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Crítica | Con Air – A Rota da Fuga

Testosterona no ar.

por Kevin Rick
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Existe um momento em Con Air – A Rota da Fuga que resume o filme: algo em torno de dez prisioneiros puxam um avião gigantesco com cordas. É uma ideia inacreditavelmente estúpida, mas tão inadvertidamente hilária que, como espectador, você precisa sorrir e abraçar o absurdo. Produzido por Jerry Bruckheimer, idealizador responsável por obras como Top Gun, Os Bad Boys e A Rocha, esta é uma produção que saiu diretamente do quadro de filmes de ação que sabem que são ridículos, mas não estão nem um pouco interessados em negar sua identidade. O resultado é uma experiência de adrenalina e testosterona oitentista que entretém bastante durante suas quase duas horas de duração.

A zombaria já começa na premissa do filme. Um militar chamado Cameron Poe (Nicolas Cage) volta para casa para sua mulher grávida, mas durante uma briga de bar defendendo a si mesmo e sua noiva, o protagonista acaba matando um homem, sendo posteriormente condenado a dez anos de prisão pelo ato. Olha, de duas uma: o sistema judiciário americano não conhece o conceito de legítima defesa ou o roteiro de Scott Rosenberg usa uma das desculpas mais esfarrapadas e preguiçosas que eu já vi para compor o cenário da obra sobre um bom homem sendo injustiçado. Oito anos se passam na cadeia, a filha de Poe cresceu junto de seu penteado mullet, e agora o protagonista está em liberdade condicional, embarcando num voo para sua família. Só existe um problema: acompanhando-o estão alguns dos piores presos do mundo (porque claro que são), e no meio do trajeto os degenerados tomam posse do avião.

Uma das partes mais interessantes e divertidas da obra está na apresentação dos bandidos embarcando no avião. O filme faz a introdução de cada personagem e de seus crimes como se estivéssemos lendo uma história em quadrinhos ou vendo os vilões de um jogo de videogame. Do intelectual e maquiavélico Cyrus (John Malkovich), o militante sádico Diamond Dog (Ving Rhames), até a paródia de Hannibal Lecter com o assassino Garland Greene (Steve Buscemi), a diversidade maluca e detestável dos condenados e seus ótimos intérpretes seguram a produção, com destaque especial para as filosofias de Buscemi e o carisma de Malkovich. É incrível como um pouquinho de personalidade em antagonistas genéricos e estereotipados já dá um sabor diferente para este tipo de cenário. Até mesmo o comediante Dave Chappelle ganha uma ponta inesquecível na obra, incluindo o momento que ele bota fogo num preso de origem nativo-americana e diz: “O Último dos Moicanos está queimando!” – e, então, eu não consegui parar de rir por cinco minutos.

Há um humor meio perverso e sádico na história, pontuado por sequências surpreendentemente violentas para um blockbuster da época. Existe até uma situação que beira o mau gosto, com o psicopata Greene conversando com uma garotinha (felizmente nada acontece), mas a comédia do longa normalmente acerta a nota de não se levar a sério e de envolver o espectador na estupidez da jornada. Com tanto exagero, é curioso como Cage está, na verdade, atuando contra sua persona e a confusão geral da história, sendo mais contido e calmo. O protagonista é a personificação da macheza clássica e masculinidade clichê, totalmente sereno e falando bordões bregas, defendendo mulheres e enfrentando um avião de criminosos para ajudar seu amigo. O argumento pode ser feito que a interpretação sisuda de Cage não combina com a personalidade do longa, mas acredito que ele entende perfeitamente seu contraste de herói americano no meio da loucura, correndo por explosões e matando bandidos para chegar no aniversário da sua filha – os slow-motions e os riffs de guitarra para as correrias do protagonista adicionam toques deliciosos de cafonice.

Para além do humor, Con Air é um bom filme de ação. A partir do momento que os presos sequestram o avião, a narrativa não para, com set-piece atrás de set-piece. O cineasta Simon West não é lá um grande gênio, mas faz um bom trabalho na cadeira de diretor, misturando elementos de porradaria de filmes brucutu dos anos 80 com a energia frenética dos filmes de ação dos anos 90, no melhor estilo Tony Scott. Há muitas explosões e tudo é filmado como um videoclipe, mas West tem criatividade com escopo (as sequências com as quedas dos aviões são ótimas) e mantém uma ótima geografia das cenas (diferente da esquizofrenia do Michael Bay), sobrando elogios para montagem e os efeitos práticos das cenas de ação. Até mesmo os momentos mais ridículos, como a câmera lenta com Cage correndo no meio de explosões ou um avião “carregando” um carro com uma corda, se misturam com o sarcasmo estúpido da história.

Confesso que gostei de Con Air – A Rota da Fuga mais do que eu tinha direito. Em suas explosões e excessos violentos, falta de lógica e personagens caricatos, humor sórdido e estética quase cartunesca, o filme tem uma vontade tão grande de entreter e divertir que é difícil não se envolver pela sensação de espetáculo ridículo (no melhor sentido da palavra). Do carismático elenco, a pirotecnia e maluquices visuais, até um cineasta completamente desdenhoso com coerência e totalmente empenhado em infligir o máximo de dano com a câmera, o produtor-estrela Bruckheimer arquitetou uma produção que sintetiza o melhor do chamado “Cinema descerebrado”.

Con Air: Rota de Fuga (Con Air) — EUA, 1997
Direção:
Simon West
Roteiro: Scott Rosenberg
Elenco: Nicolas Cage, John Cusack, John Malkovich, Steve Buscemi, Ving Rhames, Colm Meaney, Mykelti Williamson, Rachel Ticotin
Duração: 111 min.

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