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Crítica | As Panteras: Detonando

por Iann Jeliel
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As Panteras: Detonando

O primeiro As Panteras é julgado pela pouca pretensão, mas ao ser revisitado percebe-se que há uma identidade marcante na forma como McG direciona seu experimento de ação para uma vertente glorificadora do empoderamento feminino sem desvincular-se de seu universo fantasioso de entretenimento. A continuação As Panteras: Detonando segue os mesmos preceitos, podendo ser sim classificada pela repetição da mesma fórmula chamativa na lógica do “quanto mais melhor”, só que não pela vertente com a qual foi rotulada, como um mero escapismo banal, como também nos artifícios de humor “autodebochado” e antítese da masculinização característica desse gênero no início do século. Inclusive, a própria estrutura do roteiro traça paralelos diretos com a do anterior, com a diferença de querer ser maior e com um discurso pró-feminilidade mais consciente, embora a bagunça de várias ideias de diferentes cabeças fique também mais escancarada com isso.

Entre as repetições, tudo o que funcionava no anterior se mantém com menos charme, embora isoladamente garanta ainda muitas situações inusitadamente divertidas para os “Anjos” brincarem com seu poder de persuasão ao manipularem facilmente os antagonistas masculinos. O que sai prejudicado é que, para não fazer do filme todo uma mera repetição, busca-se aprofundar dramaticamente as personagens em suas vidas rotineiras e as relações entre elas, o que para a proposta reitera um pouco daquele senso mais livre do anterior e coloca um pé no sério, principalmente porque um desafio à altura é inserido para garantir a crescente da escala. No caso, a inserção de uma “ex-pantera” como vilã da história, o que proporcionalmente gera um embate para a lógica do filme anterior, pois as Panteras podiam tudo e agora vão enfrentar alguém que pode tudo também. Como resolver isso num combate?

Os roteiristas até tentam buscar soluções numa ampliação da mitologia por trás da fantasia criada para o filme, mas isso só corrobora a percepção mais sóbria de algo que propriamente se comportava mais como um comentário irônico. Por mais que McG nunca de fato perca o controle ou a identidade como um todo, o filme tem suas inconsistências de tom, principalmente quando pensado nos aspectos mercadológicos citados. Há um certo descontrole na sensualização, com a inserção de cenas até gratuitas com a praxe de buscar o encantamento do público masculino, por mais que sejam cenas eficientes nesse sentido, elas não buscam o disfarce do empoderamento, e sim a glorificação dos corpos das mulheres, tanto que são reutilizadas mais de uma vez, principalmente com Cameron Diaz. São muitas trocas de vestimenta, danças e foco em romances com astros que não acrescentam muito.

É um apelo pop que já tinha no anterior, mas que foi bem menos sutil ou orgânico à ideia central do filme, que como dito, gira em torno de fazer comédia com esse apelo, muitas vezes, querer vendê-lo fala mais alto que o deboche. O que se torna ainda mais contradizente com a seriedade nas subtramas que vêm a se conectar com Demi Moore, a Pantera traidora. É até interessante a motivação por trás dela, que questiona a servidão a um homem que nunca conheceu para sustentar um individualismo de ego adquirido pela capacidade que ela conseguiu dentro do serviço de espionagem. Pena que o texto deixe esse comentário muito por cima e não aproveite o pouco de seriedade que tem para essa vertente, pois a presença disso como a força motriz da história, que está sendo mais levada em consideração, é o que deixa o discurso do filme mais escancarado.

Logo, as vertentes tão bem misturadas anteriormente em uma unidade se separam demais e deixam os clichês, até mesmo aqueles utilizados com consciência, com cara bem mais genérica. Isso leva às cenas de ação, que caem na mesma lógica do exagero por cima do exagero, que em certos pontos passa do limite só para cumpri-la, acontecendo mais vezes e com o uso de habilidades tão espalhafatosas que acabam cansando ao invés de “impressionar” pela galhofa. Contudo, esse ainda é o ponto de maior acerto, porque mesmo com 20 minutos a mais e bem menos objetividade na questão narrativa, elas ainda são bem distribuídas pela estrutura de jogo do filme, a sucessão de eventos ou “fases” dão dinâmica crescente à aventura e inegavelmente engaja e diverte, mesmo que sem a mesma personalidade.

Classificado como um dos mais indicados à Framboesa de Ouro no seu ano de estreia, As Panteras: Detonando é, de certo modo, como o primeiro, injustiçado, só que bem mais pela questão escapista do que por ter uma articulação emblemática, como foi anteriormente. É sem dúvidas um filme problemático, e mesmo na ideia em defesa de originalidade da franquia, é raso e em vários momentos se encaixa no rótulo depreciativo que os críticos colocaram. Ainda assim, acredito que seus bons momentos falem mais alto, talvez não o suficiente para terem feito outra sequência com o mesmo pessoal, mas o suficiente para respeitar o legado pregado pelo anterior, as mulheres podem ser donas de um politicamente incorreto, tanto no heroísmo quanto na vilania, e isso não tira seu empoderamento.

As Panteras: Detonando (Charlie’s Angels: Full Throttle, EUA – 2003)
Direção: McG
Roteiro: John August, Cormac Wibberley, Marianne Wibberley (baseado em série de TV criada por Ivan Goff e Ben Roberts)
Elenco: Drew Barrymore, Lucy Liu, Cameron Diaz, Bernie Mac, Bruce Willis, , Crispin Glover, Demi Moore, Justin Theroux, Matt LeBlanc, Pink, Rodrigo Santoro, Shia LaBeouf
Duração: 106 min.

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