Podemos usar duas referências principais para a localização dessa história na linha de eventos de Class. A primeira, e mais importante, é que Joyride se encontra depois do episódio The Coach With the Dragon Tattoo. A segunda, menos importante, é que esses eventos também se passam depois do capítulo 8 do livro O Que Ela Faz a Seguir Irá Surpreendê-lo. Escrito por Guy Adams, Joyride é um livro que visa ser bastante fiel à atmosfera da série que o origina, especialmente no tipo de ameaça alienígena incomum e da crueldade e violência que cercam os personagens. É uma obra interessante no aspecto de apresentação dos protagonistas tal qual os conhecemos na TV, e também do tipo de problemática que traz à tona: a questão da identidade.
A ação se dá em Shoreditch, Londres, em outubro de 2016, e começa com uma descrição perturbadora de alguns estudantes da Coal Hill Academy fazendo coisas que nada combinavam com suas personalidades. E por “coisas” eu quero dizer “atos de violência ou banditismo“, como roubar um carro, atropelar pessoas e colocar fogo em uma casa com a família inteira dentro. Num primeiro momento, o grupo jovem de Class (Ram, Charlie, April, Matteusz e Tanya) tem opiniões diferentes a respeito desses eventos. Charlie é o mais preocupado, achando que existe uma mãozinha alienígena em torno dessas tragédias inexplicáveis. Há uma cena repleta de ternura entre ele e Matteusz, onde conversam sobre responsabilidade, sobre fatalidades e sobre o fato de que não é nada saudável alguém querer tomar todas as dores do mundo para si, ou achar que é de sua inteira responsabilidade proteger o mundo.
A segunda parte da trama foca nas respostas e no contexto que tornou possível aquelas tragédias. E esta é a melhor parte do texto, aproximando-se bastante da literatura policial. Conhecemos o infame Garry Fletcher, sua ânsia doentia por dinheiro e sua desumanidade, aproveitando-se de uma tecnologia alienígena para criar um negócio de troca de corpos, permitindo que indivíduos ricos possam viver aventuras nos corpos de outras pessoas, a tal da joyride que dá título ao livro. Seria muito bom que o autor tivesse dado mais detalhes sobre os aliens que caíram na Terra e tinham essa tecnologia, mas dá para o leitor traçar um bom panorama apenas com as informações fornecidas aqui. É possível, claro, contestar o fato de que a espécie não tenha conseguido encontrar um gerador de energia rapidamente, mas pensando que o extraterrestre em questão estava no corpo de uma criança, não fica difícil compreender o que rolou.
Desgostei da narrativa apenas na fase final. Não achei o braço dramático com o sequestro de Ram algo bem desenvolvido ou atrativo a longo prazo. O começo me deixou intrigado, mas posteriormente não vi com bons olhos o destino que o autor foi dando ao personagem. Aliás, me pareceu no mínimo estranho ele fazer um vilão de terceira categoria com um homem maduro, gordo, recalcado e com homossexualidade reprimida, quase como uma caricatura mega estereotipada. Não me agradou essa especificidade toda e não vi sentido nenhum no constante reforço dessas características, que em nada contribuem para a trama. Como disse, é, no mínimo, estranho. Assim como é estranha a conclusão da trama. Ela tem alguns pequenos momentos de tensão, mas que são quase totalmente esvaziados de uma boa ligação com outras partes da história. É um final burocrático, todo “certinho”, como se estivesse seguindo uma receita de bolo. Gostei, no entanto, da história geral. Ela coloca os personagens em um perigo diferente, com uma progressão coerente de tempo, contexto social e idade dos protagonistas. Faltou mais rigor na arquitetura da conclusão, mas a grande ideia de Joyride consegue ser bem aproveitada pelo leitor.
Class: Joyride (Reino Unido, 27 de outubro de 2016)
Autor: Guy Adams
Capa: Head Design
Editora original: BBC Books (Série: BBC Class Novels)
336 páginas (edição kindle, pela HarperTeen)
