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Crítica | Arqueiro Verde: Vida e Morte de Oliver Queen

Tiro ao alvo.

por Luiz Santiago
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Quando escrevi sobre a edição de apresentação do Arqueiro Vermelho Verde ao nascente Universo DC: Renascimento (em junho de 2016), eu não contive elogios ao projeto. E é fato que o roteiro de Benjamin Percy, naquela apresentação, trazia uma boa quantidade de elementos narrativos que nos chamavam a atenção por suas doses de fofura, comédia, tensão e expectativa para o futuro do herói. A ameaça enfrentada, ali, repousava na tônica de diversas produções contemporâneas, escancarando a podridão por baixo dos tapetes bilionários e das mega corporações. Tudo isso com as pitadas dramáticas já esperadas de um quadrinho da DC, ou seja, aparentemente seria possível se divertir falando verdades sobre os maiores agentes do capitalismo tardio. O problema é que o desenvolvimento desse arco não conseguiu nem metade do charme observado na introdução dessa nova fase.

Sabemos que a posição social-democrata do Arqueiro Verde faz com que os seus roteiristas criem enredos que flertam com temas sociopolíticos de peso, e isso já é uma toada histórica para o personagem, com fases que se tornaram clássicas justamente por esse tipo de “política no gibizinho“, como aquela iniciada em Na Estrada (1970), por Dennis O’Neil e Neal Adams. Tudo o que li do Arqueiro, até hoje, tinha algum tipo de encaminhamento nesse sentido, o que acaba sendo um bom nicho de abordagem para a HQ, afinal, cada herói possui a sua “base de operações” e qualquer leitor dessa mídia sabe que isso não se limita apenas à geografia. Obrigatoriamente, o recorte entra para o campo do comportamento, das visões de mundo, das ideologias. Essas questões colocam o Oliver Queen de 2016 em contato com um tipo de antagonista muito especial. Um grupo de pessoas tão ou mais ricas que ele. Só que preocupadas em deixar o mundo exatamente como está, para seguir lucrando com a guerra, com o tráfico humano, com as misérias recorrentes da humanidade.

Na prática, textos assim tendem a ficar muito rasos e repetitivos, nos quadrinhos de super-heróis, porque é óbvio que os roteiristas não vão avançar em discussões teóricas mais profundas ou mais analíticas. Para manter o público moderno ligado a uma obra como esta, é necessário um caminho bem mais ágil de acontecimentos. E essa mistura entre texto pontuado por CSF (“crítica social foda“) e um vilão com máscara de Doritos + um grupo à la Caveira Vermelha e toques de Monopoly parece se perder a partir de determinado ponto da narrativa. Além disso, o texto de Benjamin Percy se torna redundante, cercando insistentemente algumas piadas ou “acusações” que tornam cenas potencialmente boas em um momento político já abordado (de forma mais interessante) 4 páginas antes. E esse é o padrão do arco. Como o pessoal do Nono Ciclo é um bando de bilionário bizarro (olha a redundância aí), a abertura para essas conversas segue por toda a parte. E em determinado momento, o texto se perde em sugestões de dramas ainda não revelados para o leitor, lançando piscadelas para o futuro da série, deixando muita coisa reticente e… desnecessariamente confusa.

As primeiras edições, desenhadas e coloridas por Otto Schmidt, logram manter uma certa impressão solar na história, mesmo que o tema não seja nada solar — na verdade, sendo bem franco, pega uma carona preguiçosa na obra-prima A Queda de Murdock, só que com mais apelo para a violência e discursos sociopolíticos mastigados. Gosto muito do projeto visual de Schmidt, mas prefiro com todas as letras o trabalho de Juan Ferreyra, que assume a arte até o final do arco. Mesmo que alguns de seus quadros tragam rostos em uma proporção estranha, julgo a personalidade de sua arte mais condizente com esse tipo de drama. Oliver Queen é um personagem que precisa de uma arte de traços mais sólidos, finalização que não tem medo de ser suja em muitos momentos e grande destaque para uma diagramação que indique pontos de vista incomuns, destacando o protagonismo das flechas especiais.

Ollie está bem retratado aqui, agindo como era de se esperar do personagem em um início de fase. Como disse antes, o texto peca pela repetição de temas que cercam a luta de classes, mas isso não tem necessariamente a ver com a construção do protagonista. Mostra mais como os outros, especialmente Dinah, o percebem. E por falar na Canário Negro, eu não gosto muito dela no começo da aventura. Só depois consigo abraçar com menos reserva aquilo que o escritor pensou para ela. O final de todo o problema me fez rir um pouco, porque lembrou um pouco a destruição artificial de uma ordem econômica em Mr. Robot, o que me faz pensar nas voltas que o autor precisará dar para resolver isso, ao fim de seu run. E a última página do arco página traz uma sensação dupla: faz a gente torcer o nariz, repetindo exatamente o que Ollie diz ali (“de novo não!“), mas, simultaneamente, atiça a curiosidade sem sentido que todos temos. Seja como for, precisamos de um roteiro mais direto. A proposta tem um bom potencial. Benjamin Percy só precisa aproveitá-la sem torná-la chata.

Arqueiro Verde: Vida e Morte de Oliver Queen (Green Arrow: The Death & Life of Oliver Queen) — EUA, 2016
Contendo: Green Arrow: Rebirth #1 + Green Arrow (Volume 6: Rebirth) #1 a 5
No Brasil: Arqueiro Verde 4ª Série – n° 1 (Panini, junho de 2017)
Roteiro: Benjamin Percy
Arte: Otto Schmidt, Juan Ferreyra
Arte-final: Otto Schmidt, Juan Ferreyra
Cores: Otto Schmidt, Juan Ferreyra
Letras: Nate Piekos
Capas: Juan Ferreyra
Editoria: Brian Cunningham, Harvey Richards, Andy Khouri
132 páginas

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