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Crítica | Assassímio (Hit-Monkey): Balas & Bananas

Uma macacada surreal.

por Ritter Fan
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O ano de 2010 foi testemunha da estreia de um dos mais bizarros personagens da Marvel Comics, o macaco-japonês transformado em assassino de assassinos batizado lá fora de Hit-Monkey e, aqui, em uma versão inspiradíssima, Assassímio. Criação de Daniel Way, com arte de Dalibor Talajić, o personagem surgiu, primeiro, em um one-shot digital do streaming de quadrinhos Marvel Unlimited, em 10 de fevereiro de 2010, como uma preparação para sua inserção, logo na semana seguinte, em 17 de fevereiro, em um arco de três edições da publicação solo de Deadpool, com as edições seguintes saindo em 24 de fevereiro e 24 de março. Finalmente, no mesmo ano, o personagem ganhou uma minissérie solo em três edições que chegaram às lojas americanas entre julho e setembro do mesmo ano e que desenvolvia sua origem a partir do one-shot.

Esse “primeiro ano” do Assassímio foi, em outubro de 2019, reunido em um volume único lá fora batizado de Bullets & Bananas (Balas & Bananas), que é o objeto da presente crítica, mas com comentários separados para cada publicação lá contida. Vamos lá conhecer a trajetória inicial desse inusitado, mas muito curioso macaco louco?

Hit-Monkey #1
(one-shot)

Em fevereiro de 2010, a Marvel Comics lançava um estranho título inédito exclusivamente em seu serviço de streaming em quadrinhos Marvel Unlimited. Era a estreia de um personagem chamado Hit-Monkey – Assassímio, por aqui – um literal macaco-japonês que, logo na capa, aparece vestido de terno e portando duas pistolas. Esse one-shot escrito por Daniel Way é uma história de origem, mas bem diferente do que se poderia imaginar no contexto das origens dos personagens da editora, normalmente conectados com eventos fora do comum como soros especiais, substâncias radioativas, mutações, alienígenas e coisas assim.

Mas, primeiro, uma digressão, pois eu queria muito saber como foi o processo criativo de Daniel Way para criar o Assassímio. Imagino que ele ou tenha visitado pessoalmente as fontes termais japonesas onde esses macacos de pelagem branca e rostos vermelhos se aquecem no inverno ou, mais provavelmente, viu vídeos e fotos da National Geographic, Discovery ou outras com os belos animais, as mesmas fotos que provavelmente todos nós já vimos dada a curiosidade que é ver os bichinhos refestelados no que são literalmente ofurôs para macacos. Agora, como é que o autor partiu disso para imaginar um desses animais transformando-se em um assassino vingativo que tem como objetivo liquidar outros assassinos, eu realmente não sei e, muito provavelmente, tenho até medo de saber. Seja como for, Daniel Way assim o fez e da maneira mais simples possível.

Afinal, a história é quase prosaica, apesar de muito violenta. Nela, conhecemos um assassino humano que é ferido e acaba sendo salvo por uma tribo desses macacos-japoneses e levado para uma das fontes termais tão famosas em conexão a eles para ser tratado. Há um senso de comunidade e empatia grande entre os animaizinhos e o homem convalescendo e ao mesmo tempo se escondendo de seus perseguidores. O leitor não é brindado com o nome do personagem e o que exatamente aconteceu para ele acabar ali. O que importa é que um dos macacos, talvez o mais inteligente deles, não gosta do assassino e não se aproxima dele no início, apenas mais tarde, ainda de forma muito hesitante, já demonstrando habilidades fora do comum com armas. Seria esse macaco um mutante ou algo assim? Way simplesmente não explica e nem sequer dá pistas de algo incomum. Ao contrário, ele trata apenas como um evento comum, outra terça-feira na Marvel Comics, por assim dizer.

E, da maneira que é exatamente esperada pelo leitor, ou seja, com um enorme banho de sangue, o Assassímio nasce nesse lugar nevado e afastado da civilização, ainda sem seu terno, mas já portando armas letais que ele, aparentemente, sabe usar como o mais hábil dos humanos. Ponto final. Toda essa simplicidade é conduzida artisticamente por Dalibor Talajić, que trabalha a branquidão da neve como um instrumento de desolação e solidão, algo que o protagonista macaco sente desde a chegada do assassino humano, já que ele se afasta de seus pares por desconfiar daquele intruso. Apesar de tomar liberdades com o tamanho dos animais – muito maiores do que na realidade – o artista consegue estabelecer muito bem o drama do Assassímio e sua raiva pelo acontecido e a sede de vingança que segue e tudo sem recorrer a palavras, apenas sons guturais do macaco, já que Way não se curva a artifícios fáceis como coloca balões de pensamento para o animal.

Sem dúvida uma origem inusitada de um personagem para lá de estranho mesmo considerando a fauna de super-animais que existe na Marvel Comics. Assassímio é, por assim dizer, um personagem único que não faria feio ao lado de outros como Justiceiro ou, claro, Deadpool.

Deadpool #19 a 21
Aracnomania

Tenho sérias dificuldades para gostar de Deadpool, mas sou o primeiro a admitir que um personagem como Assassímio combina muito bem com o falastrão quebrador da quarta parede da Marvel Comics. E são em três edições da publicação solo do personagem com fator de cura hiperativo que o macaco assassino de assassinos aparece pela segunda vez, depois de estrear na editora apenas uma semana antes. No pequeno arco em três edições, Deadpool procura o Homem-Aranha em Nova York para começar seu processo de deixar de ser um mercenário assassino para tornar-se um super-herói, algo que deixa o Aracnídeo ensandecido já a partir do primeiro quadro em que os dois aparecem juntos.

