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Crítica | “Blue Weekend” – Wolf Alice

por Handerson Ornelas
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A música britânica nunca parou de nos oferecer o mais alto nível de qualidade, mas seu olhar nos últimos anos passou – muito por influência da música americana – a ser bem mais focado no pop e no R&B, aos poucos revelando surpreendentes artistas até mesmo no hip-hop. Em meio a esse cenário, é surpreendente o respaldo que a banda Wolf Alice já ganhou em sua terra com apenas dois discos. O grupo britânico chega agora em seu terceiro disco reafirmando o poder que o britrock possui e que sempre prometeu desde seu boom nos anos 60 e revival nos anos 90. Blue Weekend possui toda a classe e imponência de uma banda que não reinventa a roda dentro do gênero, mas que constrói uma obra-prima utilizando todas as ferramentas que a história musical deixou a seu dispor.

Nesta análise, logo de início já prefiro encarar aquela que é possivelmente a maior crítica que possa ser feita a Blue Weekend e ao próprio Wolf Alice: as influências da banda são claras e em, certos momentos, até gritantes. Trata-se de argumento exaustivo dos menos aderentes à obra, algo que seria um demérito apenas se a banda não executasse com personalidade própria e atualizasse a sonoridade de suas referências para a era musical que vivemos. O shoegaze e grunge que marcaram os anos 90 dominam o espaço da obra e relembram fortemente os precursores desses gêneros. No entanto, o seu maior feito está na coerência de fundir sonoridades tão distintas em um fluxo de álbum absolutamente brilhante.

Basta checar transições de faixas como a mudança de How Can I Make It Ok? para Play The Greatest Hits. Enquanto uma faixa abusa de sintetizadores para construir uma aura etérea e magnética, a outra abusa de guitarras pesadas e vocal caótico, com a vocalista repetindo incansavelmente que o som não está alto o bastante. Como essas duas faixas conseguem soar tão bem em sequência é um dos maravilhosos mistérios e charmes que Blue Weekend possui. Não existe quebra de fluxo, toda a sequência programada para o álbum, cada pausa e detalhe de produção parece brilhantemente calibrado para manter a coerência e garantir a imersão do ouvinte.

A produção com certeza é um fator que eleva a proporção do disco, sendo comandada por Markus Dravs – produtor responsável por obras de peso como The Suburbs (Arcade Fire) e How Big How Blue How Beautiful (Florence + The Machine). Claro que as performances e composições da banda merecem mérito, mas conseguir fazer com que as guitarras e o baixo de Smile e Play The Greatest Hits tenham um espírito anárquico ao mesmo tempo que soem encharcados de groove é, em grande parte, devido ao processo de produção. Toda a construção sonora ao longo do álbum é meticulosa, se atentando a cada detalhe do instrumental, sempre evidenciando o excelente vocal de Ellie Rowsell e criando camadas de sons que promovem o mesmo fascínio que o famoso processo Wall of Sound de Phil Spector era capaz de produzir.

Canções como Delicious Things e Lipstick On The Glass carregam um peso pop extraordinário, clamando para serem entoadas como hinos modernos do pop rock. Existe uma energia nessas faixas que proporcionam um sentimento de grandiosidade típica do rock de arena, algo que não encontrava em uma banda há bastante tempo. E ainda assim, no caso de baladas relativamente simples, onde os arranjos não são o maior carro chefe, como em The Last Man On Earth com seu piano onipresente, ou Safe From Heartbreak (if I ever fall in love) com sua assinatura a la Fleetwood Mac, é impressionante como a interpretação de Ellie junto das belas letras são fatores suficiente para elevar as canções a um outro patamar.

Em um momento que explodem memes de choque cultural entre millennials e geração z, é interessante notar que Blue Weekend surge com temáticas que abordam o limiar da juventude de um millennial, apresentando um background típico de um coming of age de alguém que avista seus 30 anos chegando. Mesmo que as letras dissertem, em geral, sobre relacionamentos, o álbum é, acima de tudo, sobre a busca pelo seu próprio eu. As excelentes faixas de abertura e encerramento (The Beach e The Beach II) são prova disso. Enquanto na primeira canção Ellie parece questionadora e reflexiva, na segunda a cantora demonstra aceitação e entrega. Adicione a isso um belo cenário de praia pintado pelas densas camadas atmosféricas de shoegaze no arranjo e temos aqui um encerramento lindíssimo.

Blue Weekend possui uma cadência poucas vezes vista nos dias de hoje em álbuns de rock, sem precisar recorrer à clássica estratégia do álbum conceitual. Enquanto algumas bandas constroem álbuns despejando guitarras como se fosse a coisa mais ordinária possível, Wolf Alice acerta de forma precisa ao ser versátil e dinâmico na construção de seus instrumentais. Temos aqui uma das melhores produções vistas no rock nos últimos anos, lembrando que o que faz um clássico do gênero nem sempre é a quebra de paradigmas, mas a busca metódica pela sonoridade perfeita.

Aumenta!: Lipstick On The Glass
Diminui!:

Blue Weekend
Artista: Wolf Alice
País: Inglaterra
Lançamento: 4 de junho de 2021
Gravadora: Dirty Hit
Estilo: Rock Alternativo

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