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Crítica | Bates Motel 4X09: Forever

por Luiz Santiago
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estrelas 5,0

Spoilers!

Leiam as críticas dos demais episódios de Bates Motel aqui. E leiam as críticas para as várias versões de Psicose de Hitchcock aqui.

Forever foi um choque para mim e creio que para a maioria esmagadora dos espectadores. Nós sabíamos que uma tragédia iria acontecer, mas não sabíamos que ESTA seria a tragédia. Apesar de todos os indicadores, nada dava a certeza de que a morte de Norma se daria ainda na 4ª Temporada. Mas aconteceu. E foi épico, simplesmente épico.

Os primeiros pontos a trazermos para discussão são o formato do episódio e a soberba direção de Tim Southam. Sob dois básicos princípios de ritmo de narração, o diretor nos contou a melhor história de despedida em um dia normal dos personagens, sem pesar a mão nas interpretações em nenhum momento, sem lançar mão de truques visuais para aumentar a ansiedade do espectador, sem orientar uma trilha sonora intrusiva (a música aqui é breve, bela e possui um tremendo papel de composição de atmosfera no final do capítulo) e sem deixar nada de fora.

O episódio é uma colcha visual de momentos que nos remete a PsicosePsicose II e Psicose III, tanto na exploração dos espaços da casa, dos planos de contexto e emoção para Norman, das escolhas precisas do desenho de produção para o porão e os quartos dos protagonistas (que passaram uma pequena mudança nesta fase de readaptação de Norman desde a volta do Instituto) e nos planos de conjunto, que se tornariam recorrentes nos 4 filmes da saga do jovem Bates, desde este momento onde tudo acontece, até o seu ato final, já em idade madura, no medíocre, mas mesmo assim muito interessante Psicose IV – O Início.

Essas referências gerais à saga de Norman Bates não são gratuitas em Forever. Percebam que chegamos ao momento pelo qual tanto esperávamos e isso tem um peso muito grande para a série a partir de agora, o que nos faz aplaudir a decisão dos produtores em seguir mais ou menos o modelo de “matar a protagonista cedo” iniciado no primeiro filme e lidar com as consequências a partir deste ato. É exatamente esse o ponto onde estamos. Eu confesso que temo um pouco pelo que pode ser a 5ª Temporada, mas depois desses anos todos e pela excelência desta quarta jornada, eu tenho para mim que o temor é infundado. Será muito difícil estragar Bates Motel agora, visto que sabemos onde a produção pretende chegar. O pequeno temor vem acompanhado de uma sensação de euforia e ansiedade tremendas. Agora, estamos em terreno mais ou menos conhecido, só que vendo as coisas no “momento quando”. E este ângulo é de uma preciosidade inigualável.

O roteiro de Carlton Cuse e Kerry Ehrin é basicamente o de um filme de terror com caráter psicológico, novamente, com muitos elementos de Psicose IV – O Início. Nós somos forçados a analisar Norman sob um aspecto de maturidade que é tão bem colocada e tão repentina e tão forte que não temos abertura para achar uma falha de explicação. Nós entendemos todas as atitudes do jovem como parte inevitável do processo em que ele veio maturando ao longo da temporada e nos deparamos com praticamente todas as nuances da interpretação de Freddie Highmore, que rouba a cena em cada minuto que aparece na tela.

O pequeno ciclo mental-comportamental que se desenrola parte do lar, segue em três pequenos braços externos: Dylan; Rebecca (o pior deles, mas entendemos a fragilidade do caso e imaginamos que mais coisas virão daí, então, mesmo sendo a única parte ruim ou muito fraca do episódio, ela tem razão de ser); Romero; a sessão de terapia e a volta ao lar, com Norman entendendo o que fez à mãe de Emma e a reunião final dele com Norma, falando de um futuro idílico onde os dois enfim poderiam ser felizes para sempre.

