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Crítica | Asterix e Obelix no Reino do Meio

Se é para inventar moda, que ela pelo menos seja inspirada...

por Ritter Fan
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Nove anos depois de sua última incursão pelo live-action, os irredutíveis retornam às telonas e telinhas com duas novidades em Asterix e Obelix no Reino Médio: trata-se do primeiro longa com atores reais em que Obelix não é interpretado por Gérard Depardieu e que não é baseado em algum dos 39 álbuns canônicos até agora publicados desde 1959. Enquanto a ausência de Depardieu – já com 74 anos e envolvido em escândalos – é perfeitamente compreensível e até esperada, tenho para mim que há tanto material bom em quadrinhos ainda não aproveitado no audiovisual que a criação de uma história é um desperdício.

Claro que a nova aventura da dupla gaulesa, desta vez partindo para ajudar uma princesa chinesa a recuperar seu reino e salvar sua mãe, a imperatriz, das garras do vilão, seria um mais do que perfeitamente aceitável desvio do material preexistente se a produção fosse de qualidade, mas Asterix e Obelix no Reino do Meio é uma decepção colossal que compete ferozmente pelo título pior live-action da franquia com Asterix nos Jogos Olímpicos, de 2008. Por mais que Guillaume Canet, que também dirige o longa, e Gilles Lellouche esforcem-se nos papeis de Asterix e Obelix respectivamente, com o primeiro não sendo mais do que meramente razoável e o segundo se destacando apenas pela maquiagem tê-lo literalmente transformado em Depardieu, o problema central passa longe das atuações, que conta ainda com Vincent Cassel como Júlio César, Marion Cotillard como Cleópatra e Julie Chen como a princesa So Hi que arregimenta a ajuda dos gauleses.

A suposta nova direção determinada por Anne Goscinny, filha de Rene Goscinny, depois que os dois filmes anteriores não conseguiram despertar muito interesse, é uma completa falta de direção, pois não é suficiente estalar os dedos e arremessar os gauleses para o Oriente provavelmente para tentar desbravar o valioso mercado chinês. É necessário mais do que isso para um filme de Asterix e Obelix funcionar e tudo começa com um roteiro que não fique na superfície como acontece aqui e se inspire no que os criadores dos personagens se esmeravam em fazer: as inteligentes críticas sociais com humor fino, por vezes ácido, disfarçadas de aula de História do Mundo. Philippe Mechelen e Julien Hervé escreveram um roteiro vazio, com humor abestalhado, sem graça e pouco inspirado que se vale muito mais de momentos do tipo “olha lá o Zlatan Ibrahimović” do que algo um pouco mais profundo e perspicaz.

Não ajuda em nada que Canet tenha basicamente ligado o piloto automático em sua direção que mal consegue extrair boa química entre ele e Lellouche na tela, algo essencial para um filme desses começar a funcionar. Além disso, faltam sequências de ação, com grande parte da duração do longa sendo dedicada a uma jornada da Gália até a China em que praticamente nada de relevante acontece a não ser infindáveis sequências em que, de um lado, Asterix e Obelix revelam-se apaixonados pela princesa e sua guarda-costas e, de outro, César suspire por Cleópatra que o desenha logo no começo. Sabem aquele disco arranhado? Pois é exatamente o que Asterix e Obelix no Reino do Meio é por pelo menos metade de sua duração, com a sequência final de batalha sendo outra decepção por ter um ritmo terrível, sem que Canet consiga engajar o espectador por um minuto sequer.

Para não dizer que o filme é um completo e absoluto desperdício, devo confessar que a direção de arte é muito boa, capturando com exatidão cartunesca – como deveria mesmo ser – os variados e ricos figurinos e cenários que o filme exige, assim como o CGI funciona bem, ainda que não no mesmo nível do excelente Asterix e Obelix: Missão Cleópatra, de mais de 20 anos antes. Além disso, há um flashback particularmente inspirado em que vemos, pelo primeira vez em live-action, a sequência em que Obelix, quando criança, cai dentro do caldeirão da poção mágica de Panoramix (Pierre Richard).

Alguém precisa parar e fazer o dever de casa com o material já existente de Asterix e Obelix, preferencialmente garimpando e atualizando – quando necessário! – as imortais pérolas cômicas e maravilhosas linhas narrativas dos álbuns clássicos da série em quadrinhos, ou seja, aqueles escritos por Goscinny e desenhados por Albert Uderzo. Afinal, para que inventar novidade quando é evidente que ela não consegue chegar aos pés do que está aí disponível para adaptações? Nada contra Asterix e Obelix irem para a China e além, mas não custa pelo menos tentar se inspirar no que já está feito, não é mesmo?

Asterix e Obelix no Reino do Meio (Astérix & Obélix: L’Empire du Milieu – França, 19 de maio de 2023)
Direção: Guillaume Canet
Roteiro: Philippe Mechelen, Julien Hervé ((baseado em obras de René Goscinny e Albert Uderzo)
Elenco: Guillaume Canet, Gilles Lellouche, Vincent Cassel, Marion Cotillard, Jason Chicandier, Jonathan Cohen, Ramzy Bedia, Leanna Chea, Julie Chen, Linh-Dan Pham, José Garcia, Bun Hay Mean, Manu Payet, Tran Vu Tran, Pierre Richard, Zlatan Ibrahimović, Philippe Katerine, Jérôme Commandeur, Angèle, Matthieu Chedid, Florent Manaudou
Duração: 111 min.

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