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Crítica | Antes Que Termine o Dia

por Leonardo Campos
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Quem conhece bem o terreno das comédias românticas e dramáticas com finais infelizes, focados num suposto realismo, mas interessadas de fato nas lágrimas e nas inseguranças dos espectadores, sabe que geralmente o câncer ou os acidentes de carro/atropelamentos são algumas das principais causas amargas para o encerramento de uma doce história de amor. No caso dos incidentes de trânsito, o sofrimento vem do luto diante de uma causa natural aparentemente inevitável, algo que poderia ter sido contornado caso uma ou todas as partes envolvidas tivessem mais sorte ou fossem cautelosas além do básico exigido. Antes Que Termine o Dia, lançado em 2004, focaliza neste segmento para fazer a plateia purgar diante de uma jovem história de amor aniquilada pelas instabilidades do que chamamos de destino. Num esquema premonitório, o protagonista vislumbra tudo que acontecerá com a sua amada e após um momento insólito, ganha a chance de refazer parte do percurso do relacionamento antes do estabelecimento de uma tragédia responsável por separá-los para a eternidade.

Com direção de Gil Junger, cineasta guiada pelo roteiro de Christina Walsh, Antes Que Termine o Dia nos apresenta, ao longo de 92 minutos, o durante e o desfecho da relação de amor entre Samantha Andrews (Jennifer Love Hewitt) e Ian Wyndham (Paul Nichols). Ela é um doce de pessoa, professora de música e estudante no mesmo segmento, prestes a se formar e ganhar o seu diploma após mais de dez anos de investimento em violoncelo. Em seus momentos diletantes, a jovem que é dona de uma bela voz também compõe. Romântico, sedutora e carinhosa, a moça é o oposto do namorado, um cara bonito, bem-sucedido, honesto na relação, mas que não sabe exatamente como demonstrar para Samantha os seus sentimentos mais profundos. É o velho clichê dos meninos vestem “azul” e as meninas vestem “rosa”, salvaguardas as devidas proporções, pois enquanto ela é sensível aos sentimentos, o seu companheiro é um workaholic que precisará de um “aviso prévio” para mudar o comportamento.

Enquadrados constantemente do alto pela direção de fotografia de Giles Nuttgens, o casal é apresentado em seus primeiros momentos dentro do apartamento. Acordam juntos, trocam carícias, Samantha sempre cuidadosa e Ian agitado e preocupado com a apertada agenda de trabalho. Logo depois desse primeiro momento, eles seguem para as suas respectivas funções, num dia que funciona mal para ele e muito bem para ela. A data é encerrada com um jantar que termina em cancelamento do namoro. Na saída, a jovem toma um taxi, guiado sempre pelo mesmo personagem, interpretado por Tom Wilkinson, aqui apenas “o motorista”, sem nome definido na ficha técnica. É um personagem misterioso, aparentemente o comandante do “auto da barca do amor” da narrativa. Diante do cenário lacrimejante que envolve sentimentos conflitantes, Samantha segue e Ian observa com distanciamento, até correr em direção ao táxi e ser surpreendido por um acidente que ceifa a vida de sua amada.

Carregado pela culpa por ter sido um namorado relapso, ele segue para casa, revira as coisas e descobre que no diário da falecida, havia uma composição em andamento, criada em sua homenagem. Dorme agarrado com o conteúdo e no dia seguinte, as coisas parecem ter sido diferentes do que ele imaginou. Com gritos e saltos por causa do susto, Ian pula da cama ao ver a sua querida companheira acordando no mesmo ritmo que ele. Sonho? Pesadelo? O que ocorreu? É quando a narrativa começa todo o circuito dramático anterior, agora sob a perspectiva de alguém que já sabe tudo que vai acontecer e precisa evitar o desastre de sua premonição. Do bule que a queima no café da manhã, ao ciclista que passa e a molha com a água empoçada na rua, tudo se repete, numa via diferenciada, voltada para Ian. Não é preciso ser grande cinéfilo ou leitor, acostumado com narrativas dramáticas e suas pegadinhas, para compreender que o foco agora é o rapaz que acredita ser um herói ao promover um dia inesquecível para a sua jovem amada, mas que provavelmente é a pessoa que vai partir dessa após o acidente que até o desfecho, não saberemos se ocorrerá ou se é apenas uma distração em prol da “surpresa”.

Acompanhados pela trilha sonora de Adrian Johnston, os personagens de Antes Que Termine o Dia dividem as suas cenas com poucos coadjuvantes e algumas passagens constantemente voltadas aos movimentos urbanos no trânsito de Londres, mais uma vez gélida, acinzentada, tal como os tantos filmes dramáticos e românticos que decidem contemplar o espaço como sede de suas narrativas. Há uma névoa curiosa na cena do primeiro contato de Ian com o motorista de taxi, antes do mesmo ser o guia da jovem no acidente premonitório. Ele toma a condução particular para ir ao evento de formatura da amada. No caminho, os dois conversam rapidamente sobre amor, perdas, insatisfação. O personagem de Tom Wilkinson tem uma aparência espiritual, misteriosa, literária. Parece algo não-real dentro de um esquema narrativo real, palpável. É um ponto positivo da narrativa que mantém um tom pálido e sem momentos de exaltação visual, haja vista as paletas do design de produção de Joseph Bennett, muito clean e antecipador da falta de vivacidade que tomará a vida de quem ficar para memorizar esta história no final.

Por falar em juventude, curioso observar que tendo o filme como linha de pensamento, os danos causados por tais acidentes não trafegam apenas na seara do luto de familiares, companheiros e amigos, mas é uma causa de morbidade que ganha contornos no enfraquecimento das relações econômicas, pois de acordo com a OMS, a maioria de acidentes no mundo inteiro ocorre com jovens na faixa dos 18 aos 44 anos, isto é, uma preocupante faixa de adultos economicamente ativos. Isso não é problematizado pela narrativa, apenas um dado midiático que ganha destaque ao assistirmos o romance dramático que ainda traz duas faixas de Jennifer Love Hewitt em sua versão cantora, na trilha sonora. Ademais, Antes Que Termine o Dia foi um dos campeões de locação na época, do momento em que esteve na prateleira de lançamentos ao seu deslocamento para a estante dos catálogos, local onde se fixou com bastante firmeza e visibilidade, procurado e indicado sempre que alguém buscava uma história de amor envolvente, clichê, sem grandes complexidades, enfim, um escapismo ideal para o entretenimento em vídeo no conforto do lar, conferido por solteiros em busca de amor ou casais talvez necessitados de enredos românticos para reafirmação  e reavaliação de seus respectivos votos e compromissos.

Antes Que Termine o Dia (If Only) — EUA/Inglaterra 2004
Direção: Gil Junger
Roteiro: Christina Walsh
Elenco: Diana Hardcastle, Jennifer Love Hewitt, Lucy Davenport, Paul Nicholls, Robert Ziegler, Tom Wilkinson
Duração: 92 min.

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