Home FilmesCríticas Crítica | Casa Gucci

Crítica | Casa Gucci

O novelão de Ridley Scott.

por Kevin Rick
7,6K views

Casa Gucci é, em determinados momentos, um dos filmes mais divertidos do ano. O que é uma constatação estranha, dado que o longa dirigido por Ridley Scott é uma biografia da escandalosa história da disfuncional família por trás do império da moda titular. Cobrindo quase duas décadas do final dos anos 70 até meados dos anos 90, o filme gira em torno da relação entre Patrizia Reggiani (Lady Gaga) e Maurizio Gucci (Adam Driver). Maurizio é um herdeiro que foi inicialmente rejeitado por seu pai (Jeremy Irons) por se casar com Patrizia, uma garota que o patriarca considera de classe baixa, antes de ser cortejado de volta ao negócios familiares por seu ganancioso tio Aldo Gucci (Al Pacino), que vê em Maurizio mais potencial para liderar os negócios da família do que seu filho estúpido, Paolo Gucci (Jared Leto).

Com a narrativa circulando esses cinco personagens, vemos uma mistura de traição, remorso, ganância e até assassinato. Então, humor não é necessariamente o que se espera de um drama familiar sobre ascensão e queda de um Império. No entanto, tal qual o mundo da moda, Casa Gucci é um filme extravagante. Com um elenco cheio de estrelas, trilha sonora pop explodindo em tela, looks elegantes e vulgares e um design de produção atento em destacar o luxo, o longa é um pacote de exagero festivo. Até as performances com sotaques exagerados do inglês falado como italiano funcionam para estabelecer que estamos vendo um melodrama exageradamente bobo com um senso de humor perverso.

O fato da história ser ambientada em Roma, Milão, Nova York e até mesmo nos Alpes, beneficia a parte estética da experiência, além de prover uma certa característica grandiosa ao longa. Um épico de soap opera, eu diria. É quando vemos Lady Gaga trajando uma roupa de frio gritantemente vermelha lentamente tomando seu expresso enquanto ameaça uma mulher no topo de uma montanha, ou então as várias sequências de um irreconhecível Jared Leto causando gargalhadas com sua performance de um bebezão mimado e excêntrico, que Casa Gucci ganha força quando abre espaço para o absurdo cômico. Nesses momentos, o filme até me lembra O Lobo de Wall Street, em relação à dramaturgia sobre dinheiro, manipulação e interesses serem dinamizadas através de exageros visuais e humor negro.

Qual é o problema, então? Bem, Casa Gucci parece sempre querer alternar entre o excêntrico e um “drama sério”. Acredito que isso aconteça por causa do personagem de Adam Driver, o introspectivo e quieto Maurizio Gucci. Veja, o filme contém três atos bem delineados: o primeiro que nos apresenta e estabelece todos os personagens; o segundo (e melhor) que mergulha no jogo de xadrez de traição no meio Gucci; e o terceiro focado na ascensão de Maurizio como cabeça da dinastia. Os dois primeiros atos são de Gaga, simples e puramente vistos através da sua personagem se inserido e cobiçando a fortuna familiar, criando maquinações para que ela e seu marido tomem a coroa, enquanto a excentricidade brilhante do mundo fashion e dos coadjuvantes coloridos orbitam a personagem, incluindo o ótimo contraste do sereno Maurizio nesse universo de personalidades fortes e cores vibrantes.

Mesmo notando problemas nesses dois terços iniciais do longa, como a demora para estabelecer o relacionamento doméstico de Patrizia e Maurizio ou o drama superficial de pai e filho dos Gucci, temos uma sucessão de ótimos desenvolvimentos narrativos para o clímax trágico da história real. E, então, o terceiro ato vem para descambar o filme, decidindo focar nas conversas sobre as ações da empresa, a reconstrução do império Gucci com designers e empresários vindo à tona, a expansão da marca e dificuldades de evasão fiscal, etc. Claro, é moderadamente interessante saber sobre esses elementos que dão contexto ao longa, mas, primeiro, Scott não consegue extrair muito drama desses desenvolvimentos desordenados com tangentes complicadas de trama e despejo de informações que nos levam para longe de onde o filme funciona: o círculo familiar. E segundo que imprime um tom de sobriedade que destona o enredo na falha tentativa de criar um arco de ascensão de Michael Corleone da moda com Maurizio, resultando na pior escolha da obra: tornar Gaga uma coadjuvante.

O roteiro amplo de Becky Johnston e Roberto Bentivegna parece mais próximo de uma minissérie do que um longa-metragem, com a direção de Scott caindo na morosidade de um docudrama sisudo no terceiro ato. A energia do filme despenca sempre que Gaga está fora da câmera, e a alternância de tom, especialmente no núcleo de Maurizio, entre a diversão excêntrica e o drama severo cheio de informações históricas, restringem a qualidade da obra. A consequência é um desfecho corrido e anticlimático para o principal escândalo dos Gucci: o assassinato. Casa Gucci é um filme que funciona na linguagem extravagante de dinâmicas familiares em uma história sobre interesses e traições, com a personagem de Gaga como fio condutor da narrativa. Pena que o longa quer ser muito mais do que isso sem o tempo e capacidade para ser.

Casa Gucci (House of Gucci) – EUA, 25 de novembro de 2021
Direção: Ridley Scott
Roteiro: Becky Johnston, Roberto Bentivegna (baseado no no livro The House of Gucci: A Sensational Story of Murder, Madness, Glamour, and Greed, de Sara Gay Forden)
Elenco: Lady Gaga, Adam Driver, Jared Leto, Jeremy Irons, Salma Hayek, Al Pacino, Jack Huston, Reeve Carney, Camille Cottin, Youssef Kerkour,
Duração: 157 min.

Você Também pode curtir

Este site usa cookies para melhorar sua experiência. Presumimos que esteja de acordo com a prática, mas você poderá eleger não permitir esse uso. Aceito Leia Mais