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Crítica | As Bruxas (Le Streghe, 1967)

por Kevin Rick
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Filmes antológicos eram extremamente populares nos anos 60, principalmente no cinema italiano. O conceito de coletâneas era abraçado por cineastas e espectadores da época, resultando em grandes sucessos comerciais. As Bruxas (Le Streghe) insere-se nesse famoso gênero do período, contando com cinco segmentos que debatem sobre o papel das mulheres na sociedade. A atriz italiana Silvana Mangano, que participa de todas as histórias, é a protagonista da fita, mas a obra também conta com as participações do famoso comediante Totó, e do futuro superstar Clint Eastwood, que aparentemente recebeu seu salário do filme dividido em dinheiro e em uma Ferrari, tendo como motivo pela estranha forma de pagamento o fato de que não precisaria dar 10% do carro à seu agente. Completamente hilário.

O filme é uma fatia estranhamente insubstancial, mas fascinante, que começa em alto estilo com o segmento de Luchino Visconti, Witch Burned Alive. Nele, vemos a popular atriz Gloria (Silvana Mangano) chegar em um chalé nevado para o fim de semana, onde é atacada por todos os tipos de parasitas e festeiros que se revezam na adoração da artista cada vez mais exausta, humilhando-a pelas costas. O segmento é uma exploração da forma como a beleza é comercializada, com homens tratando a estrela como um produto desejado e nada mais. A curta história também fala, brevemente, sobre aparências de celebridades, no momento em que, após Gloria desmaiar, os outros convidados removem seus ornamentos glamorosos, como peruca e acessórios de maquiagem, para ver como ela realmente é. Mas não apenas fisicamente, também é evidenciado como a atriz finge ser feliz em meio à admiração superficial, através da própria atuação em conversações, usando da sedução como forma de exposição e defesa.

O segundo segmento, dirigido por Mauro Bolognini, é chamado de Civic Sense, com Mangano presa em um engarrafamento por causa de um acidente de carro e oferecendo-se para levar ao hospital a vítima do acidente. Ela passa por vários hospitais e clínicas ao longo do caminho e acaba deixando-o no meio da rua quando chega ao seu destino, tendo-o simplesmente usado como desculpa para chegar aonde estava indo um pouco mais rápido. Não consigo entender qual o real motivo desse curta ser inserido aqui, senão por alívio cômico. Talvez é uma tentativa de conversa sobre como as mulheres apoiam os homens em tempos de necessidade, mas acredito que isso seja um exagero. Este segmento não produz um diálogo com a temática do longa sobre as mulheres, mas é um entretenimento divertido.

Pier Paolo Pasolini é o encarregado da terceira parte, The Earth As Seen From the Moon, um segmento completamente bizarro que trata de uma fábula verdadeiramente maluca de Pasolini no qual o velho viúvo Sr. Miao (Totó) e seu filho idiota, Baciu (Ninetto Davoli), decidem que é hora do patriarca se casar novamente – mas apenas com uma mulher que ambos concordem ser a escolha certa. Felizmente eles encontram Assurdina (Mangano), uma surda muda de cabelos verdes que se torna a esposa e mãe ideal em sua humilde morada. Esta história abre um leque de interpretações, desde a idealização do homem pela mulher, sem realmente levar em conta os pensamentos do sexo oposto, já que Miao rapidamente se torna entediado com a vida da cabana. O fato de Assurdina não conversar ou ouvir é uma metáfora da falta de voz feminina no casamento. O final alegórico do conto expõe as dificuldades de confiança e a prisão emocional feminina em épocas machistas.

The Sicilian Belle é o quarto curta, que assim como Civic Sense, tem pequena duração e aparenta fazer parte do filme apenas para preencher o longa. Nunzia conta a seu pai como um homem quebrou seu coração e ele retalia de maneira um tanto excessiva. O patriarcado muitas vezes excessivamente protetor, beirando o possesso, é o tema articulado, mas não se têm muito tempo ou bom roteiro o desenvolvendo.

A última história é dirigida por Vittorio De Sica e se chama An Evening Like The Others apresentando Clint Eastwood em um papel completamente inesperado, embora as sequências de fantasia às vezes o apresentem em papéis muito mais esperados, e ele faz um ótimo trabalho. A lenda cinemática atua como um marido chato que trabalha muito, estando sempre cansado ele não consegue dar atenção o suficiente para sua mulher, novamente interpretada por Mangano. Apesar das cenas oníricas serem muito bem coreografadas, com o exagero geral entregando bons momentos humorísticos, além das maravilhosas cenas de diálogo do casal com um Clint claramente se divertindo atuando como um decepcionante parceiro, não consigo limitar qual o objetivo narrativo em ação, exceto que os maridos devem prestar mais atenção às necessidades de suas esposas. Faria mais sentido se o personagem tivesse a ignorando propositalmente, mas como este não é o caso, a personagem de Magano apenas soa egocêntrica.

As Bruxas muitas vezes se perde narrativamente nos temas femininos que quer retratar, com irregularidade dos segmentos em manter um nível de qualidade, mas ainda é um filme satisfatório, que em sua maneira muitas vezes absurda, diz um pouco sobre as atitudes de homens machistas em relação ao sexo oposto, além de entregar uma das mais divertidas atuações de Clint, e também contar com uma memorável Silvana Mangano. 

As Bruxas (Le Streghe) — Itália, França, 1967
Direção: Mauro Bolognini, Vittorio De Sica, Pier Paolo Pasolini, Franco Rossi, Luchino Visconti
Roteiro: Pier Paolo Pasolini, Cesare Zavattini, Agenore Incrocci, Furio Scarpelli, Bernardino Zapponi, Fabio Carpi, Enzo Muzi
Elenco:  Silvana Mangano, Annie Girardot, Francisco Rabal, Massimo Girotti, Véronique Vendell, Elsa Albani, Clara Calamai, Marilù Tolo, Nora Ricci, Dino Mele, Helmut Berger, Bruno Filippini, Leslie French, Alberto Sordi, Totò, Ninetto Davoli, Laura Betti, Luigi Leoni, Clint Eastwood, Valentino Macchi, Tano Cimarosa, Pietro Torrisi, Angelo Santi, Armando Bottin, Corinne Fontaine, Gianni Gori, Paolo Gozlino, Franco Moruzzi
Duração: 111 min.

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