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Crítica | Becker – A Série Completa

A trajetória deliciosamente cômica de Becker.

por Leonardo Campos
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Podemos considerar Becker um drama médico? Não. E trata-la como série médica? Talvez. Com definição sem exatidão, o programa que durou seis temporadas, exibidas entre 1998 e 2004, apresenta-se como uma comédia, um pouco parecida com Friends em algumas estratégias narrativas, mas com seus requisitos próprios para se revelar atraente, divertida e “viciante”. Criada por Dave Hackel, tendo Marsha Myers e Michael Markowitz como dois dos dramaturgos mais presentes na sala de roteiristas das temporadas, a série acompanhou o cotidiano do Dr. Becker dividido entre sua clínica, algumas passagens em hospitais, seu apartamento e especialmente, o café para onde convergiam todos os demais personagens, importantes para o desenvolvimento do protagonista. Antes de avançar com a análise, no entanto, creio que haja a necessidade de responder: por que Becker não é um drama médico?

Primeiro, as diversas situações abordadas na produção eram sempre cômicas, até mesmo para os momentos de luto, perdas e despedidas para os personagens. Segundo, por mais que haja algumas variações entre um programa e outro, a concepção de drama médico está mais próxima de coisas vivenciadas dentro de hospitais, com análise de casos ao longo de todo o episódio, elementos dramáticos mesclados com acontecimentos que envolvem os próprios médicos, enfermeiros e pacientes em suas vidas pessoais. No desenvolvimento de Becker, o profissional atendeu, em seu consultório, vários casos de gripe, fraturas, menores em iniciação sexual, grávidas, pessoas acidentadas, etc. Eram atendimentos, no entanto, resolvidos ali mesmo, sem problematizações com exames, parafernálias tecnológicas e distante do foco na lógica divina que os doutores deste segmento possuem, crentes de que sejam heróis salvadores de vidas.

Na trama temos centralizado o Dr. Becker (Ted Danson), um médico clínico que atende aos seus pacientes no Bronx. Ele é chato, “reclamão”, do tipo que odeia dias ensolarados e felizes, mas detesta quando chove e os carros ameaçam enviar as suas enxurradas de lama enquanto atravessa as ruas do bairro. Ele demonstra algum interesse por Reggie (Terry Farrell), dona do café onde todo mundo se encontra. A sua demonstração de fascinação pela moça é correspondida, mas nem ela, tampouco ele, conseguem encontrar a adequação e abrir espaço para uma relação. Quem acompanha tudo isso é Jake (Alex Desert), o vendedor de revistas cego que possui um ponto dentro do estabelecimento de Reggie e é alvo das piadas sobre a sua condição física. Por também ser negro, Jake é constantemente envolvido em situações raciais, levadas na ingenuidade, mas que hoje seriam palco para debates mais fervorosos.

Quem organiza a vida do Dr. Becker é a maravilhosa Margaret (Hattie Winston), enfermeira que atua como secretária em sua clínica e também o ajuda a enfrentar os dilemas cotidianos em outros setores na vida do médico implicante e sempre a reclamar. Linda (Shawnee Smith) é a assistente do consultório e funciona como um dos principais pontos catalisadores de situações que são absurdas e muito engraçadas. Ela e Margaret formam uma dupla que na dinâmica maturidade x jovialidade ingênua, nos fazem gargalhar com muitos bons momentos. Hector (Jorge Garcia) entra na última temporada, mas não altera quase nada, pois a série já estava em sua reta final, com poucos momentos para situações diferentes do que já havíamos contemplado.

Aqui, em todos os 129 episódios de 22 minutos, as cenas são intercaladas entre uma passagem de cenário e outra por imagens do Bronx. Todo o caldeirão cultural deste bairro famoso se esparrama em diversos momentos da comédia. Agitado, com trânsito sempre em muito movimento, pessoas que se “encontram” nas ruas, metrô lotado e outras características de zonas urbanas das grandes metrópoles contemporâneas. Sem o estereótipo das gangues violentas e da pobreza extrema, o lugar hoje possui um zoológico, tornou-se ponto turístico obrigatório para muitos viajantes e também tem fama na entrega de serviços de culinária italiana. Para o Dr. Becker, mergulhado no contexto que atravessa o final de 1990 e primeiros anos da década de 2000, o bairro é uma praga, insuportável para seu humor, no entanto, um território tranquilo para os demais, afinal, não são pessoas ranzinzas e implicantes como o protagonista.

Padronizada ao longo de suas cinco temporadas, Becker contou com a direção de fotografia de Gregg Heschong, quase sempre com cenas diurnas, mas eficiente na teatralidade das passagens noturnas. O design de produção de Ray Christopher mantém os tons amadeirados no consultório de Dr. Becker, na lanchonete de Linda e nos demais cenários erguidos por Linda Cooper. Sempre trajados com os figurinos de Sharon Sampson, tanto o protagonista quanto os seus coadjuvantes estão constantemente a utilizar roupas casuais, voltadas ao estilo próprio de cada um, sem as fardas, luvas e adereços comuns aos programas de temática médica. Com trilha sonora empolgante apenas entre as passagens ou em desfechos, Becker teve condução musical de Bruce Miller, parte integrante da equipe que tal como os demais mencionados, se mantiveram no programa durante todos os seus seis anos de produção e exibição.

Além dos personagens já mencionados, não há como desgostar de Bobo (Saverio Guerra), dono de várias piadas sobre a cultura italiana, isto é, as suas origens. Frances Fisher entrega o seu charme e talento de atriz para encenar a Dra. Elizabeth, primeiro colega médica, depois namorada do Dr. Becker entre os episódios da segunda e da terceira temporada. Chris (Nancy Travis) chegou do meio para o final, substituindo Reggie, haja vista a saída da atriz do programa, uma falta considerável. Ademais, uma série simples, mas divertida, dinâmica e que deixou saudades quando terminou. Becker soube, no entanto, fechar os seus arcos sem se alongar demais e passar de divertida e interessante para cansativa e desgastada. É uma série típica dos anos 1990, tanto na cenografia quanto na sonoridade, com edição e texto também semelhante aos produtos da época, firme em seus propósitos narrativos.

Becker (Idem, Estados Unidos/1998-2004)
Criação: Dave Hackel
Direção: Vários
Roteiro: Vários
Elenco: Ted Danson, Hattie Winston, Shawnee Smith, Alex Désert, Terry Ferrel, Saverio Guerra, Nancy Travis, Jorge Garcia
Duração: 22 min. (Cada episódio – 129 episódios no total)

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