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Crítica | A Vizinha da Mulher na Janela

Caçarolas têm muitas camadas…

por Felipe Oliveira
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Se popularizando por pegar produções que mais se destacavam no meio cinematográfico e render os clássicos filmes paródias, Hollywood se viu sair da paródia de um gênero para algo mais ambulante ao satirizar vários gêneros em um só universo. Essa onda de sucesso veio com o icônico Todo Mundo em Pânico que em 2000 atingiu uma bilheteria surpreendente maior do que aos títulos de terror, suspense e comédia que satirizava, com nomes que iam desde Pânico (1996), Eu Sei o que Vocês Fizeram no Verão Passado, Halloween: A Noite do Terror a American Pie e Matrix. Por mais de uma década, o público foi prestigiado com pérolas que zombavam de Crepúsculo, Jogos Vorazes, o que deu até gás para remexer as histórias dos contos de fadas e fazer um Deu a Louca na Chapeuzinho. Com essa onda morna e uma promessa de uma paródia de Star Wars pelas mãos de Aaron Seltzer (Scary Movie), é curioso que a Netflix tenha investido numa sátira para chamar de sua, mas não do que comumente vemos.

O livro de A Garota do Trem de Paula Hawkins não era tão querido entre os leitores, e ainda, em 2016, ganhou uma adaptação estrelada por Emily Blunt. Depois, no ano passado, chegou uma versão hindi da trama no catálogo da Netflix. Mas para quem não sabe ou o resultado foi tão esquecível assim, foi também em 2021 que o hype bateu mais uma vez à porta de Amy Adams, com o tão adiado thriller psicológico A Mulher na Janela, inspirado no livro homônimo de A.J. Finn publicado em 2018 que buscava homenagear em sua narrativa filmes e linguagens literárias do gênero, e no final das contas, a chegada do longa não valeu o buzz. Mas o grande streaming conseguiu chamar atenção, quando também em 2021 anunciou uma minissérie paródia para essas histórias na linha “o que presenciei na janela”, justo quando a recepção não parece nada atrativa desde Paranoia, o mais queridinho da saga dos bisbilhoteiros desde que Alfred Hitchcock entregou o magnífico Janela Indiscreta (1954).

O deboche começa bem no título hilário, que fica ainda melhor no original, e só nesse detalhe a produção chamou atenção para o que A Vizinha da Mulher na Janela faria. Propositalmente, a base é a mesma do longa com Amy Adams: durante a recuperação do luto, em meio a consumo de vinho, comprimidos, e imaginação fértil, Anna (Kristen Bell) observa um novo vizinho charmoso Neil (Tom Riley), até ela testemunhar de sua janela um assassinato, ou seria fruto de alucinações? O que pode ser um dos aspectos positivos da minissérie é por não mirar em um argumento além da obviedade que as tramas que se inspira já não tenham dito, porém, não precisou de muito para indicar que faltou um pouco mais de ambição. Tal ponto justifica a escolha de focar e zombar da narrativa apresentada em The Woman in the Window, assim, a atração volta o seu estilo a abordagem de paródia de um gênero, e reúne na personalidade de Anna as muitas mocinhas do suspense psicológico, mas se limita em fazer o que já era temido em sua premissa: refazer com ironia que já é ruim.

Era o conceito? Obviamente. Deveria ser considerada hilária e genial por assumir tal roupagem? Por contar com oito capítulos de menos de trinta minutos, A Vizinha da Mulher na Janela se faz ágil em sua trama que não está preocupada em nada além de pagar o que não deu certo com as outras bisbilhoteiras e levar ao limite, partindo da ideia de pegar cada gancho genérico em prol do suspense e encarar de maneira lógica, o que claro, faz virar uma bagunça ainda maior. E são ótimas os sarcasmos de que todos os acontecimentos poderiam muito bem ser tirados de um livro, ou Anna é uma personagem de um livro, ou misturar álcool e comprimidos a fez misturar sua realidade com os livros que lê. Por vestir essa premissa, a minissérie camufla estar realmente levando a sério toda bola de neve que vai se formando.

E são em momentos nada sutis como a enorme taça quase transbordando de vinho que Anna bebe, o conserto interminável da caixa de correio, as várias caçarolas que nunca terminam, as frases que mudam na lápide ou na forma absurda que Elizabeth morre durante um interrogatório com um serial killer que o universo dirigido por Michael Lehmann brinca com as incoerências e coincidências do gênero, que aqui, a sacada é fazer tudo se levar a sério. Mas enquanto leva a narrativa em viradas extremas e mirabolantes satirizando as conveniências do gênero até não sobrar mais nenhuma teoria do que poderia estar acontecendo ao redor de Anna, a minissérie cansa seu lado divertido de zombar e se funde ao seu objeto de sátira, sendo assim, se resulta não como uma versão debochada para os clichês do suspense, mas é tão esgotável e frustrante quanto A Mulher na Janela.

Se ser tão absurdo em suas escolhas torna a minissérie genial, é mérito, principalmente para o último ato, que é seu maior exemplo que vai longe demais para fazer o universo satírico funcionar. E claro, isso se encaixaria perfeitamente no final de um longa clichê que empurraria a reviravolta mais conveniente possível como cereja do bolo e você que aceite ou deteste mais um desfecho cretino pra coleção. Bem felizes do que criaram, o trio por trás da minissérie deixam o aceno de que um suspense genérico pastelão e absurdo está longe de acabar.

A Vizinha da Mulher na Janela (The Woman in the House Across the Street from the Girl in the Window – EUA, 2022)
Criação: Hugh Davidson, Larry Dorf, Rachel Ramras
Direção: Michael Lehmann
Roteiro: Hugh Davidson, Larry Dorf, Rachel Ramras
Elenco: Kristen Bell, Tom Riley, Samsara Leela Yett, Christina Anthony, Mary Holland, Brenda Koo, Shelley Hennig, Michael Ealy, Cameron Britton, Appy Pratt
Duração: 204 min. (8 episódios)

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