Ele tem algo em torno de duas ou três cenas rápidas no episódio final. O personagem com a maior construção dramática e o melhor desenvolvimento pessoal da temporada não tem qualquer relevância para o clímax. Então, por que ele recebeu tanto tempo de tela e tanto enfoque na série? Por mais que eu curta o personagem, não faz o menor sentido o guardião receber um tratamento com muito mais valor do que o Rand se o ápice da série não orbita o personagem.

É uma falta de foco simplesmente horrenda, que demonstra suas consequências no desfecho quando os jovens se tornam as peças centrais. E não só na comparação entre Rand e Lan, mas em outras escolhas ruins de Judkins. Para quê oferecer um episódio inteiro para o luto de Stepin ou então um capítulo todo sobre as intrigas da Torre Branca, sendo que o cerne dramático da série é a dinâmica do grupo de Dois Rios e suas dificuldades e aprendizados durante a jornada? A Roda do Tempo tem deficiências narrativas muito basilares que simplesmente não me deixam apreciar a obra. Se uma série de high fantasy não entende algo tão básico como Jornada do Herói, para mim ela se torna indefensável.

Para resumir, eu estou falando de causa e efeito. Quando Lan abraça uma Moiraine que perdeu os poderes ou então troca diálogos doloridos sobre abnegação com Nynaeve, há um peso dramático. Há um efeito emocional porque existe uma bagagem construída ao longo da narrativa para potencializar momentos assim. Agora quando Rand está em um conflito moral ou Perrin questiona o “way of the leaf“, não existe grande efeito dramático porque são desenvolvimentos que foram abandonados ou sequer explorados anteriormente. Aliás, nunca vou entender porque o texto de Judkins não explorou com mais tempo os três blocos apresentados no quarto episódio, fazendo uma convergência abrupta na Torre Branca logo no capítulo seguinte – notem como as subtramas dos perseguidores das Aes Sedai, a construção de mundo e a apresentação de culturas, que eu enalteci no começo da série, começam a ser esquecidas a partir do quinto episódio.

Mudando um pouco a conversa dos problemas de costura de roteiro da obra para a parte técnica, também continuo achando a série artisticamente limitada. Houve muita conversa sobre o orçamento do episódio final e uma provável pegada de grande escopo, mas é outro aspecto que o episódio desaponta. Gosto da direção de arte nos pântanos e também do design de produção nas lutas em Fal Dara, mas continuo indiferente à péssima direção da obra. Em um desfecho com intuitos de grandeza, o cineasta Ciaran Dolley não consegue criar sequer uma set-piece minimamente interessante. O diretor parece priorizar close-ups nas batalhas finais do que ter qualquer tipo de criatividade com a câmera ou construção de ambiente – notem como o combate no Tarwin’s Gap é basicamente uma repetição do comandante atirando flechas pela “janelinha”. A falta de inventividade cinematográfica é nítida, e quando a obra tenta passar pano com os efeitos visuais, a estética continua bastante pobre como na medíocre cena das Aes Sedai juntando forças.

Por fim, só gostaria de fazer um pequeno desabafo aos leitores do livro por aí e aos defensores da série que ainda não entenderam que crítica é opinião, e não verdade absoluta ou guia de consumo. É triste ter que falar o óbvio, mas as pessoas não entendem o óbvio. O espaço da crítica é criar o debate e a troca de argumentos sobre experiências diferentes ou semelhantes. Para mim, A Roda do Tempo é uma série completamente medíocre com alguns pontos altos e muito mais pontos baixos. Rafe Judkins teceu uma narrativa sem foco, que não entende causa e efeito dramático ou qualquer tipo de elemento básico da Jornada do Herói de um high fantasy básico em seus maniqueísmos e arquétipos. O autor tenta construir uma narrativa burocrática e fazer expansão de mitologia sem um senso de prioridade para dinâmicas, falhando nos aspectos mais basilares do feijão com arroz da fantasia: execução da jornada e desenvolvimento de bons personagens principais. Para uma história clichê funcionar, a sua trajetória e seus indivíduos devem ser mais importantes que o fiapo da premissa. Não ajuda o fato de que a produção razoável da série e a direção medíocre não conseguem nos imergir no gênero de aventura ou no épico de fantasia. Fica a esperança de que as próximas temporadas melhorem a qualidade. Quem sabe com a ajuda de um feitiço das Aes Sedai, não é mesmo?

A Roda do Tempo (The Wheel of Time) – 1X08: O Olho do Mundo (EUA, 17 de dezembro de 2021)
Showrunner: Rafe Judkins
Direção: Ciaran Dolley
Roteiro: Rafe Judkins, Celine Song, The Clarkson Twins, Justine Juel Gillmer (baseado na obra homônima de Robert Jordan)
Elenco: Rosamund Pike, Josha Stradowski, Marcus Rutherford, Zoë Robins, Barney Harris, Madeleine Madden, Daniel Henney, Helena Westerman, Michael McElhatton, Alexandre Willaume, Álvaro Morte, Peter Franzén, Clare Perkins, Hammed Animashaun
Duração: 62 min.

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