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Crítica | Confusões à Italiana

A farsa elevada à mais completa precariedade.

por César Barzine
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Confusões à Italiana possui muitos dos predicados que se esperam de uma comédia italiana: o nome Totó envolvido, a presença de Sophia Loren, a expressão ‘‘à Italiana’’ no título e um tom cômico caloroso e humano bastante íntimo ao gênero no país. E é neste último ponto, o mais significativo quanto à experiência do espectador e à localização do filme na comédia italiana, em que a obra desaba completamente. O calor humano predominante aqui é preso à caricatura; o que, a princípio, poderia ser um belo suporte. Contudo, acabou sendo pessimamente conduzido, se entregando a um humor tolo, um roteiro perdido e uma direção de baixo nível — aspectos amarrados por um senso de farsa que é sempre reforçado e fracassa em diversos níveis.

Pode-se dizer que tudo aqui é deslocado, fragmentado e tosco — e o prelúdio do filme sintetiza todos esses fatores perfeitamente. A sequência apresenta as expectativas de fãs do dramaturgo Eduardo Scarpetta prestes a verem uma obra dele num teatro aristocrático do século XIX — ‘‘Tem certeza de que esta é a melhor comédia de Scarpetta?’’ É preciso certa coragem para iniciar uma obra com uma autopromoção barata dessas. Por mais despretensioso que possa sê-lo, não se espera que um trabalho de cinema tenha um caráter tão publicitário e bobo como este. Aliás, tudo que Confusões à Italiana menos parece é cinema. 

Dessa belíssima introdução até os minutos finais, o longa escancara sem parar uma estética que remete àqueles seriados antigos gravados como se fossem teatro, algo bem típico da televisão dos anos 50 e 60. A proposta se encaixa com o conceito de farsesco, mas em relação à unidade e à experiência da obra acaba soando disfuncional, com a cara de um produto muito primário que nunca é usada a seu favor. Nessa mistura de televisão e teatro, vemos a concentração em cenários simplistas e artificiais aliada a diálogos triviais e situações bobas. Há um forte peso da centralização dos cenários, que se dá pela pouca alternância e variedade de espaços, o que leva a muitos acontecimentos distintos numa mesma cena, algo que ‘’espreme’’ demais o filme.

O longa acaba sendo um feixe desses fragmentos, que são dominados pela ausência de desenvolvimento de uma história, cedendo espaço para diálogos que são fins em si mesmos. É como se fosse um episódio de Chaves em que vemos algumas situações no pátio da vila, depois algumas na casa do Seu Madruga e, em seguida, algumas na casa da Dona Florinda. A grande diferença é que, neste caso, as ações são como um pastel de vento, algo sem graça nenhuma. O humor é tolo e genérico, dominado por ataques depreciativos entre os personagens e assuntos clichês como pobreza, gula e a própria farsa.

Para além da estética até aqui comentada, o farsesco se expande em Confusões à Italiana quando o roteiro abandona o predomínio dessas situações soltas e parte para o desenvolvimento de uma trama linear. É quando três personagens fingem ser uma família de nobres para um deles enganar seu sogro num jantar. A farsa, então, vai para um segundo estágio: torna-se não só forma, como também substância. A mesmice de antes não escapa, e o filme, infelizmente, continua enfadonho. Por outro lado, a mise-en-scène ganha um gás: das cores mortas e unidimensionais da primeira parte do filme, saltamos para um visual vibrante, detalhado e vultoso para acompanharmos o teatro (dentro de um teleteatro) de dois ricos pobres. Fotografia e direção de arte, portanto, acompanham essa duplicação da farsa — a tornam menos feia, mas nem por isso menos trágica.

Confusões à Italiana (Miseria e nobiltà) — Itália, 1954
Direção: Mario Mattoli
Roteiro: Ruggero Maccari, Mario Mattoli
Elenco: Totò, Dolores Palumbo, Enzo Turco, Valeria Moriconi, Franca Faldini, Liana Billi, Franco Sportelli, Gianni Cavalieri, Sophia Loren
Duração: 95 minutos.

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