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Crítica | Assalto à 13º DP (1976)

por Michel Gutwilen
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Um presidiário está condenado à morte, com sua execução em uma cadeira elétrica. Para o Estado (o sistema), trata-se de um morto-vivo andando que custa dinheiro da máquina pública. Portanto, se ele não é vivo, não merece dignidade. É por isso que quando somos apresentados ao preso Napoleon Wilson (Darwin Joston), ele está sendo agredido pelo chefe da prisão. Devido à normalidade com que reage à tal violência, significa que esse gesto provavelmente faz parte de sua rotina. Um pedido constante que Wilson faz a todos que cruzam seu caminho é perguntar se possuem um cigarro para lhe oferecer. Seu colega de prisão, os guardas, todos parecem não fazer muito caso de sua pergunta. Afinal, porque desperdiçar um cigarro com aquele homem que em breve irá morrer? Por que isso seria importante? 

No entanto, uma pessoa chama sua atenção pelo modo como reage ao seu pedido. Trata-se do sargento Ethan Bishop (Austin Stoker), que genuinamente lhe pede desculpas por não ter um fumo para oferecer. Alguém finalmente parece ter se importado com ele. Se Bishop, apesar de sua generosidade, não possui o cigarro, será a secretária da 13º DP, Leigh (Laurie Zimmer), com quem o condenado parece desenvolver uma paixão à primeira vista, que finalmente lhe oferecerá o almejado cigarro. Tal gesto sela o maior ato de amor não-concretizado entre os dois. Estabelece-se, a partir dessas pequenas atitudes, que são como uma demonstração de humanidade, a relação entre os três protagonistas de Assalto à 13º DP

Quando à 13º DP passa a ser ameaçado pelo grupo invasor, Bishop fala em defesa da vida de Wilson, o que espanta a outra secretária, Julie (Nancy Loomis), que não vê sentido em se arriscar defendendo aquele criminoso que em breve já irá morrer de qualquer jeito. Momentos depois dessa discussão, Julie, ironicamente, será morta. Ou seja, quem sobrevive, no fim das contas, são aqueles que possuem um pingo de humanidade, que agem com um senso de comunidade e de justeza. Antes de toda a ação começar, quando Bishop é designado para ajudar no processo burocrático de fechamento da 13º DP, ele escuta da voz do outro lado do rádio: “não há mais heróis, só homens que cumprem ordens”. Trata-se de uma falso antagonismo, pois o policial provará que é possível a coexistência os dois. É possível agir heroicamente (com honra e com bravura), mas também seguir uma ordem maior, quase como um Imperativo Categórico, de proteger os direitos do preso, à vida humana e a delegacia (enquanto símbolo do último resquício de civilização). Quando Bishop está se aliando a Wilson, ele está vendo que, antes de ser um condenado à morte, ele é humano.  

É neste sentido que Assalto à 13º DP é, em certo aspecto, como um filme de zumbi. Não só há as enormes semelhanças (narrativas, de mise-en-scène) com Madrugada dos Mortos, mas o gênero aqui é usado como forma de transformar em exteriorizar, como luta física, o debate moral e político pelo direito à vida. Inclusive, trata-se de um embate marcado até pela arquitetura, uma vez que toda a ação ocorre em uma delegacia prestes a ser fechada e abandonada para sempre, se tornando um lugar inútil, ou seja, morto. De certa forma, então, trata-se também de dar a última injeção de vida naquele lugar. 

No universo deste filme, somos inseridos a uma espécie de ciclo de morte sem fim, sem nunca haver, propositalmente, uma explicação para tal. A primeira cena mostra um confronto entre polícia e uma gangue que termina com mortes; Napoleon Wilson está condenado a morte e não sabemos o porquê; os membros sobreviventes da gangue fazem um pacto de morte e dão início a uma matança caótica, que atinge desde crianças crianças aos que estão na delegacia, culminando no estado de sítio. Inclusive, a própria história só acontece por conta de uma série de encontros aleatórios e improváveis. Portanto, em Assalto à 13º DP, a morte não se justifica, mas ela é uma força maior, um imperativo, um mal estar social de uma sociedade doentia. 

É justamente por isso que Carpenter quase nunca oferece um contraplano do mundo exterior à delegacia, já que a ameaça está muito diante da paranoia de um inimigo invisível e desconhecido, que pode ser qualquer um. Quando há o 1º ataque, vemos apenas os vidros sendo quebrados e os papéis voando. No mesmo sentido, nos poucos momentos em que se vê a gangue lá fora, há sempre uma quantidade desproporcional de pessoas, aparentemente crescente e infinita, mesmo com o grupo resistente matando vários dos invasores, o que só reforça esse sentimento de o inimigo é a própria sociedade, um ‘organismo’ e não seres individualizados. A delegacia e aqueles que estão nela, portanto, são os últimos resquícios de humanidade. No fim, é justamente por isso que não importa saber se Napoleon Wilson irá morrer ou não, mas que seu último plano foi saindo de cena como um herói digno.

Assalto à 13º DP (Assault on Precinct 13, 1976) — EUA
Direção: John Carpenter
Roteiro: John Carpenter
Elenco: Austin Stoker, Darwin Joston, Laurie Zimmer, Martin West, Tony Burton, Charles Cyphers, Nancy Loomis, Henry Brandon, Kim Richards
Duração: 91 mins.

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