A tonalidade pálida da fotografia (conseguida através de filtros bem claros de cor, retirados apenas na cena noturna final, que tem bastante contraste) nos dá a sensação de que a despeito do ambiente normal e aprazível existe algo muito errado com tudo. O que eu mais tenho admirado em Bates Motel é como a maioria dos diretores aliam a equipe técnica ao tema do episódio, fazendo com que ele se torna mais verdadeiro para com a história que conta e nos transmita um drama mais honesto consigo mesmo. E isso ocorre em Forever, onde temos um roteiro denso, uma temática que se encaminha para a conclusão (ou parte de uma conclusão, para ser mais exato) e ao mesmo tempo uma ambientação que coloca cada coisa em seu lugar, demarcando territórios no presente e dando-nos pistas para o que seria deles no futuro. Nós não poderíamos pedir mais que isso.

E então chegamos à sequência final. A minha vontade nesse momento é fazer uns 10 parágrafos analisando cada um dos planos e sua composição e significado para o episódio, mas eu vou me conter e fazer uma análise breve deles.

Em primeiro lugar, o espectador está tenso pelo foco familiar/emotivo/psicológico que viu até aquele momento. O rompimento de Norma com Romero causou uma reação exatamente como Norman previra, mas o contexto em que isto ocorre é completamente outro. Pela primeira vez Norman tem consciência plena e em estado de vigília de uma morte que causou e, após esse lapso — percebam que no início do episódio ele realmente toma o remédio e percebam que ele está 100% aberto durante a terapia — ele não consegue conviver com o peso da culpa. É nesse momento que o episódio nos soterra de tantas referências visuais, textuais e simbólicas vindas de vários pontos. Elas então se afunilam para um único núcleo, partindo dos rompimentos de Norma com Dylan e Romero e seguindo com semi-resoluções, como a despedida de Dylan e Norman — aquele primeiro abraço simplesmente fatiou meu coração em pedaços — e a situação de Rebecca. Então voltamos para o comportamento de Norman após se dar conta de que é um assassino. Ele enterra a mala, como parte de sua primeira resolução para o caso, mas isso não é tudo.

As cenas entre o jovem e a mãe naqueles momentos finais são muito diferentes de tudo o que vimos na série até então. Não em ações, porque elas já nos velhas conhecidas. Mas em tom dramatúrgico — Freddie Highmore e suas sutilezas para se tirar o chapéu — e em significado. O sonho de um futuro feliz, uma canção para ninar (Pearly Shells, clássico havaiano cuja a letra não poderia ser mais sintomática e perfeita para esta situação) e uma canção para morrer e matar, Mr. Sandman, igualmente perfeita e que serve como ponto central da narrativa que traz o fim de Norma, morta lentamente, mas sem saber. É belo e horrendo ao mesmo tempo. E diferente de tudo o que eu imaginei que seria.

A sequência dos planos do aquecedor quebrado até o quarto, a montagem precisamente cronometrada, a presença do fogo como elemento purificador, a intenção de Norman… tudo foi inesperado, frio, amoroso e psicopata ao mesmo tempo. Uma das melhores sequências desse gênero que eu já pude ver, tanto na TV quanto no cinema. E o final, quando Romero tenta reanimar Norma, quem, na verdade, revive, é Norman. Ali, é como se tivéssemos vendo ela ressuscitar, de fato, mas agora em outro corpo. Norma morreu. Mas Norma vive em seu filho. Forever.

A melhor maneira de contar a origem de um mito é de uma forma que também possa ser um mito. E Bates Motel fez isso neste episódio. Não importa o que venha a partir deste momento. A série já conseguiu um lugar de honra no cânone de uma das tramas mais interessantes do cinema baseadas em fatos.

Bates Motel 4X09: Forever (EUA, 2016)
Direção: Tim Southam
Roteiro: Carlton Cuse, Kerry Ehrin
Elenco: Freddie Highmore, Vera Farmiga, Max Thieriot, Olivia Cooke, Nestor Carbonell, Damon Gupton, Andrew Howard, Jaime Ray Newman, Craig Erickson, Carmen Moore
Duração: 47 min.

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