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Crítica | Crush à Altura

por Gabriel Carvalho
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“Como está o tempo aí em cima?”

É complicado sair do lugar comum, dentre o que está sendo comentado a respeito do longa em questão, quando o assunto é o seu conteúdo, pontuado por grandes ambiguidades. Para explicar de maneira mais objetiva aos leigos, essa é aquela obra sobre uma garota bem alta que passa perrengues na sua vida escolar por ser alta – o nome em inglês compreende com mais precisão a simplicidade dessa sinopse, pois ele, em tradução para o português, é apenas “garota alta”. Em primeira instância, por exemplo, as pessoas parecem não estar encarando a sério a premissa do projeto, em vista de uma descrença perante sua natureza. Eu mesmo, quando assisti ao seu trailer, ri horrores pensando se tratar de uma paródia, e não que o tal argumento era de fato pautado em problemáticas sérias. Grande parte das pessoas, como eu, enxergaram o raciocínio como bobo demais para ser verdade. Ora, o tamanho de uma pessoa é realmente razão para ela ser excluída?

Quiçá a piada da obra seria, portanto, dar camadas de seriedade a um contexto risível, mas não é esse o caso. Em contrapartida a um universo de exageros que se sustentam enquanto exageros, a protagonista Jodi (Ava Michele), a tal garota alta, realmente sofre em decorrência do seu tamanho, e nos mais variados âmbitos, como naquele que tange os seus muitos questionamentos ao seu eu feminino. Há ótimas reflexões perdidas em meio dessa “baguncinha” adolescente, mas que nunca criam uma unidade e terminam soterradas dramaticamente por outros propósitos, relacionados a um quarteto amoroso que vira a real prioridade. Logo, a primeira contradição aparente na obra, que rejeita promover credibilidade ao seu fim emocional por isso, é o descrédito que o tom dela confere aos impasses da menina. Eles se convertem para virarem parte de uma esquete do Saturday Night Live, porém, que ainda permanece, em um completo contraste, querendo se vender como verdade.

Decerto que existe um interesse válido em se estabelecer verossimilhança e, consequentemente, empatia por uma personagem com traços próprios e, então, problemáticas únicas. Por exemplo, as comparações criadas entre Jodi e sua irmã mais velha, interpretada por Sabrina Carpenter, são visíveis. Ao mesmo tempo, porém, a condução da cineasta Nzingha Stewart recorre à ampliação exacerbada das rixas internas que a garota enfrenta dentro do seu dia-a-dia. Lá na escola em que estuda, Jodi é agressivamente atacada por demais alunos, que reiteram sempre a mesma piada: “como está o tempo aí em cima?”. O cerne pode não ser paródico, entretanto, os entornos são.

Quebra-se, por meio de passagens como essa, que são mais caricatas, uma possibilidade da obra, mesmo com o bom humor, averiguar de maneira sincera os dilemas da personagem em questão. No entanto, não apenas tornam-se indigeríveis as premissas postas em pauta, como o retrato de um sofrimento extremamente particular é caracterizado pela sua mera superficialidade. Já segmentos dramáticos mais pontuais anseiam convencer da sua carga, mas fracassam pela inexistência de respaldo nesse sentido, como num momento paternal. Essa – mais uma – narrativa teen de aceitação e empoderamento é demarcada por uma obra que, querendo ou não, se encerra sem respeitar a si.

O que mais seria a sequência da reunião entre pessoas gigantes, senão uma constatação cômica gratuita que apenas corrobora a um bullying do projeto consigo mesmo? Uma cena desse evento, no caso, marca pela constatação de um dos membros da organização de que ser grande é ruim. Por que escrever algo dessa espécie? Esqueçam ponderações sérias, pois o comentário é uma punch-line somente. Pior que uma parte do elenco que compõe a obra encontra-se comprometido com ela, e busca conseguir sustentar certas premissas que o roteiro não é competente o bastante para conseguir. O “crush” da personagem principal, vivido por Luke Eisner, não é impessoalizado, como costuma acontecer mediante a presença do arquétipo do garoto belo que atrai os olhares de todas as garotas ao seu redor. Ele é de verdade. Já a intérprete da protagonista, Ava Michele, garantiria credibilidade se não fossem os caminhos enormemente problemático tomados pela obra.

Consequentemente, nem que esse enredo da menina – uma modelo, porém – com 1,85 metros que se sente descartada pela sociedade terminasse transposto de maneira verossímil no longa-metragem, o resultado do conjunto seria positivo. O roteirista Sam Wolfson, para ser sincero, não parece entender muito do universo juvenil, muito menos do feminino. Os seus personagens, em grande maioria, são rasos e celebram, surpreendentemente, o quão genérico o longa acaba sendo, mesmo com a premissa original. Da protagonista repreendida pelo seu tamanho, a obra parte, em última instância, para tratar com mais relevância do garoto que ela sempre rejeitou. A conclusão soa equivocada por muitos pontos de vista, mas, estruturalmente, o seu maior pecado é ignorar o arco da protagonista. Ou seja, ignorar sensibilidade para se render à bobeira sem objetivo, visto que não só as peculiaridades são inacreditáveis, como demais elementos da romcom também.

Crush à Altura (Tall Girl) – EUA, 2019
Direção: Nzingha Stewart
Roteiro: Sam Wolfson
Elenco: Ava Michelle, Sabrina Carpenter, Griffin Gluck, Luke Eisner, Paris Berelc, Clara Wilsey, Anjelika Washington, Angela Kinsey, Steve Zahn, Rico Paris, Trina LaFargue
Duração: 101 min.

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