Existem vários fatores que contribuem para o grande interesse do público e dos realizadores por filmes sobre tubarões assassinos. Desde o sucesso do clássico de Steven Spielberg, Tubarão, em 1975, o subgênero se tornou um fenômeno cinematográfico recorrente. Em mais de uma década escrevendo sobre estes filmes por aqui, o que podemos concluir é que o fascínio duradouro diante destas histórias envolve bastante o nosso medo irracional e primitivo. O tal medo de tubarões, ou galeofobia, é uma das fobias mais comuns e, em grande parte, é construído e intensificado pelos filmes. O terror reside na ideia de um predador implacável e invisível nas profundezas escuras do oceano, um ambiente onde os humanos são vulneráveis e indefesos. Essa ameaça primordial evoca uma resposta emocional poderosa, explorada com sucesso nas telas. Funciona bem com alguns, mas é um desastre narrativo com outros.
Este, por sua vez, não é o caso de Animais Perigosos, analisado mais adiante. Outro ponto para ressaltar é que ao contrário de monstros fictícios, os tubarões são criaturas reais e seus ataques, embora raros, são imprevisíveis e brutais. Essa base de realidade aumenta a tensão e o terror para o espectador, que sabe que o perigo existe, mesmo que a representação seja exagerada. O pavor do desconhecido na imensidão do oceano é um dos principais ganchos narrativos. Em muitos filmes, o tubarão serve como uma metáfora para ameaças mais profundas e sociais. No clássico de Spielberg, por exemplo, ele representava a cobiça humana e a negligência das autoridades. Em produções mais recentes, como Animais Perigosos, o tubarão pode ser usado para expor que o verdadeiro monstro é o ser humano, que utiliza o animal como arma.
Depois deste breve panorama, chegamos ao mais recente exemplar, lançado em 2025. E, diante dele, a pergunta inevitável: mais um filme com tubarões? Nossa. A impressão inicial para todos nós, cansado as mesmices, é: o que se tem para contar agora? Bom, devo dizer, caro leitor, que comecei descrente com esta produção e, ao passo que avançou, me senti diante de uma grata surpresa. Sob a direção de Sean Byrne, Animais Perigosos apresenta uma trama angustiante baseada no texto dramático de Nick Lepard. Com 98 minutos de duração, a narrativa segue Zephyr, interpretada por Hassie Harrison, uma surfista que se vê em um pesadelo ao ser sequestrada por um serial killer obcecado por tubarões. Mantida em um barco ao lado de outra refém, a protagonista testemunha o assassino usar os predadores marinhos como armas para eliminar suas vítimas, registrando cada ataque de forma brutal e meticulosa. Zephyr, então, precisa lutar incansavelmente para sobreviver e escapar desse cativeiro antes de se tornar a próxima vítima do ritual macabro de Tucker.
É como Águas Rasas encontrar Jogos Mortais. Uma mixagem, no mínimo, curiosa. Apesar de utilizar elementos clássicos do subgênero, o filme de Sean Byrne busca uma abordagem inovadora, rompendo com a tradicional representação vilanesca dos tubarões no cinema. O diretor revela que essa perspectiva mais empática é um pilar criativo de seu trabalho, buscando humanizar os animais marinhos de uma maneira distinta, algo que ele não havia visto antes nas telas. Byrne expressa que seu objetivo era reformular o conceito de filmes de tubarão, ressaltando o potencial da obra para se tornar um marco transformador na categoria. Para ele, o verdadeiro monstro não são os tubarões, mas sim a manipulação humana, diferenciando Animais Perigosos de obras que os retratam apenas como assassinos indiscriminados.
No filme, a atuação de Jai Courtney como o serial killer dos tubarões é notável e inflexível. Longe do estereótipo do vilão sofisticado ou misterioso, seu personagem é um bruto com delírios de grandeza, um agressor mesquinho que se imagina um predador. Courtney, conhecido por papéis como o Capitão Bumerangue em Esquadrão Suicida, se entrega completamente a esse assassino abertamente desagradável, explorando sua repugnância de maneira convincente. Seu magnetismo na tela não vem de um charme artificial, mas da força incontornável de uma performance que prioriza a feiura e a mediocridade do personagem em detrimento da vaidade, tornando-o ainda mais assustadoramente real.
Ademais, Animais Perigosos se destaca não apenas pelo seu terror, mas também por uma notável competência estética e técnica. A direção de fotografia de Shelley Farthing Dawe é um ponto alto, empregando enquadramentos precisos para aumentar a tensão e combinando-os habilmente com os efeitos visuais, que entregam tubarões críveis e assustadores. Complementando essa atmosfera, o design de produção de Pete Baxter é eficaz na construção dos espaços claustrofóbicos no barco do antagonista, com um trabalho igualmente interessante em sua concepção externa. A trilha sonora, composta por Michael Yezerski, também merece destaque, utilizando uma textura percussiva intensa que eleva a narrativa sem cair em clichês óbvios para o gênero.
Em sua essência, Animais Perigosos é um excelente filme sobre tubarões, provando que uma ideia recorrente pode ser bem-sucedida quando bem executada. Ao revisitar o legado dos clássicos iniciados em 1975, o filme demonstra que, mesmo em um subgênero saturado, é possível entregar uma experiência gratificante. Assim, a produção se consolida como um thriller eficaz, que cumpre os requisitos básicos e ainda entrega uma história de sobrevivência competente, satisfazendo tanto o público em busca de entretenimento quanto os apreciadores de um trabalho visual e sonoro bem cuidado. Como dito anteriormente, a narrativa é uma destas gratas surpresas que nos deixa envolvido: não esperamos absolutamente nada, mas a trama entrega tudo, como deve ser a nossa relação com a arte.
Basta saber quais os próximos passos no âmbito dos filmes com tubarões ameaçadores.
Animais Perigosos (Dangerous Animals, EUA – 2025)
Direção: Sean Byrne
Roteiro: Nick Lepard
Elenco: Hassie Harrison, Jai Courtney, Josh Heuston Ella Newton, Liam Greinke, Rob Carlton, Michael Goldman, Jon Quested
Duração: 98 min
