Com produção executiva do próprio Daniel Dae Kim, Agente Butterfly é um thriller de espionagem que transpõe a ação da razoavelmente desconhecida e breve HQ Butterfly, que Arash Amel criou e Marguerite Bennett escreveu em 2014, da Europa para a Coréia do Sul, fazendo da série um ótimo veículo para o ator americano de origem coreana como herói de ação e uma plataforma de lançamento para a razoavelmente desconhecida Reina Hardesty, que é coprotagonista. Na série, Hardesty vive Rebecca, uma jovem e letal agente da agência privada de espionagem Caddis que, em meio a uma missão em Seoul, tem sua exfiltração interrompida pela chegada de ninguém menos do que Daniel Jung (Kim), seu pai que estava morto há nove anos. Segue, daí, uma história de ação e espionagem substancialmente convencional que, porém, ganha uma dose generosa de conflito familiar entre pai e filha que os roteiros dos seis episódios sabem explorar muito bem.
A convencionalidade da temporada, porém, não é um problema, pois os valores de produção são altos, com filmagens em locação em diversos pontos de Seoul e arredores, direção de ação competente, com muito uso de efeitos práticos e dublês nas perseguições automobilísticas e conflitos físicos e bélicos e um cuidado especial na forma como os personagens são desenvolvidos, com bom espaço para a dupla principal e também para Piper Perabo, que faz a vilã, cofundadora (ao lado de Jung) e líder da Caddis, Juno Lund que tem sua própria relação complicada com seu sensível filho Oliver (Louis Landau). Ou seja, há muito para apreciar na série, inclusive sua relativamente curta duração de seis episódios que mais do que dão conta do recado na oferta de reviravoltas e bom ritmo que ainda envolve a investigação das ações da Caddis pelo senador americano George Dawson (Charles Parnell) e a relação de Jung com sua segunda família que ele formou depois de falsificar sua morte e abandonar Rebecca por razões que vão aos poucos sendo desvendadas.
Bobagens à parte, como é a presença artificialmente ameaçadora e imortal do estoico e (não muito) eficiente assassino Gun (Kim Ji-hoon), que só usa facas de lâmina curvada e que é contratado por Lund para matar Jung apesar de ela ter uma exército a seu dispor, ou conveniências facilitadoras como é a revelação do que faz o sogro de Jung, permitindo a execução do “plano final”, o que realmente faz a diferença em Agente Butterfly (o uso de agente no título faria sentido na HQ, mas não na série) é, como disse, a relação tempestuosa entre pai e filha, o primeiro arrependido de ter abandonado sua primeira vida e tentando fazer a reconexão para impedir que a filha se perca em sua profissão e a segunda tendo enormes dificuldades em aceitar o retorno do pai. O que poderia ser um mero artifício narrativo que serve apenas de gatilho para a história e que se resolve rapidamente, é, felizmente, trabalhado como alicerce para toda a temporada, com Rebecca mantendo sua real lealdade – se ao pai ou à Juno, que a albergou na Caddis – em constante estado de ambiguidade. Mais interessante ainda é a diferença principal de personalidade entre pai e filha, com Daniel matando somente quando inevitável e Rebecca não só matando constantemente, como demonstrando prazer no que faz a ponto de ser possível chamá-la de sociopata.
Enquanto Kim vive um personagem dramaticamente mais fácil de ser construído e interpretado, o que abre espaço para o ator focar em ser um herói de ação como Liam Neeson fez lá atrás em Busca Implacável, mas com bem mais doçura, Hardesty tem um desafio bem maior com Rebecca e a atriz, ainda polindo suas habilidades dramáticas, nem sempre consegue alcançar o nível necessário para sua personagem repleta de dúvidas, em uma literal luta interna para decidir o que fazer em um mundo que, de uma hora para outra, mudou completamente para ela. Com isso, a atriz demora para realmente entrar em sua personagem e manter-se por lá, com sequências que oscilam bastante em qualidade, mas que, no final das contas, acaba beneficiando a narrativa e deixando as dúvidas sobre o que se passa na cabeça de Rebecca ainda mais salientes. Paralelizando essa relação, Piper Perabo faz de sua vilã não um bólido descontrolado de raiva e fúria assassina, como é o caso do estereotipado Gun, mas sim alguém que luta entre manter o poder quase absoluto da Caddis diante da ameaça que o retorno surpresa de seu antigo sócio representa e ser uma mãe para seu filho que muito claramente é capaz de fazer de tudo por sua aprovação, com Landau acertando no tom quando algo mais do que apenas fragilidade pura e simples é exigida dele.
Por tudo isso é que o valor de Agente Butterfly está menos na estrutura clássica de thriller de espionagem e mais na forma como a série estuda e desenvolve relações familiais complicadas entre pai/mãe e filha/filho em meio ao jogo de poder estabelecido pela premissa. Daniel Dae Kim escolheu muito bem o material para avançar sua carreira ainda mais e o showrunner Ken Woodruff soube extrair o que os quadrinhos têm de qualidade, criando uma série que constrói e melhora substancialmente o material original mesmo que caia em armadilhas comuns de obras do gênero.
Agente Butterfly – 1ª Temporada (Butterfly – EUA, 13 de agosto de 2025)
Desenvolvimento: Ken Woodruff
Direção: Kitao Sakurai, Jinmin Kim, Jann Turner
Roteiro: Steph Cha, Ken Woodruff, Diana Son, Denise Thé, Sung Rno, Dave Kalstein
Elenco: Daniel Dae Kim, Reina Hardesty, Louis Landau, Piper Perabo, Kim Tae-hee, Park Hae-soo, Nayoon Kim, Kim Ji-hoon, Charles Parnell, Sean Dulake, Sung Dong-il, Lee Il-hwa, Henry Ian Cusick, Sung Joon
Duração: 295 min. (seis episódios)