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Crítica | Águia de Fogo – 1X01 e 02: Shadow of the Hawke

Lagartos, águias, violoncelos, Van Gogh e também um helicóptero...

por Ritter Fan
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Bem-vindos ao Plano Piloto, coluna semanal dedicada a abordar exclusivamente os pilotos de séries de TV.

Número de temporadas: 04
Número de episódios: 80
Período de exibição: 22 de janeiro de 1984 a 07 de agosto de 1987
Há continuação ou reboot?: Não.

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Volta e meia (ou com bem mais frequência do que apenas “volta e meia”) a coincidência temática no mesmo ano ou em anos seguidos acontece no audiovisual. São os chamados “filmes gêmeos” e há casos deles pelo menos desde os anos 30 pelas mais diversas razões, inclusive a pura coincidência. É Top Gun e Águia de Aço em 1986; Tombstone e Wyatt Earp em 1993 e 1994; Double Dragon, Street Fighter e Mortal Kombat (trigêmeos!) entre 1994 e 1995; FormiguinhaZ e Vida de Inseto em 1998 e Impacto Profundo e Armageddon também em 1998 somente para citar alguns exemplos, com efeitos que normalmente enfurecem as produtoras, já que se estabelece uma espécie de concorrência que acaba levando à canibalização das obras, com uma normalmente saindo “vencedora”, por assim dizer.

Na televisão, isso é menos frequente, mas um dos casos mais gritantes é o que envolve Trovão Azul e Águia de Fogo, duas séries de 1984 que giram em torno de helicópteros altamente tecnológicos cujos pilotos foram lançados com apenas 16 dias de diferença, o primeiro em 06 de janeiro e, o segundo, em 22 de janeiro. Ambas foram resultados do sucesso razoavelmente inesperado do longa metragem cinematográfico Trovão Azul lançado em 1983, com a série homônima sendo um descarado reaproveitamento de material do filme, só que com um novo e mais barato elenco, resultando em fracasso de público que levou a seu cancelamento com apenas 11 episódios indo ao ar. Águia de Fogo, por seu turno, foi a merecida vencedora, com a série ficando no ar por três temporadas na CBS, sendo cancelada e, em seguida, comprada pela USA Network que, trocando o elenco, produziu mais uma temporada totalizando, então, 80 episódios (79 se considerarmos a natureza de telefilme do primeiro).

O que torna Águia de Fogo uma série melhor do que Trovão Azul é, em primeiro lugar, ela não parecer uma versão piorada de um filme que já não era muito bom e, depois, por não repetir a mesma fórmula do longa que inspirou sua criação pelo prolífico Donald P. Bellisario que escreveu e dirigiu o telefilme inicial que, para fins de sindicalização, como de hábito, foi posteriormente dividido em dois episódios. Além disso, Shadow of the Hawke tem uma trama que pega muito emprestado de Raposa de Fogo, de dois anos antes, com um estoico piloto de helicópteros sendo retirado de sua aposentadoria para reaver a aeronave do título (que, em tradução direta, é Lobo do Ar) das garras de seu lunático criador que a roubou e a levou para a Líbia de Muammar Gaddafi.

Em outras palavras, Bellisario colocou um tempero de espionagem e Guerra Fria na base de sua série, além de ter criado um piloto cheio de estilo, com direito a uma sequência inicial focada em um lagarto no meio do deserto, um protagonista bonitão, durão e caladão com um nome estranhíssimo (Stringfellow “String” Hawke, vivido por Jan-Michael Vincent) que toca uma melancólica música no violoncelo para uma águia-de-cabeça-branca à beira de um idílico lago e que tem uma coleção de arte que conta com um Van Gogh original em sua cabana de luxo, um ex-chefe de String, líder da divisão F.I.R.M., da CIA, que parece um vilão de filme de James Bond, com direito a terno branco, bengala e tapa-olho (ou um óculos com uma das lentes escuras para ser mais preciso) e que tem o codinome Arcanjo (Alex Cord), uma femme fatale por quem String luta para não se envolver, mas sem sucesso (Gabrielle Ademaur, vivida por Belinda Bauer), um alívio cômico bonachão amigo de String que é dono de uma empresa que aluga helicópteros (Dominic Santini, vivido por ninguém menos do que Ernest Borgnine) e um efetivo vilão – o que roubou o helicóptero – que é um sádico que tortura e mata mulheres (Dr. Moffet, interpretado por David Hemmings, talvez mais lembrado como o protagonista de Blow-Up). Ou seja, não é, definitivamente, um episódio de começo de temporada comum de se encontrar na televisão aberta americana nos idos dos anos 80.

No entanto, isso não o transforma em uma obra-prima ou mesmo em um ótimo começo de série como, provavelmente, a memória afetiva de muita gente dirá que é. Assim como Trovão Azul, eu mesmo adorava Águia de Fogo e não perdia um episódio em nosso mirrado cardápio da televisão aberta da época, mas, revendo, Shadow of the Hawke sofre exatamente do mesmo tipo de problema que pilotos em forma de telefilme normalmente sofrem: uma enrolação enorme em sua primeira metade seguida de mais enrolação na segunda para concentrar toda a ação nos 10 ou 15 minutos finais. E, aqui, a real atração, ou seja, o helicóptero à prova de balas cuja principal característica é voar acima da velocidade do som (algo que nenhuma aeronave do tipo conseguiu fazer até hoje, pelo que sei), aparece com verdadeira proeminência apenas no início, já que a heroica e vingativa sequência final, com String e Santini já pilotando a aeronave, não só é curtíssima, como é genérica, além de sofrer de uma montagem terrível que deixa evidente que as sequências com o helicóptero foram filmadas separadamente das sequências em que os inimigos aparecem.

No final das contas,  o começo de Águia de Fogo revela o esforço de Bellisario em fazer uma série de ação um pouco mais estruturada e densa do que a média da época, além de ele ter conseguido impor uma pegada decididamente mais sombria e melancólica. Reconheço, por outro lado, que os exageros estilísticos que listei acima resvalam – e por vezes mergulham – no puramente brega e que Jan-Michael Vincent consegue se igualar a Chuck Norris em sua capacidade de expressar sentimentos, com a desvantagem de ele, ainda por cima, ter uma dicção incompreensível digna do Selton Mello. Mas tudo isso é parte integrante do que foi os anos 80 em termos audiovisuais, especialmente no subgênero – chamemo-lo assim – das séries de ação com meios de transporte bacaníssimos que, de uma maneira ou de outra, marcaram época. Seja como for, na competição entre helicópteros tecnológicos de 1984, Águia de Fogo definitivamente saiu vencedora.

Águia de Fogo – 1X01 e 02: Shadow of the Hawke (Airwolf – EUA, 22 de janeiro de 1984)
Criação:
Donald P. Bellisario
Direção: Donald P. Bellisario
Roteiro: Donald P. Bellisario
Elenco: Jan-Michael Vincent, Ernest Borgnine, Alex Cord, Deborah Pratt, Belinda Bauer, David Hemmings
Duração: 97 min.

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