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Crítica | “Chemtrails Over The Country Club” – Lana Del Rey

por Matheus Camargo
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“It’s beautiful how this deep normality settles down over me

I’m not bored or unhappy, I’m still so strange and wild”

Chemtrails Over The Country Club se iguala a uma daquelas reflexões noturnas. Quando você martela a própria mente por palavras que não disse em certa situação, ou respostas dadas sem pensar. De que decisão me arrependo, e quais me trouxeram até aqui? Num sonho, desenhamos futuros que não viram a luz da certeza. E entre esses devaneios, Lana Del Rey nos guia no seu álbum mais intimista e reflexivo, para relembrar, mas também fechar um ciclo. Durante a última década, que a consolidou como uma das artistas mais influentes de sua geração, a melancolia nostálgica permeou cada disco, num sentimento recorrente de querer voltar atrás, e sentir falta de um passado quase utópico. E esta é a conclusão. Chemtrails é a fuga com a qual Lana sempre sonhou. Porém aqui, esse escapismo se materializa, e respira por si próprio.

White Dress nos introduz com uma memória etérea, taciturna, no ponto de partida para sua ascensão à fama. E essa é uma das melhores canções de sua carreira. Quando os vocais agudos continuam a crescer, num “grito sussurrado” desesperador, doloroso, numa construção onde os instrumentos são adicionados conforme a história avança, e isso basta para enxergar por trás de toda uma persona. É uma faixa imperfeita, que sobe, cai, em vocais falhados, que se orgulham de naufragar. Deixe que ela monte o próprio epitáfio. E sua conclusão, de que, apesar das consequências, faria tudo de novo, porque ao menos ela, enfim, se sentiu vista. Que belo jeito de abrir um álbum.

E, voltando um pouco para o presente, a faixa-título nos apresenta ao lugar que servirá de refúgio a tantos questionamentos. Curiosamente, nosso destino é a normalidade. As ambições fantasiosas de trabalhos passados se dissolvem neste lugar, tranquilo e rotineiro. Os clamores de The greatest, “Miss doing nothin’ the most of all”, se dissipam entre a tranquilidade dos dias previsíveis, “What to do next? Baby, what of it?”. Apesar de não haver tanto espaço para explorar no gênero musical, a maior parte das faixas possuem características memoráveis, como as distorções dos “We’ll be white hot forever!” em Tulsa Jesus Freak.

O motivo da minha preocupação anterior ao lançamento do álbum é, felizmente, a faixa mais fraca. Let Me Love You Like A Woman segue a fórmula clássica de uma balada clichê Faz mais sentido dentro da narrativa disco, onde o eu-lírico toma a decisão definitiva de procurar alívio nas estradas, enfatizando seus contemplativos “I’m ready to leave L.A”, mas não deixa de parecer apagada entre tantos outros pontos altos. Wild At Heart possui samples de How To Disappear, porém os instrumentos estão mais presentes, resultando num final sinfônico, despejando sentimentos poderosos e trazendo de volta a melancolia clássica da artista, que conhecemos tão bem, e nunca nos cansamos.

Dark But Just a Game é outra das minhas favoritas, numa letra reflexiva sobre o peso da fama e os twists instrumentais/rítmicos, que mudam completamente a atmosfera em que nos encontramos. Not All Those Who Wander Are Lost é uma brisa aconchegante, e a enxergo como uma irmã mais velha, amadurecida e calejada de Ride. As diferenças sonoras são brutas, mas o “espírito livre” continua intenso, vagando pelas ruas, desertos, e mentes, dando respostas para as inseguranças da figura do passado, que cantava a todo pulmão: “I’m tired of feeling like I’m fucking crazy”. A poesia banal de Yosemite me incomoda, mas não chega a atrapalhar a experiência que é estar, a esse ponto, imerso no amor sublime declarado pela artista.

O final se aproxima, e Breaking Up Slowly repete seus acordes enquanto as vozes de Nikki Lane e Lana Del Rey concebem certezas sobre a solidão, num último momento de reconstrução, que nos leva a Dance Till We Die. Aproximando-se de suas maiores inspirações, é cristalina a forma que a música faz com que ela sinta-se acompanhada das estrelas que a guiaram e a inspiraram até a fama (e sua luta para não terminar como muitos deles). Preciso ressaltar a ponte dessa faixa, que detona num artpop embargado de personalidade, me lembrando até mesmo Fiona Apple – e eu preciso de um álbum inteiro nessa pegada. 

O disco termina num doce e pontual cover de “For Free”, de Joni Mitchell, e essa é a conclusão harmônica de um álbum coeso, com uma narrativa sucinta e honesta. Mesmo não sendo tão impactante e triunfal quanto Norman Fucking Rockwell!, Chemtrails Over The Country Club é um álbum consistente, vulnerável e confortavelmente catártico, recheado de momentos onde a ideia de abrigar-se em seus campos verdes se torna tão palpável quanto a música arrebatadora que Lana Del Rey continua trazendo ao mundo. A nostalgia queima lentamente a cada palavra, cantada, gritada ou sussurrada. Memórias passam em sua frente como alguns vislumbres, e a noite chegou novamente. Pelo menos, dessa vez, temos um “rancho para chamar de amigo”, e a certeza de que não estamos perdidos por vagar em meio a essas fantasias. Muito menos sozinhos.

Aumenta!: Dark But Just a Game
Diminui!: Let Me Love You Like A Women
Minha canção favorita do álbum: White Dress

Chemtrails Over The Country Club
Artista: Lana Del Rey
País: Estados Unidos
Lançamento: 19 de março de 2021
Gravadora: Interscope Records / Polydor Records
Estilo: Folk, Art Pop, Country

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