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Crítica | Carmen Negra (Karmen Geï)

por Luiz Santiago
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O amor é um pássaro rebelde
Que ninguém consegue domar

Carmen Negra (Karmen Geï) é a versão senegalesa, dirigida por Joseph Gaï Ramaka, do romance homônimo de Prosper Mérimée, lançado em 1845; uma obra que gerou uma das óperas mais conhecidas da História, a maravilhosa Carmen, de Georges Bizet. Nesta versão, também escrita por Ramaka, temos uma trama mais interessada em buscar elementos soltos da vida da protagonista, todos unidos por algumas poucas linhas dramáticas que nos são apresentadas logo no início, especialmente no território do amor, de onde se destaca as experiências sexuais de Karmen (Djeïnaba Diop Gaï, sensualíssima) com outra mulher.

O filme é parcialmente um musical, com o enredo majoritariamente falado, mas com cenas inteiras concebidas na base de canções, todas dentro de um caráter tipicamente senegalês, apresentadas por grupos diferentes de pessoas, da primeira à última cena da fita. Esse grande peso da trilha sonora ajuda, de certa forma, a aliviar a densidade daquilo que está sendo tratado, ao mesmo tempo que ressalta as características quase fantasiosas em relação a Karmen, uma mulher belíssima, conquistadora e que sempre encontra um modo de fugir das garras da lei ou de qualquer problema que a espreita, com exceção de um problema específico, que se oficializa no final.

O diretor, porém, não trata a personagem como uma vamp destruidora, que é basicamente o lugar onde uma abordagem menos cuidadosa desse texto poderia desaguar. É verdade que Karmen é uma “mulher de poucos limites“, mas a forma como é filmada destaca a sua libido, a sua audácia e também a sua consciência de quem é, e daquilo que pode causar aos outros, tanto que em diversos momentos vemos a personagem afastando e alertando com todas as letras aqueles que caem de amor por ela, como uma presa em uma teia, de lá não conseguindo mais sair. O caráter geral das relações em torno de Karmen não é exatamente muito animador, é verdade, mas sua exposição não vem apenas destacando esse lado, como se culpasse a mulher por todos os desastres ao seu redor.

Carmen Negra (Karmen Geï) traz uma interessante representação LGBT+ no cinema senegalês (de representações similares, neste país, lembro-me apenas do personagem estereotipado de Touki Bouki – A Viagem da Hiena) em uma história de amor, criminalidade (tratada de modo um tanto romântico) e relações interpessoais em torno de uma mulher irresistível. É uma tragédia, mas só nos damos conta disso no final.

A maneira como Joseph Gaï Ramaka ajusta os blocos dramáticos no encadeamento do filme funciona melhor no começo, mas causa grande estranhamento da segunda metade para o final, a ponto de a cena de ordem metalinguística, no desfecho, perder um bom bocado de seu impacto intencional. Ainda assim, temos aqui uma interessante representação urbana e etnicamente diferente da história de Carmen, numa linha musical culturalmente diferente daquela que Carlos Saura dirigiu em 1983, mas muito similar em qualidade geral. Apesar das confusões narrativas, é uma obra que vale muito a pena conferir.

Carmen Negra (Karmen Geï) — Senegal, França, Canadá, 2001
Direção: Joseph Gaï Ramaka
Roteiro: Joseph Gaï Ramaka (baseado na obra de Prosper Mérimée)
Elenco: Djeïnaba Diop Gaï, Magaye Niang, Stephanie Biddle, Thierno Ndiaye Doss, Dieynaba Niang, El Hadg Ndiaye, Aïssatou Diop, Widemir Normil, Yandé Codou Sène, Massamba Madieye, Ibrahima Mbaye, Coly Mbaye, Abasse Wade, Ibrahima Khalil Paye, Patricia Gomis
Duração: 86 min.

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