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Crítica | Adam Warlock: Origens e Primeiras Aventuras

por Ritter Fan
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Adam Warlock é um dos mais fascinantes e mais complexos super-heróis da Marvel Comics. Sua complexidade vem tanto de sua utilização ao longo das décadas, normalmente muito conectada com Thanos e com as joias do infinito, quanto de sua gênese, ainda sem nome, em 1967, por Stan Lee e Jack Kirby. Claro que o grande desabrochar do personagem veio com o trabalho de Jim Starlin a partir de 1975, mas o objetivo do presente artigo é abordar o personagem antes de ele chegar nas mãos do autor que o transformou. Seguem, assim, separadamente, as críticas de três momentos importantes desse início de carreira do atormentado herói que ganharia um esplendoroso lado messiânico ao longo dos anos.

Ele – Origem
Quarteto Fantástico #66 e 67

(1) O célebre casulo de “Ele” sendo descoberto por Alicia Masters; (2) Tudo o que vemos de “Ele” no arco são aqueles dois quadros do meio.

Esse mini-arco composto por apenas duas edições de Quarteto Fantástico é, possivelmente, uma das mais anti-climáticas e irritantes histórias já escritas por Stan Lee, notoriamente um escritor limitado, apesar de extremamente ativo e criativo à essa época. São duas edições que parecem ser umas 30 de tão arrastadas, verborrágicas e enganosas que são, marcando um começo vergonhoso para o personagem que, dois anos depois, seria transformado em Adam Warlock. Falo, aqui de “Ele”, assim mesmo, só o pronome, que é mencionado dúzias de vezes ao longo de 42 páginas, mas que só vemos efetivamente em dois breves e canhestros quadros na última página da segunda edição.

Com visto em Quarteto Fantástico #65, Alicia Masters, a namorada cega do Coisa, fora sequestrada. Ben apenas nota que ela sumiu, mas não que há algo estranho, com sua busca sendo intensificada na edição #66. Mas o leitor – e só o leitor – logo descobre o que aconteceu: ela fora levada por um cientista da cidadela altamente tecnológica conhecida como Colmeia para que ela ajude-o e a seus sinistros colegas a controlar um humano que eles aparentemente criaram em tubo de ensaio. O porquê da necessidade de ser Alicia é de revirar os olhos do leitor com mais boa vontade possível para aceitar os textos avoados de Lee: como ela é uma escultora cega, sua missão é entrar na câmara de contenção onde “Ele” está para que, ao se aproximar dele, ela possa esculpir uma estátua do ser, já que ele emana uma luz fortíssima que deixa cego quem chega perto. Perceberam a esquizofrenia dessa justificativa mequetrefe, considerando que os tais misteriosos cientistas têm tecnologia para cria um ser humano do nada, mas não têm óculos escuros ou alguma máquina fotográfica capaz de capturar a imagem de “Ele”?

De toda forma, isso que eu resumi acima é lentamente revelado como se fosse o segredo mais espetacular do mundo ao longo de todo o primeiro número do arco e uma parte do segundo, com diversos interlúdios lá no Edifício Baxter e onde Alicia mora com o Sr. Fantástico tentando descobrir o paradeiro da moça de um lado e o Coisa lamentando a falta dela de outro. É, muito sinceramente, uma excruciante maneira de se gastar papel e caneta e, também, o tempo do leitor. Afinal, toda essa “complexidade” poderia ser facilmente espremida e resumida em duas páginas, quiçá duas tiras de jornal de quatro quadros cada. Mas economia nunca foi a marca de Stan Lee. Ao contrário até. Ele é particularmente verborrágico aqui e, quando chega a grande revelação, ela é, pela falta de uma palavra técnica melhor, absolutamente pífia que encerra o conflito envolvendo os cientistas que, claro, se revelam malvados, com literalmente um estalar de dedos. É como esperar uma iguaria única cozida a fogo lento por nove horas, somente para comer uma folha de alface sem sal ao final.

