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Crítica | Batman – O Cavaleiro das Trevas: A Última Cruzada

por Ritter Fan
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estrelas 3,5

cavaleiro_das_trevas_a_ultima_cruzada_capa_plano_criticoEm meio aos atrasos e da pouca tração de Cavaleiro das Trevas III: A Raça Superior, segunda continuação da obra seminal de 1986 de Frank Miller, ele e Brian Azzarello voltaram para o passado do Homem Morcego para abordar a morte de Jason Todd, o segundo Robin. Sim, o mesmo Jason Todd que já fora alvo de morte violenta pelas mãos do Coringa no famoso arco Morte em Família, publicado originalmente entre 1988 e 1989 em Batman #426 a #429.

No entanto, estamos falando do bem definido – ainda que não oficial – universo de Batman conforme a visão de Frank Miller, que começa em Batman: Ano Um, a única história canônica e abarca a inacabada Grandes Astros: Batman & Robinas três graphic novels sob a rubrica O Cavaleiro das Trevas e, agora, A Última Cruzada, esta situada antes da aposentadoria de Batman, mas com ele já mais velho, provavelmente com 40 e poucos anos. Assim, o objetivo, aqui, é esclarecer exatamente como Robin morreu nesta linha temporal específica, algo que é mencionado muito brevemente em O Cavaleiro das Trevas quando Alfred indaga se Bruce havia se esquecido sobre o que acontecera com Jason: “Eu nunca esquecerei Jason. Ele foi um bom soldado. Ele me honrou. Mas a guerra continua.”

Muito sinceramente e para começo de conversa, este one-shot é a proverbial publicação para tirar mais leite da mesma vaca. Afinal, para que mesmo é necessário saber como Jason Todd morreu? Em que a informação enriqueceria a experiência anterior? E, mais relevante: será que descobrir os detalhes não empobreceria a experiência? Mistérios são muito mais interessantes quando são mantidos em segredo. Geram especulações, conversas, teorias e imagens em nossa cabeça que são potencialmente muito mais fortes do que qualquer explicação, qualquer detalhamento que um autor possa trazer.

Assim, Miller e Azzarello tinham a difícil missão de tornar o mistério realmente interessante. Infelizmente, porém, eles falham neste quesito essencial, pois o que se vê, no final das contas, é mais uma história boa, mas descartável, dentro do Millerverso de Batman.

Mas vamos começar pelo lado positivo. Este Batman é mesmo o Batman de O Cavaleiro das Trevas, algo que não fica abundantemente claro na leitura da polêmica Grandes Astros: Batman & Robin. Está ali o soldado que não desiste em uma guerra que não pode vencer, um guerreiro que simplesmente não consegue parar de fazer o que faz ainda que tenha consciência de que a idade vem a galope e que seu corpo quer parar. Com isso, o personagem ganha uma pegada mais humanizada, fragilizada mesmo ao longo de toda a publicação. Usando a mesma narração em primeira pessoa que marca sua obra, Miller tanto nos comunica quanto nos mostra o Batman falho, o Batman que não mais consegue enfrentar seus típicos vilões com a mesma facilidade de antes.

É emblemática, por exemplo, a primeira luta que ele tem contra Killer Croc (prefiro o nome original do que apenas Crocodilo), aqui caracterizado como um enorme brutamontes com razoavelmente leves problemas na epiderme, retirando a camada monstruosa de algumas retratações comuns do personagem e lembrando muito o Croc desenhado por Lee Bermejo na graphic novel Coringa, não coincidentemente escrita por Brian Azzarello. John Romita Jr. surpreende – considerando sua arte recente muito aquém de seu potencial – com excelentes momentos de ação que mantêm o espírito da obra original de Frank Miller, mas emprestando seu próprio traço, aqui propositalmente semi-acabados, com lápis à mostra, dando a impressão visual da crueza e guturalidade que a narrativa procura passar.