Afinal, não bastasse a presença de Deadpool na cidade, o dono de uma loja de conveniências que o Aranha frequenta é brutalmente assassinado, revelando que ele, na verdade, fazia parte da máfia local. Óbvio que o Homem-Aranha desconfia do Deadpool que, imediatamente, percebe que foi um trabalho do Assassímio e que ele próprio – por tecnicamente ser um assassino, como o Amigão da Vizinhança não o deixa esquecer – provavelmente é o próximo alvo do macaco-japonês. O problema é convencer o Aranha da existência de um macaco assassino, claro…

Assim como na origem do estranho e peludo personagem, Daniel Way não se importa com explicações. Se alguém quiser entender o que exatamente o Assassímio está fazendo em Nova York e como é que ele sabe quem é que é vilão e, portanto, merece morrer, vai ter que se contentar com o silêncio profundo, silêncio esse que, claro, o símio mantém do começo ao fim, apesar de mostrar inteligência ímpar. Obviamente que é uma bênção o macaco não falar, pois o Deadpool junto com o Homem-Aranha formam uma dupla que fazem os balões de fala parecerem metralhadoras cujas balas não acabam. São provocações do começo ao fim que coloca os dois em pé de guerra enquanto o macaco silencioso – e cuidadoso, pois ele faz de tudo para não acertar o Aracnídeo – desce a lenha em qualquer um que tiver vilão escrito na testa.

A diversão, mais do que das piadas um tanto quanto cansativas de Deadpool ou das quebras de quarta parede, mais conhecidas como muletas narrativas que já perderam a graça que tinham, vêm mesmo do inusitado da coisa toda, como o mercenário de vermelho tratando a existência de um macaco assassino como se fosse a coisa mais comum do mundo, para desespero do escalador de paredes. A arte, que ficou ao encargo de Carlo Barberi, transforma todo mundo em personagens fungíveis. Todos se parecem, todos têm as mesmas expressões e todos têm o mesmo típo físico. A exceção, claro, fica por conta do macaco enfezado que, aqui, diferente do trabalho de Dalibor Talajić, ganha proporções mais próximas da realidade de sua espécie. É uma leitura sem dúvida agradável e completamente inusitada – talvez ela seja agradável justamente por ser inusitada -, mas o foco excessivo nos heróis já estabelecidos tornam o resultado final quase que apenas mais do mesmo.

Hit-Monkey #1 a 3
(minissérie)
Ano do Macaco

Fechando 2010, Daniel Way retorna ao Assassímio, desta vez para desenvolver a história de origem que contou no one-shot abordado no começo da presente crítica. Para contar essa história, ele escreveu uma minissérie em três edições que começa a partir do ponto em que vemos o personagem ao final da edição de origem, perseguindo o assassino sobrevivente do massacre e, em seguida, passando a ver o fantasma do assassino que sua tribo ajudou a salvar, selando seu destino.

O interessante é que, mais uma vez, o autor não sucumbe à facilidades óbvias, como fazer o macaco falar, nem que seja com balões de pensamento. Ele mantém-se silencioso como sempre, ainda que sempre inteligente e astuto. O uso do fantasma é uma saída boa, que funciona muito bem para levar o personagem de um ponto ao outro em sua sana vingativa que o faz subir vagarosamente a escada hierárquica até chegar ao chefão do que parece ser um braço da Yakuza. O único problema é que esse chefão é protegido por ninguém menos do que o infalível Mercenário, clássico vilão do Demolidor que é capaz de transformar qualquer objeto em uma arma letal.

Claro que, como é inimaginável que um macaco-japonês seja capaz de derrotar o vilão, Way precisa encontrar saídas laterais para lidar com o conflito de maneira minimamente crível, ainda que, lógico, esse adjetivo tenha que ser encarado de forma muito – MUITO – relativa em uma história cujo protagonista é um macaco que porta armas e materiais cortantes como o mais treinado dos humanos. A escalada de sangue e violência não é daquelas gratuitas, pois segue o padrão de “história de vingança” que já vimos tantas vezes antes, mas que, como coloca um macaco como protagonista, deixa as ações humanas ainda mais cruéis e indesculpáveis. O tom satírico impera e isso funciona muito bem para o Mercenário, mesmo que, por vezes, o autor tenha que recorrer a “roteirismos” em minha visão perfeitamente aceitáveis para evitar que o macaco seja trucidado.

E um desses roteirismos é o que o roteirsta vem fazendo desde o começo com sua criação: deixar as explicações de lado. Se o Assassímio é um macaco mutante ou se tem algum poder extra-sensorial ou coisa que o valha que o permita se adaptar tão bem às armas, isso simplesmente não importa. Way nos pede que simplesmente aceitemos sua premissa e fechemos os olhos para racionalizações e, se o leitor fizer isso, a leitura será agradabilíssima. Uma típica história de vingança em que o vingador é um macaco-japonês que, em tese, deveria ser fofinho e lindinho na imagem mental que temos desses animais em fontes termais cercadas de neve nas montanhas nipônicas.

Com Dalibor Talajić de volta ao desenho, a continuidade entre o one-shot original e a minissérie é perfeita, mas com o artista tendo mais espaço para trabalhar, além das mais diversas situações letais para demonstrar sua arte mais crua, que consegue muito bem nos fazer acreditar neste macaco assassino de assassinos. Além disso, lentamente, vemos a evolução estilística do personagem de um animal “pelado” até o Assassímio de terno e óculos escuros que vimos no arco da publicação solo de Deadpool, cronologicamente posterior aos eventos aqui, apesar de ter sido publicado antes. Em outras palavras, Way e Talajić, com muita simplicidade, mas também muito sangue e violência, além de toques satíricos, conseguem criar um personagem que, de tão improvável, torna-se perfeitamente razoável de figurar no panteão de animais super-heróicos da Marvel Comics.

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