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Crítica | Agente Triplo

por Luiz Santiago
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estrelas 4

Agente Triplo foi o penúltimo longa-metragem de Eric Rohmer e o seu primeiro filme de espionagem. Para um diretor com pouco mais de 50 anos de carreira e 83 de idade, era um desafio e tanto filmar um gênero que não lhe era habitual, especialmente com toda a mitologia criada em torno de agentes secretos, polícias secretas e afins, com destaque para o clássico James Bond e todos agentes derivados dele.

Mas como era de se esperar, Rohmer fugiu dos padrões estabelecidos para as películas do gênero e criou ele próprio um tipo de investigação e mistério que tem fôlego novo, um tipo de aventura onde a dúvida permanece, a ação existe, mas o grande destaque da obra é o texto e não as estripulias físicas do agente ou da organização para quem ele trabalha. Para salientar ainda mais essa nova visão, o cineasta inseriu sequências de cinejornais históricos da Pathé que nos ajudam a contextualizar, de forma jornalístico-cinematográfica, o período histórico da ação.

A trama se passa entre maio de 1936 e em algum momento de 1943, portanto, abarca a Guerra Civil Espanhola, a Segunda Guerra Mundial (contando com a ocupação da França pelos nazistas) e as incertezas políticas que marcaram a Europa durante esse tempo. O protagonista é Fiodor, um General da Rússia Imperial exilado na França e casado com uma pintora grega chamada Arsinoé. O casamento deles é marcado pelos segredos inerentes à ocupação de Fiodor, que deixa claro fazer parte de um serviço secreto mas esconde informações importantes sobre os serviços que presta e para quem os presta.

Mesmo que não haja uma escancarada trama de gato e rato, Rohmer consegue de maneira hábil guiar a misteriosa identidade de Fiodor como se fosse uma isca para o público, que suspeita, assim como a esposa do protagonista e as pessoas que o cercam, que ele pode ser um agente dos monarquistas russos, dos socialistas ou dos nazistas. Quem pode dizer exatamente? Mesmo com o final revelador (e pouco animador) sobre sua atividade, o mistério não se dissipa por completo. Terminamos o filme com uma boa dúvida em mente, apenas um pouco incomodados com a forma insossa com a qual o diretor resolveu por fim à história.

A relação entre fatos históricos e ficção é esclarecida já na abertura da fita, com os letreiros que nos lembram sobre a veracidade da história central, mas ressalta a invenção de algumas ações e rumos para as personagens. O roteiro, que é extremamente bem escrito e resultado de uma escrupulosa pesquisa histórica, consegue guiar com simplicidade e uma deliciosa ironia as relações conflitantes entre todas as vertentes políticas, uma sopa ideológica que parece ter um caminho trágico, sempre andando para um estado extremo ou alguma atitude e consequência trágica.

Na mesma linha da acuidade história do roteiro, todo o desenho de produção e a equipe técnica do filme realizaram um notável trabalho de iluminação, decoração, uso de cor no ambiente e figurinos de uma determinada classe social, na França dos anos 1930, e é interessante que percebamos essa modificação acontecer no decorrer do filme. Até a dualidade entre o apartamento em Paris e a casa de campo para onde o casal protagonista vai passar um tempo, devido a doença de Arsinoé, é bem realizada e, aos poucos, acaba tendo uma estranha e precisa similaridade, como se a jovem e alienada esposa quisesse reproduzir o seu mesmo espaço de habitação onde quer que estivesse.

Agente Triplo é um filme histórico com boa dose de ficção e uma interessantíssima trama de espionagem. Tenho reservas em relação ao modo como Rohmer terminou o filme, mas isso não determinada a qualidade geral da obra, que é muito boa e deveria ser mais conhecida, não apenas pelos fãs do diretor, mas também por aqueles que sentem falta de bons roteiros que brincam com as luzes fugidias e os perigos reais da História, numa trama muito inteligente sobre espionagem.

Agente Triplo (Triple Agent) – França/Itália/Espanha/Grécia/Rússia, 2004
Direção:
Eric Rohmer
Roteiro: Eric Rohmer
Elenco: Katerina Didaskalu, Serge Renko, Cyrielle Claire, Grigori Manukov, Dimitri Rafalsky, Amanda Langlet, Nathalia Krougly, Jeanne Rambur, Emmanuel Salinger, Vitalyi Cheremet, Laurent Le Doyen
Duração: 115 min.

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