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Ainda no lado positivo, temos o Coringa, que logo no início vemos voltando ao Asilo Arkham, para alívio da população em geral. Agindo como um Hannibal Lecter, muito mais com palavras do que com ações, a narrativa do vilão é perpetuamente paralela à de Batman, com elipses temporais muito interessantes que desorientam o leitor e que vão em um crescendo de loucura com um ótimo clímax. Dessa forma, Miller e Azzarello fogem do óbvio, evitando que os arqui-inimigos se digladiem. Novamente, aqui, Romitinha trabalha inspirado na obra original, deixando claro visualmente que este é o mesmo Coringa silencioso que vagarosamente desperta de seu estado catatônico em O Cavaleiro das Trevas.

No entanto, Robin, que deveria ser o foco das atenções, já que essa versão de Miller jamais fora retratada antes, ganha pouquíssimo tempo de holofote. A narrativa logo o estabelece como arrogante e seguro de si, além de um pouco mais violento do que deveria ser, mas não há nenhuma tentativa de se desenvolver o personagem e ele acaba saindo bem mais raso do que deveria ser. Vale reparar, por exemplo, que a única exposição direta que temos de Robin é sua obediência, sua reverência ao Batman. O resto aprendemos indiretamente, seja pela narração em off do herói, seja pelas conversas de Bruce com Alfred. Tudo fica muito distante, muito seco e, sim, desimportante.

E trama central que impulsiona a narrativa, o que dizer dela? Miller e Azzarello fazem um arremedo de história, algo que parece estar ali apenas para “enrolar” até os acontecimentos finais. Sim, ela serve para estabelecer o quão frágil Batman se encontra, mas nada mais do que isso. São 40 páginas para trabalhar esse conceito dentro de um plano vilanesco que é fino e inconsequente como uma folha de papel manteiga, tornando a jornada pouco compensadora se nos abstrairmos do destino de Jason Todd em si. Talvez o formato limitado de one-shot tenha dificultado o desenvolvimento, mas tenho para mim que não, pois os autores poderiam ter reservado mais para Robin e menos para Batman, equilibrando, assim, a narrativa.

Aliás, o destino de Robin – e não darei spoilers aqui – poderá agradar ou enfurecer muita gente, ainda que desconfie que acontecerá mais do segundo do que do primeiro. Particularmente, gostei da ousadia dos roteiristas, mas teria gostado muito mais se o caminho até lá tivesse sido realmente satisfatório. Infelizmente, porém, a história é, em seu conjunto, um caça-níquel bonito e vistoso, mas não mais do que isso.

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Voltando um pouco para a arte, ainda que Romitinha realmente apresente um ótimo trabalho, há momentos em que ele erra as proporções de pernas e braços, tornando os personagens desproporcionalmente magros, às vezes quase esqueléticos, notadamente Robin, que tem as pernas desnudas. O artista nunca foi um mestre em proporções, especialmente em tempos recentes e os problemas aqui não são gritantes, mas ele poderia ter caprichado mais sem dúvida.

Outro trabalho que merece destaque é o de Peter Steigerwald na arte-final e nas cores. Sua tinta suaviza o lápis de Romitinha sem tirar o ar de inacabado da obra e suas cores, com uma paleta escurecida, claustrofóbica, dá um tom fatalista e pessimista à publicação. Mesmo quando ele abusa do branco – praticamente em todas as páginas com o Coringa – ele o faz de maneira suja que não gera contraste forte com páginas antes ou depois.

Mesmo tendo na arte seu ponto alto, A Última Cruzada não traz nada realmente de novo, nada que efetivamente acrescente à mitologia do herói dentro deste universo específico. É, infelizmente, apenas mais um bom “mais do mesmo”.

Batman – O Cavaleiro das Trevas: A Última Cruzada (Dark Knight Returns: The Last Crusade, EUA – 2016)
Roteiro: Frank Miller, Brian Azzarello
Arte: John Romita Jr.
Arte-final e cores: Peter Steigerwald
Letras: Clem Robbins
Editora original: DC Comics
Data original de publicação: 15 de junho de 2016
Páginas: 67

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