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Crítica | Andy Murray: Ressurgindo

por Marcelo Sobrinho
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O britânico Andy Murray sempre foi considerado um dos tenistas mais talentosos de sua geração. Demorou bem mais que seus rivais para vencer seu primeiro torneio de Grand Slam, em Wimbledon no ano de 2013, e sempre enfrentou grandes problemas com o equilíbrio emocional em um esporte em que o fator mental prevalece nos momentos mais decisivos. Aqueles que acompanharam os dois match points salvos por Novak Djokovic contra Roger Federer na final de Wimbledon de 2019 entendem bem o valor mental do tênis. Murray venceu três torneios em nível de Grand Slam e chegou ao topo do ranking mundial. Mas sua queda de rendimento devido a uma série de lesões o levou do céu ao inferno em questão de meses. É desse declínio que trata o documentário da Amazon – Andy Murray: Ressurgindo.

Ao contrário de obras semelhantes e lançadas recentemente, a exemplo de Maria Shaparova: The Point, o documentário dirigido por Olivia Cappuccini não apela para vitimismos e não torna Murray um herói que luta contra as injustiças que se abateram sobre ele. A obra é muito mais centrada em seu longo e doloroso processo de recuperação. O ressurgimento não de um super-herói com raquetes, idealizado de forma praticamente infantil, como no caso do documentário sobre a tenista russa, mas do esportista e do seu amor pelas quadras de tênis após uma via crucis por procedimentos cirúrgicos e incontáveis sessões de fisioterapia. Esse tom muito mais “pé no chão” de Andy Murray: Ressurgindo demonstra que um documentário sobre a longa recuperação de um tenista não precisa de atropelos e pieguices para demonstrar o quão duro é esse processo. Ao contrário, a autenticidade humaniza e satisfaz muito mais.

Contribui para dar esse tom mais autêntico as inúmeras filmagens feitas dentro da casa do atleta, além de algumas executadas por ele mesmo através de seu celular. Os jump cuts tão comuns em edições amadoras (sem qualquer sentido pejorativo no uso dessa palavra) de vídeos de internet contribuem bastante para dar esse tom intimista ao documentário. Confessional em diversos momentos até, a exemplo de quando Murray demonstra suas frustrações após sua primeira cirurgia e sua recuperação muito aquém do esperado ou de quando sentiu a necessidade de tornar pública a sua real situação. Foi o que ele fez durante o Aberto da Austrália de 2019. E aqui eis que o documentário brilha não por seus quadros e seus cortes despojados, mas por capturar esse momento com profissionalismo e com excelente participação da trilha sonora, que adota o tom correto – criando drama mas sem extravagâncias.

A trilha sonora também pontua de forma brilhante diversos outros momentos do documentário, incluindo alguns emocionalmente opostos ao da fatídica entrevista em Melbourne, em que Murray desaba em lágrimas ao praticamente anunciar sua aposentadoria precoce. Quando acompanhamos seu tão aguardado retorno em duplas ao lado do espanhol Feliciano López, no torneio de Queen’s, com a conquista do título por eles, a montagem e também a trilha sonora nos entusiasmam com alguns dos melhores pontos da partida. É um belo momento que Andy Murray: Ressurgindo entrega ao fã de tênis – rever com o brilho da linguagem cinematográfica o britânico executando lindos voleios e belas passadas contra a atual melhor dupla do mundo, os colombianos Cabal e Farah. A canção final, quando sobem os créditos, coroa a ótima trilha.

O documentário conta com muitas entrevistas, inclusive dos três maiores rivais do britânico – Novak Djokovic, Roger Federer e Rafael Nadal. A respeito desse último, conta-se uma história de quando era jovem e jogou um set inteiro sem perceber que as cordas de sua raquete estavam quebradas. Avisado pelo tio e treinador Toni Nadal, o espanhol disse que achou que estava jogando mal por sua própria causa. Nadal sequer cogitara a hipótese de um problema com sua raquete e nem o notou, tal era seu grau de responsabilidade. Voltando a Murray, é isso que vejo como o grande diferencial do documentário sobre o britânico. Ele não é tratado em nenhum momento como vítima. Se vence o próprio corpo, é com seus próprios méritos. Isso é o tênis e Andy Murray: Ressurgindo compreende bem. Ao tratar o tenista britânico como protagonista de sua própria recuperação, o documentário o dignifica. E ao fazê-lo, dignifica a própria modalidade.

Andy Murray: Ressurgindo (Andy Murray: Resurfacing – Reino Unido, 2019)
Diretor: Olivia Cappuccini
Roteiro: Olivia Cappucini
Com: Sarah Muirhead Allwood, Shane Annun, Mark Bender, Andy Murray
Duração: 108 minutos.

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