Home TVEpisódio Crítica | Better Call Saul – 3X05: Chicanery

Crítica | Better Call Saul – 3X05: Chicanery

por Ritter Fan
1,5K views

estrelas 5,0

Obs: Há spoilers da série. Leiam, aqui, as críticas dos episódios anteriores.

Ok, aprendi a lição. Nunca mais duvidarei de Vince Gilligan.

Afinal, na crítica ao episódio anterior, tive a ousadia de dizer que a história de Jimmy McGill havia perdido um pouco de sua relevância perto da de Mike, especialmente levando em consideração as repetições temáticas relacionadas com a eterna briga entre os irmãos. Em minha defesa, porém, afirmei que o showrunner provavelmente sabia disso muito mais do que eu e logo consertaria o problema. Dito e feito: Chicanery vem para mostrar o que faz Better Call Saul ser Better Call Saul.

Começando com um flashback que traz Rebecca (Ann Cusack) de volta a série depois de aparecer uma única vez lá atrás no episódio que leva seu nome, não por acaso que também marcou a metade de uma temporada, o episódio restabelece a ligação entre ela e os irmãos e ainda aborda, de forma orgânica, a “doença” de Chuck que, descobrimos, é mantida em segredo dela. Encerrado esse prólogo, brevemente vemos Jimmy contratando um mão leve com o veterinário do submundo Caldera e Kim brevemente colocando em pratos limpos a situação dela com seu cliente único Mesa Verde. Isso, então, abre as portas para que o restante da ação se passe substancialmente na sala de julgamento onde seu caso será ouvido pela Ordem dos Advogados do Novo México.

O confinamento a um ambiente só logo traz à memória a estrutura narrativa de Doze Homens e uma Sentença, especialmente quando a câmera de Daniel Sackheim brinca com planos gerais que (muito) vagarosamente vão se fechando até o clímax em que Chuck, em close-up  extremo, cede à pressão e literalmente dá uma de maluco. E o mais interessante é que o roteiro de Gordon Smith não quer nos surpreender com o momento final. É óbvio para qualquer um que, quando vemos Huell Babineaux (sim, Lavell Crawford está de volta ao Gilliganverse!) esbarrar nada discretamente em Chuck, especialmente depois da cena entre Jimmy e Caldera, algo eletrônico foi colocado no bolso do vingativo irmão mais velho. O plano de Jimmy é claro como o dia e não é atiçando nossa imaginação sobre o que acontecerá que Gilligan faz seu show. Ele se interessa pelo “como”.

E o jogo começa suavemente, com Kim interrogando Howard e começando a mostrar a animosidade entre os irmãos, algo que os três julgadores, de início, não levam muito a sério. Quando a fita é reproduzida então, a coisa piora para o lado dela, mas isso também era de certa forma esperado, assim como a chegada, com algum suspense, de Rebecca que é o momento que marca a aproximação de Chuck do precipício.

Quando Kim passa o interrogatório para Jimmy, o verdadeiro espetáculo começa. E a direção de Sackheim não tem pressa. O cenário espartano transforma-se em uma das melhores cenas de tribunal que já sagrou a telinha, quiçá até mesmo a telona (ok, eu exagero…), com os irmãos digladiando-se intensamente. Enquanto Chuck mostra toda sua inteligência em antecipar os passos de Jimmy, ele não percebe uma coisa: aquela pessoa ali de pé fazendo perguntas não é mais seu irmão James McGill, mas sim Slippin’ Jimmy (ou Jimmy Sabonete) de volta com toda sua astúcia e vigarice, manobrando sentimentos, usando um perfeito timing dramático e, claro, terminando de empurrar o irmão mais velho ladeira abaixo.

Bob Odenkirk brilha com sua magnífica atuação, realmente mudando de personagem na medida em que o interrogatório se acirra. Mas é Michael McKean que tem seu verdadeiro momento de glória aqui, com uma performance digna de todos os prêmios que a televisão puder lhe dar. De um advogado orgulhoso e arrogante, senhor da situação, ele passa para alguém que sabe que perdeu e, enfim, para o lunático invejoso, ciumento e odioso que é lá no fundo. É nesse ponto, com um inclemente e vagaroso close-up com câmera em ângulo baixo que faz seu rosto tomar praticamente toda a tela, que entendemos a dimensão do ódio de Chuck por Jimmy, algo que vem desde tenra idade e que, podemos constatar no semblante de Jimmy, seu irmão mais novo sabia esse tempo todo.

Mas o que Jimmy faz com Chuck vai muito além de ganhar um caso. Jimmy destrói Chuck. Sempre detentor de ilibada reputação, em tese incapaz de cometer um erro, Chuck é desmascarado perante a Ordem dos Advogados, sua ex-esposa Rebecca e, também, seu sócio Howard Hamlin, que percebe que foi enganado esse tempo todo (ou que, pelo menos, manteve alguém longe de ter a posse de suas faculdades mentais plenas como seu sócio, com regalias sem precedentes). O “rei está nu” e não há volta.

Essa sequência final da demolição de Chuck foi um dos momentos mais sensacionalmente catárticos que assisti em muito tempo e tenho certeza que foi o mesmo para muitos espectadores. Novamente, sabíamos que algo assim aconteceria, mas a intensidade e a abrangência do que testemunhamos é puro Vince Gilligan e ele entrega, com Chicanery, talvez o melhor episódio da série até agora.

Se eu encerrei a crítica passada brincando que não gostaria de olhar para trás um dia e perceber que Better Call Saul deveria ter se chamado Better Call Mike ou Breaking Bad Begins, eu preciso terminar meus comentários sobre este episódio afirmando que um dia chamarei Breaking Bad de “aquela série que se passava depois de Better Call Saul“. Muito cedo para afirmar isso? Não sei não, hein?

Better Call Saul – 3X05: Chicanery (EUA, 08 de maio de 2017)
Criação: Vince Gilligan, Peter Gould
Showrunner: Vince Gilligan
Direção: Daniel Sackheim
Roteiro: Gordon Smith
Elenco: Bob Odenkirk, Jonathan Banks, Rhea Seehorn, Patrick Fabian, Michael Mando, Michael McKean, Raymond Cruz, Julie Ann Emery, Jeremy Shamos, Steven Levine, Daniel Spenser Levine, Eileen Fogarty, Mel Rodriguez, Mark Proksch, Mark Margolis, Giancarlo Esposito, Steven Bauer, Ann Cusack, Lavell Crawford
Duração: 49 min.

Você Também pode curtir

Este site usa cookies para melhorar sua experiência. Presumimos que esteja de acordo com a prática, mas você poderá eleger não permitir esse uso. Aceito Leia Mais