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Crítica | Brotherhood (2018)

por Ritter Fan
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Julgar as pessoas pelas aparências é algo que fazemos todos os dias. Sim, todos nós fazemos e sim, todos os dias. Pode ser inconsciente, pode ser sem querer, pode ser de brincadeira, mas nossa capacidade de rotular pessoas como isso ou aquilo é um fato difícil de combater com efetividade. E não quero dizer aqui somente os preconceitos mais nefastos relacionados com raça, religião ou sexo, mas sim todo tipo, desde banalidades como o tipo de roupa que a pessoa usa, até a existência de tatuagens, piercings, forma de se locomover e assim por diante.

A cineasta Meryam Joobeur, em seu quarto curta (terceiro dirigindo sozinha), aborda esse pré-julgamento dentro do contexto dos conflitos armados na Síria e do surgimento de grupos extremistas islâmicos, notadamente o ISIS, mas sem localizar sua obra geograficamente no seio da questão. Muito diferente disso, a ação se passa na Tunísia, com o jovem Malek (Malek Mechergui), depois de longa ausência de casa, retornando ao lar com uma jovem de 13 anos grávida dele e que usa um niqāb completo, inclusive com luvas.

Seus dois irmãos mais novos e sua mãe recebem Malek com alegria e alívio, imediatamente fazendo-o sentir-se em casa, mesmo considerando a “estranha” silenciosamente presente. No entanto, Mohamed (Mohamed Grayaâ), o patriarca, tem uma postura imediatamente fria e distante, imediatamente acusando seu filho mais velho de abandonar a família ao deus dará, sem pensar duas vezes, para integrar-se ao Estado Islâmico na Síria. Mas o ponto focal do desconforto do pai é a presença da moça grávida com o corpo completamente escondido pela vestimenta (uma prisão!) preta, levando-o a tomar uma decisão sobre o que fazer sobre a situação mesmo que isso signifique o impensável.

O roteiro de Joobeur propositalmente vai ao extremo. Ela não está preocupada em abordar a questão de maneira nuançada e arrisca tornar sua obra simplesmente maniqueísta e sentimental, como um novelão em 25 minutos. Mas a roteirista e diretora demonstra saber exatamente como podar seu texto para deixá-lo enxuto e direto, seguindo uma lógica irrefutável que reúne o pior do sentimento humano, ao mesmo tempo que permite que o espectador se compadeça pelo profundamente pelo pai que, basicamente, nos representa, ou seja, nós, os preconceituosos que mencionei no parágrafo de abertura. Ao trabalhar a tensão de “árabe para árabe”, Joobeur parece manter o assunto próximo de seu peito, mas a grande verdade é que a discussão que ela propõe é absolutamente universal e vai muito além do que está lá em frente à câmera.

Aliás, o que está em frente à câmera é lindíssimo, com um lirismo maravilhoso oriundo de um trabalho de câmera impecável que sabe quando trabalhar planos-detalhe em oposição a tomadas gerais, além de manipular de forma precisa a profundidade de campo. Ela faz um poema audiovisual que se apoia muito mais em imagens do que em palavras, com o pequeno grupo de atores – os irmãos do filme são também irmãos na vida real -, especialmente Grayaâ, transmitindo sentimentos sem aparentemente qualquer esforço. O único porém fica por conta da elipse final que faz uso de uma montagem paralela que não funciona em sua plenitude, quebrando a fluidez narrativa e manchando apenas um pouco o resultado final que, porém, permanece firme e forte.

Brotherhood – a Irmandade do título é a de sangue e também a sanguinária – nos leva por um caminho terrível, mas esperado, que, porém, exige que paremos por um tempo para pensar nas consequências e entender os reflexos disso em nosso cotidiano. Talvez o preconceito “por reflexo” seja um mal tão profundamente embrenhado na sociedade que nem consigamos mais reconhecê-lo. E é aí que o problema realmente aparece.

Brotherhood (Ikhwène, Tunísia/Canadá/Catar/Suécia – 2018)
Direção: Meryam Joobeur
Roteiro: Meryam Joobeur
Elenco: Kais Ayari, Mohamed Grayaâ, Mouldi Kriden, Jasmin Lazid, Walid Loued, Alaeddine Mandhouj, Chaker Mechergui, Malek Mechergui, Rayene Mechergui, Salha Nasraoui
Duração: 25 min.

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