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Crítica | A Dança das Mulheres Condenadas

Uma luta entre gerações expressa através da dança.

por Luiz Santiago
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A Dança das Mulheres Condenadas ou A Dança das Mulheres Malditas já foi exibido oficialmente aqui no Brasil (na Mostra Ingmar Bergman – Instante e Eternidade, que ocorreu em Belo Horizonte, em 2014) com o título de Baile das Ingratas. Essa titulação, por mais engraçada que pareça, tem uma razão de ser, e falarei dela mais adiante. Filmado alguns meses depois de A Flauta Mágica, este curta marca mais uma parceria de Bergman com a coreógrafa Donya Feuer, com quem trabalhou em diversos projetos no cinema e no teatro. A ideia aqui era criar uma peça coreográfica onde a expressão corporal fosse a verdadeira história. Não existem diálogos ou mesmo uma narração. O que temos são 4 atrizes (três adultas e uma criança) expressando um jogo de poder, de conflitos geracionais, de imposição de comportamentos, de manifestações íntimas em cada idade… as possíveis explicações para a dança são muitas.

A trilha sonora que acompanha essas cenas de movimentos corporais é o balé dramático do compositor italiano Claudio Monteverdi, cujo nome original é Il Ballo Delle Ingrate (daí o título em português). Nessa obra, temos três mulheres (Vênus, Cupido e uma figura feminina) e um homem (Plutão). O palco é a entrada do submundo. Vênus e Cupido visitam Plutão, o rei do submundo, e reclamam que as flechas do arco de Cupido não são mais eficazes nas mulheres de Mântua, que estão desprezando seus amantes. Estas são as tais “mulheres ingratas” que terão o seu “baile” punitivo naquela dimensão obscura, e deverão aprender uma lição: nunca mais rejeitar o amor (lembrando que estamos falando de uma obra de caráter mitológico composta em 1638).

Como não existe um roteiro literal, é evidente que as interpretações para o que significa o filme podem ser muitas. Algumas podem puxar elementos do balé da trilha sonora e ver essas mulheres no submundo lutando por alguma coisa (e essa “alguma coisa” pode ser uma grande lista de possibilidades). Outras podem vê-las como arquétipos de fases diferentes da vida de uma mulher, exprimindo os mais distintos sentimentos. Outros podem ver uma luta entre diferentes gerações, com diferentes interesses e hábitos. A cena final da coreografia dá uma piscadela forte para isso, pois nela temos as mulheres mais velhas puxando a criança, por uma corda invisível, até onde estão, e integram a menina pela primeira vez ao grupo. É como se depois de diversas tentativas de “domesticação”, aquela garota independente que se movia de forma diferente, que tinha os seus sonhos e devaneios com sua boneca, agora aprendesse a imitar as mais velhas e devesse seguir os costumes aprendidos, também passando-os adiante. Aliás, a apresentadora da versão original traz essa versão narrativa como a “intenção oculta” do diretor e da coreógrafa.

Uma luta sem palavras. Mulheres condenadas a viverem em um espaço fechado, imutável (a sociedade?) e batalhando umas contra as outras e também contra si mesmas. Uma situação de prisão que pode ser ainda pior do que uma condenação no submundo. Porque aqui elas estão vivas, possuem suas faculdades mentais, possuem desejos… mas precisam imitar um determinado padrão de movimento e forçam isso a quem ainda não o faz. Como se não houvesse escolha. Como se estivessem realmente condenadas a repetir os mesmos passos de dança… geração após geração.

A Dança das Mulheres Condenadas / Baile das Ingratas / A Dança das Mulheres Malditas (De fördömda kvinnornas dans) — Suécia, 1976
Direção: Ingmar Bergman
Roteiro: Ingmar Bergman
Elenco: Nina Harte, Helene Friberg, Lena Wennergren, Lisbeth Zachrisson
Duração: 10 min.

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