E o texto de Lee é tão inerte que Jack Kirby não consegue fazer sua mágica que, em muitos casos, salva a leitura. Aqui, o genial artista não tem espaço – figurativa e literalmente – para absolutamente nada a não ser alguns breves e belos quadros da Colmeia e de seu interior altamente tecnológico em seu estilo inconfundível e uma splash page com o hoje famoso casulo do ser que um dia seria Adam Warlock. Certamente não é suficiente para justificar a dificultosa leitura desse mini-arco fora a curiosidade frustrante de se descobrir como foi a gênese desse herói.

Roteiro: Stan Lee
Arte: Jack Kirby
Arte-final: Joe Sinnott
Letras: Artie Simek
Editora original: Marvel Comics
Data original de publicação: setembro e outubro de 1967
Páginas: 21 cada edição

Ele vs. Thor
Thor #165 e 166

Duas belas splash pages de Kirby: (1) um extremo close-up de “Ele” e (2) o embate entre Thor e “Ele”.

Pouco menos  de dois anos depois, Stan Lee e Jack Kirby trazem “Ele” de volta como um inimigo de Thor em outro mini-arco de dois números que se passa logo depois que o filho de Odin, Lady Sif e Balder derrotam Plutão e seu exército na Terra. Partindo para investigar uma anomalia que teria afastado Plutão de determinado laboratório, eles acabam deparando-se com “Ele” recém-saído de mais um casulo.

Ao final de seu arco de origem em Quarteto Fantástico, “Ele” fugiu da Terra, desgostoso por ter eliminado os cientistas do mal. Aprendemos, em um retcon daqueles bem safados, que, ao vagar pelo espaço, ele acaba preso em uma armadilha de asteroides (sim, isso mesmo) e, para evitar perecer, entra novamente em um casulo. Mas acontece que essa armadilha, que não tinha intenção de capturar ninguém, era do Vigia, o bom e velho Uatu e, mais uma vez “interferindo sem interferir” na história da Terra manda o casulo de volta ao nosso planeta. Feito o encaixe forçado em um flashback razoavelmente longo, “Ele” encasqueta que precisa de uma companheira e, vendo Lady Sif ali, logo fica todo assanhado para cima dela, o que deixa Thor enfurecido ao extremo.

O que segue é o embate padrão, com “Ele”, carregando Sif, fugindo para outros planetas e Thor e Balder indo atrás com Mjölnir fazendo a conveniente dobradinha de máquina de teletransporte e motor de dobra. Ao mesmo tempo, a fogosa Karnilla, a Rainha dos Nornes, eterna apaixonada por Balder, também resolve que quer a companhia de seu homem, providenciando para que a bruxa Haag o sequestre (paralelismo narrativo mais do que forçado…), o que acaba atrapalhando Thor em sua caçada ensandecida atrás de “Ele”.

Aos trancos e barrancos, a história aqui ao menos funciona daquela maneira Stan Lee de ser. Ainda há verborragia – e naquele jeito comicamente empolado do Thor clássico falar, claro -, mas ela é equilibrada por bons momentos de pancadaria e uma sub-trama em que essa raiva exacerbada do Deus do Trovão é observada de longe por Odin, que não gosta do que vê. No entanto, em termo de desenvolvimento de “Ele”, a história é inócua, com o personagem sendo muito mais um vilão genérico que, apesar de dizer que tem vastos poderes, depois de dois tapas e uma martelada, já corre para seu casulo protetor.

Kirby tem um pouco mais de espaço para manobra aqui e consegue exibir alguns bons momentos ao lidar com Karnilla, Odin e, claro, com o embate de Thor com “Ele” (Balder só faz figuração). Não é uma arte de encher os olhos pelo tumulto e simplicidade que a história apresenta, mas o artista faz valer o esforço da leitura.

Roteiro: Stan Lee
Arte: Jack Kirby
Arte-final: Vince Colletta
Letras: Artie Simek, Sammy Rosen
Editora original: Marvel Comics
Data original de publicação: junho a julho de 1969
Páginas: 21 cada edição

Adam Warlock
Marvel Premiere #1 e 2

(1) O Alto Evolucionário dando uma de Deus e (2) O simbólico Pai enviando o simbólico Filho para o sacrifício.

