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Crítica | Cidade Invisível – 2ª Temporada

Embrenhando-se no folclore brasileiro.

por Ritter Fan
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Toda a premissa básica da primeira temporada de Cidade Invisível – refletida inclusive em seu título – a existência de uma “cidade folclórica” nas entranhas de uma cidade grande brasileira, no caso o Rio de Janeiro é defenestrada no segundo ano da série em uma escolha que, diria, é acertada, pois retira o véu completamente, dando mais oportunidade para os meros cinco episódios mergulharem de cabeça na mitologia brasileira, deslocando a ação de um centro urbano óbvio e batido em produções nacionais, para a Amazônia a partir do Pará. Para fazer isso, a produção estabelece que dois anos se passaram desde que Eric Alves (Marco Pigossi), mortalmente ferido, desapareceu, e que sua filha Luna (Manu Dieguez), com a ajuda de Inês/Cuca (Alessandra Negrini), passou esse tempo todo procurando-o.

É em Belém do Pará que a menina faz um pacto faustiano com Matinta Perera (Letícia Spiller quase irreconhecível) e “revive” seu pai, com a reunião dos dois, já no primeiro episódio, sendo curtíssima já que Luna é o preço cobrado pela sinistra entidade que joga um jogo de desejos que envolve também os vilanescos Castro (Tatsu Carvalho) e Débora (Zahy Guajajara), esta uma literal víbora, que almejam mais do que tudo explorar o ouro da mítica e sagrada região conhecida como Marangatu. Eric, por seu turno, retorna diferente, com o poder de absorver os dons de outras criaturas mitológicas, algo que ele descobre ao retirar a maldição de lobisomem do jovem Bento (Tomás de França), mas que vai piorando na medida em que a narrativa progride.

Em outras palavras, a segunda temporada de Cidade Invisível é quase que completamente um recomeço, uma nova história que não depende de conhecimento prévio dos eventos da primeira, sendo bem sincero, o que é uma escolha sem dúvida interessante e rara. Os breves cinco episódios dão conta da história com bastante folga, a ponto de ser sensível uma certa barriga narrativa que é trabalhada com repetições de visões misteriosas e a introdução constante de novos personagens, cada um com seus poderes específicos, como é o caso de Lalo/Zaori (Mestre Sebá), que consegue ver ouro, sendo instrumental na localização de Marangatu.

Infelizmente, porém, esse “tempo extra” que os episódios têm não são dedicados a abordar o próprio Eric que, em sua busca por Luna, vai sendo transformado aos poucos em algo incerto e difuso que o roteiro, no último episódio, precisa dizer – já que isso nunca é mostrado ou desenvolvido – que é quase que a encarnação do egoísmo, mesmo que o texto não exatamente combine com suas ações. De certa forma, Eric, apesar de ser o catalisador da ação, pois é a suspeita de que ele estaria no Pará que leva Luna e Inês até lá, não demora a perder sua função na história, com sua existência pouco ou nada interferindo na progressão narrativa e, por vezes até, atrapalhando-a. Por sorte, Luna, Bento, Lalo e também um pouco Inês e Matinta, além da própria Débora e da Mula Sem Cabeça (que está mais para um cavalo sem cabeça e que desaparece completamente em determinada altura da história quando sua função narrativa é esgotada) e da ambientação na floresta amazônica com tribos nativas e a Pajé Jaciara (Ermelinda Yepario) criam o colorido necessário para manter a história viva apesar de Eric.

A mensagem ecológica, por seu turno, é uma linha narrativa sofrida. Os roteiros não conseguem – ou nem tentam – ser elegantes e sutis. Tudo precisa não só da imagem, como de uma narração que pega o espectador na mão para explicar o que é o que. Em uma série que preza por uma abordagem onírica das criaturas fabulescas brasileiras, quase nunca apresentando-as da maneira mais óbvia, é uma pena que o subtexto de proteção ambiental seja marretado de qualquer maneira na história, fazendo com que ele, ironicamente, fique artificial demais, perdido em uma temporada que tinha tudo para colocá-lo como centro das atenções.

O segundo ano de Cidade Invisível, apesar de seus problemas, mostra evolução em relação ao primeiro ao trabalhar o folclore de maneira muito mais envolvente e assertiva com o acertado deslocamento da história para o Pará. As novas criaturas e seus respectivos atores e atrizes dão vida à narrativa e a busca de Luna por um significado maior para sua vida são sem dúvida interessantes, mesmo que, nesse processo, Eric se torne um personagem sem rumo que nunca realmente diz a que veio. Quem sabe a menina não toma de vez as rédeas de uma eventual terceira temporada?

Cidade Invisível – 2ª Temporada (Brasil, 22 de março de 2023)
Criação: Carlos Saldanha, baseado em história de Raphael Draccon e Carolina Munhóz
Direção: Luis Carone, Graciela Guarani, Cassiano Prado, Luciana Baptista
Roteiro: Antonio Arruda, Rodrigo Batista, Luíza Fazio, Iris Junges, Regina Negrini
Elenco: Marco Pigossi, Alessandra Negrini, Manu Dieguez, Letícia Spiller, Zahy Guajajara, Tatsu Carvalho, Simone Spoladore, Tomás de França, Mestre Sebá, Rodrigo dos Santos, Ermelinda Yepario
Duração: 209 min. (cinco episódios)

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