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Crítica | As Palavras (2012)

por Leonardo Campos
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Ao revisitar As Palavras, drama de 2012 que flerta com a polêmica temática do plágio, fui remetido de imediato aos elucidativos pontos levantados por Michel Schneider em Ladrões de Palavras: Ensaio Sobre o Plágio, a Psicanálise e o Pensamento, publicação que analisa de maneira bastante minuciosa, o impulso consciente ou não de nos apropriarmos do que outra pessoa escreveu. Na vida acadêmica, no campo da literatura e nas demais artes que regem a cultura do entretenimento contemporâneo, os conceitos de autoria e originalidade possuem uma preocupação muito maior que na era dos grandes clássicos, período que segundo o autor, tinha o empréstimo como “algo fácil e alegre”, diferente da angústia da influência, própria da era burguesa e sua perspectiva de pilhagem. Hoje, diante do individualismo e da discussão deste tópico no campo do Direito, a escrita como tela de reminiscências se transformou numa arena de busca por comparações e ilações constantes entre originais e cópias, uma tarefa ardilosa e nada gentil, em especial, na geração computadorizada que vivemos.

Essa não é a discussão exata de As Palavras, um filme de boas intenções, mensagens edificantes, mas narrado com tanta tranquilidade que o espectador fica esperando o momento em que as coisas “vão acontecer”. Elas ocorrem na serenidade de alguém que investe no visual e em diálogos coesos e elegantes, mas esquece de dar um tom mais dinâmico para que a beleza ganhe mais movimento. “Branda” talvez seja a característica mais ideal para esta história escrita e dirigida pela dupla formada por Brian Klugman e Lee Sternthal, trama sobre os fardos que carregamos ao longo da vida. Indo além de discussões morais, o filme apresenta um interessante quadro de vidas comuns transformadas por conta de suas pequenas ações. Aqui não temos a discussão do plágio tal como Schneider debate, isto é, os empréstimos de enredos dispersos nas malhas do imaginário que nos rege. O que se debate por aqui é o roubo físico, a tomada de algo que não pertence a um, mas transformado em escrita autoral fraudada, para o próprio bem. Indo além de discussões morais, o filme apresenta um interessante quadro de vidas comuns transformadas por conta de suas pequenas ações.

Logo na abertura, Clay Hammond (Dennis Quaid) seleciona os trechos da sua próxima obra, o aclamado “The Words”, para apresentação diante de uma plateia atenciosa. A história que ele narra é a trama que veremos mais detidamente a seguir, isto é, a trajetória de Rory Jansen (Bradley Cooper), homem atraente e tranquilo, recém-casado com Dora (Zoe Saldana). Ainda dependente do pai, responsável por lhe ajudar nas finanças, Jansen amarga dias ruins por conta da falta de habilidade para publicar o seu novo livro, história que parece estar longe de ganhar vida e se materializar enquanto publicação. Certo dia, o aspirante a escritor tem acesso a uma pasta oriunda de uma loja de antiguidades. Em seu interior, há alguns papeis envelhecidos, material que ele logo descobrirá ser um romance que nunca foi publicado. Com tanta facilidade diante dos seus olhos, Jansen torna inevitável o que a ética diria “passe longe”: publica o livro em seu nome e realiza um antigo sonho. O que ele não esperava era que um senhor, durante um evento, o aguarda na saída para se apresentar e dizer ser o verdadeiro dono do texto que contém aquelas palavras arquitetadas de maneira tão bonita, mas carregadas de uma história tão trágica.

O tal homem, representado de forma ilustre pelo ótimo Jeremy Irons, torna As Palavras um filme que abre diálogos entre dois mundos que coexistem, mas não se interpelam. Assim, a montagem de Leslie Jones intercala as discussões literárias de Clay, Jansen e o roubo da história e um homem que volta ao passado, numa rememoração de Paris na época do pós-guerra. Assim, o roteiro flerta com as peculiaridades da produção literária, a construção de narrativas por meio da experiência e outras tantas questões sobre criar na contemporaneidade. A dupla de roteiristas peca por exceder os possíveis limites de histórias apresentadas, pois ao longo dos 96 minutos, percebemos que estamos diante de um texto relativamente estufado, mas ainda assim, o resultado visual e dramático consegue ficar longe da mediocridade.

Para dar maior significado aos elementos estéticos, a equipe de realização elabora um sofisticado plano de produção. Diante disso, louvável perceber, no que tange aos aspectos técnicos, a trilha sonora do brasileiro Marcelo Zarvos que emula o estilo Phillip Glass e mergulha a produção em momentos que beiram ao onírico, tornando-se intrusiva apenas em algumas passagens. A direção de fotografia de Antonio Calvache oferta belas imagens ao espectador, numa apresentação poética dos acontecimentos. Interessante observar que o ator Bradley Cooper já havia representado um escritor diante de suas aspirações no dinâmico Sem Limites, narrativa sobre um homem que consegue fama e fortuna por meio do uso de uma nova droga, responsável por expandir o potencial de seu cérebro. Desta vez, os temas gravitam em torno dos limites tênues entre a ficção e a realidade. Ele escreve sobre a sua experiência, potencializada pelo uso de sintéticos. Uma pergunta, intrigante, fica ao final: somos capazes de escrever sobre algo que não vivenciamos? E de volta ao texto de Schneider: ainda podemos ser originais? De verdade?

As Palavras — (The Words) Estados Unidos, 2012.
Direção: Brian Klugman, Lee Sternthal
Roteiro:  Brian Klugman, Lee Sternthal
Elenco:  Ben Barnes, Bradley Cooper, Dennis Quaid, Gianpaolo Venuta, J.K. Simmons, Jeanie Hackett, Jeremy Irons, John Hannah, Kames Babson, Keeva Lynk, Liz Stauber, Michael McKean, Nora Arnezeder, Olivia Wilde, Ron Rifkin, Zeljko Ivanek, Zoe Saldana
Duração: 113 min.

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