E então, cinco anos depois de ser criado em um literal estágio embrionário, Adam Warlock sai de seu casulo mais uma vez para tomar sua forma definitiva ou, pelo menos, a base de sua forma definitiva. Roy Thomas basicamente recria o personagem por intermédio da volta do Alto Evolucionário (ou o Dr. Moreau da Marvel Comic) para a Via Láctea com o objetivo de concretizar seu sonho de construir um novo planeta Terra, só que com uma raça superior de humanos. O complexo personagem originalmente humano, mas agora quase um deus, depara-se com o casulo de “Ele” flutuando no espaço e o recolhe, descobrindo que, em seu interior, há justamente uma versão superior de humano que, para sua surpresa, consegue comunicar-se com ele de lá de dentro.

De forma muito semelhante ao que Stan Lee fez em Quarteto Fantástico #66, comentado mais acima, a primeira edição de Marvel Premiere, publicação que serviu de testes para os mais diversos super-heróis novos, é um longo desfile de monólogos e diálogos com o Alto Evolucionário em seu centro. Mas, bem diferente do texto inócuo de Lee, aqui vemos algo bem mais profundo e interessante, ainda que levemente enfadonho pela completa falta de ação: o Alto Evolucionário explica que quer criar, do outro lado do sol, a Contra-Terra e efetivamente começa o processo, com “Ele” observando-o atentamente (a pedido de “Ele”, o Alto-Evolucionário não o liberta do casulo).

Vê-se, aqui, muito claramente, o “complexo de Deus” do humano transformado em supra-humano. Ele não só é bem sucedido em quase que instantaneamente criar uma nova Terra, como ele a evoluiu vertiginosamente ao ponto do ser humano surgir. É muito interessante como Thomas costura alta tecnologia, daquelas obviamente tão impossíveis de acreditar que são divertidas, com religião, abordando diversas passas do Velho Testamento, notadamente Adão e Eva e o assassinato de Abel por Caim como o estopim da violência humana.

Mas o Alto Evolucionário e vítima de suas próprias criações pregressas, vindo de Wundagore-3. Os híbridos de homens e animais o atacam e deturpam sua criação em uma bela alegoria do Diabo. Entra, então, “Ele” que decide sair de seu casulo para ajudar o Alto Evolucionário, logo estabelecendo a relação de pai e filho entre os dois e, claro, a equiparação de “Ele” a Jesus Cristo. Mesmo que a história não seja perfeita, pois, de um lado, há texto demais e, do outro, ação simplista ao seu final, fato é que Roy Thomas é bem-sucedido em estabelecer a figura messiânica que, anos mais tarde, Jim Starlin usaria e desenvolveria francamente. Aqui, é absolutamente fascinante ver que o agora nomeado Adam Warlock (Adão, o primeiro homem, com Mago, uma relação antitética com sua origem tecnológica) tem até mesmo discípulos, ou jovens da Contra-Terra que o “adotam”, conceito que o solitário personagem manteria por mais tempo e, depois, seria de certa forma convertido na Guarda do Infinito.

Aliás, falando em infinito, é aqui que a gênese das joias do infinito acontece, com a primeira delas, ainda sem nome (mas que é a joia da alma) sendo presenteada pelo Alto Evolucionário a Warlock, como se fosse Deus presenteando seu filho com a habilidade de fazer milagres. O conceito seria desenvolvido na revista solo do herói – O Poder de Warlock – também de Roy Thomas em sua continuada parceria com Gil Kane, desenhista aqui.

No quesito arte, Kane é muito bem sucedido em emprestar a Warlock sua aparência definitiva, ainda que, claro, ela tenha sido alterada ao longo das décadas, mas sempre mantendo o conceito geral do raio no peito em deferência ao Capitão Marvel da Fawcett Comics – hoje Shazam – que nada mais é do que a segunda faceta do Capitão Marvel (Mar-Vell) da Marvel, também co-criado por Roy Thomas. O pouco de ação que o mini-arco tem, Kane consegue lidar com maestria, enxertando pistas visuais das metáforas bíblicas que o roteirista quis passar com sua (re)criação de Adam Warlock. Aqui sim o personagem ganha sua devida origem!

Roteiro: Roy Thomas
Arte: Gil Kane
Arte-final: Dan Adkins
Letras: Sam Rosen
Editora original: Marvel Comics
Data original de publicação: abril e maio de 1972
Páginas: 28 (#1), 20 (#2)

 

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