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Crítica | Cam (2018)

por Gabriel Carvalho
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Com um conceito de horror muito original, Cam é uma das produções distribuídas pela Netflix que carrega mais carga de suspense entre as que já foram lançadas, colocando uma protagonista feminina, participante de um site de pornografia ao vivo na internet, para perder sua senha e seu nome de usuário, que continua em atividade através de uma espécie de sósia. O longa-metragem, portanto, brinca com a disparidade entre nossas versões reais e nossas versões digitais, as quais podem até mesmo ser compatíveis, entrelaçadas em algum momento, mas possuem limites completamente diferentes, senão uma ausência destes. A premissa permite a personagem – após um começo um pouco desencontrado, sem norte – adentrar uma reconstrução dessa sua identidade, caçando quem estiver por trás do roubo de sua segunda personalidade, ainda sua.

As duas verdades se contrapõem, duas verdades que os espectadores do filme sempre possuem, até mesmo quando assistem algum filme na própria Netflix. A versão real de Lola (Madeline Brewer) se chama Alice, abraçando o compromisso com uma honestidade mascarada. Alice se apresenta de uma maneira particular, porém, não se entrega completamente àquele mundo de faz de contas – o desinteresse em dizer que ama os seus espectadores, por exemplo, assim como fingir o seu comportamento frente a uma câmera. A quebra entre realidade e ficcionalidade está presente nas encenações de suicídio. A versão digital, por outro lado, rasga com essas percepções controladas, ansiando o estrelato custe o que custar. O quarto para as gravações – um cenário decente com personalidade de arquétipo – é separado do contexto do resto da sua moradia, própria. Alice se vê, então, integralmente moldada por uma única vertente identitária sua – a Lola.

A intenção primeira do filme é, com excelência, fomentar um espaço de impotência. O horror subjacente é curioso porque a protagonista envolve-se em algumas situações de perigo que não questionam a sua integridade física. A invasão domiciliar em questão desmorona os nossos conceitos de arrombamento, de penetração à privacidade alheia. O cineasta apresenta uma presença fantasma dentro da casa da personagem mais assustadora que muitos espíritos de hospedagens mal-assombradas. Daniel Goldhaber sabe muito bem como trabalhar a montagem com os planos de desktop horror que aborda, evidenciando um público verdadeiramente ativo e, consequentemente, perigoso ou carinhoso, dependendo da proposta indecente encaminhada consigo. A sósia e a protagonista são complementos que se encrencam quando separados, originando uma investigação com ritmo suficiente, embora sem muito desmembramento.

O maior medo dessa geração representada é que as identidades criadas virtualmente, seja a própria versão da protagonista, seja os usuários do site pornográfico, tornem-se personificações tangíveis, como é o caso de Tinker (Patch Darragh), quebrando barreiras que deveriam permanecer intocáveis. O roteiro de Cam, de uma certa forma, não quer responder a criação narrativa de uma ameaça digital, o que mostra-se frustante, mas ainda permite a ideia de um jogo entre o tecnológico e o verdadeiro, dada essa permissão ao inconclusivo. O encerramento do filme é impecável. Madeline Brewer carrega com muita energia essas suas personagens que, enfim, podem simplesmente ser recriadas – a maquiagem como símbolo de retoque ao que está em ruínas. Uma nova conta e pronto, os problemas estão resolvidos e o recomeço é possível.

Cam – EUA, 2018
Direção: Daniel Goldhaber
Roteiro: Isa Mazzei, Daniel Goldhaber, Isabelle Link-Levy
Elenco: Madeline Brewer, Patch Darragh, Melora Walters, Devin Druid, Samantha Robinson, Imani Hakim, Michael Dempsey, Flora Diaz, Quei Tann
Duração: 94 min.

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