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Crítica | DC Elseworlds: Cavaleiros da Justiça

por Luiz Santiago
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Ambientada na Terra-18 ou Terra-1890 (obviamente, referindo-se ao ano em que as aventuras se passam neste lugar), Cavaleiros da Justiça é a versão da Liga da Justiça, no Velho Oeste americano, que tem aqui a sua formação e primeira saga através das pradarias contra o tirano Maxwell Lord, cujo sonho é construir a primeira ferrovia transcontinental utilizando de seus escravos mecânicos. Esta versão do “grande progresso americano” do empresário é interrompida quando a construção da ferrovia chega aos limites da cidade de Paraíso, que tem como xerife a temida e respeitada Diana Prince.

Para quem é fascinado pelo gênero cinematográfico Western e nos quadrinhos que se passam nesse ambiente como Zagor, Jonah Hex/All-Star Western, Tex, EscalpoBlueberry East of West, só para citar alguns, esta aventura da Liga-Faroeste será uma leitura mais que divertida. Ela apresenta todos os bons elementos do gênero como o Destino Manifesto, os saloons, os problemas de valentia e cabeças colocadas a prêmio, beberrões, homens rápidos no gatilho e, claro, o avanço do trem como chegada da tecnologia e novos tempos para as “cidades ultrapassadas”. Se fôssemos colocar isto em identificação temática, teríamos algo semelhante à “Primeira Travessia do Deserto”, vista em filmes como Uma Cidade que Surge (1939), No Tempo das Diligências (1939) e Aliança de Aço (1939); e algo em parte semelhante à “Segunda Idade do Ouro e Renovação Clássica” do gênero, vista em filmes como O Galante Aventureiro (1940), A Volta de Frank James (1940) e Consciências Mortas (1943).

A riqueza do roteiro escrito por Chuck Dixon é fortemente baseada no cinema e na tradição dos quadrinhos de faroeste, colocando em cena a destruição da cidade de Paraíso (e a emocionante morte de Oberon) para iniciar a caçada de Diana, que inicialmente pretende capturar Felix Faust, intenção que muda um pouco mais à frente, quando ela vê que é Maxwell Lord o grande responsável por uma série de cidades terem sido reduzidas a cinzas. Mas nesse ajuntamento de coisas boas já é bom colocar em cena o que faz com que a história não seja ainda melhor, ou seja, a mesma coisa que vemos em uma boa parcela das aventuras da Liga da Justiça: a frágil justificativa dos vilões e a forma como o “grande plano maligno de dominação” é encerrado. Aqui, o que demandaria algumas páginas de organização de um plano ou de maior dificuldade para os heróis, acaba sendo resolvido em alguns poucos quadros. E isso não é bom.

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A caminho da misteriosa e macabra Helldorado.

Quando inicia a cavalgada em busca de vingança e justiça (sim, as duas coisas ao mesmo tempo), Diana parece cobrar favores, reencontrar pessoas que lutaram ao seu lado antes e procurar indivíduos que sabe que adicionariam um grande poder de fogo à sua empreitada. Notem que a criação de uma Liga nessas condições é algo plenamente orgânico e, mesmo apontando para uma ameaça que apenas um dos Cavaleiros da Justiça sofreu (Diana e sua cidade), parece ser de entendimento comum que a tal “força” pode afetar a todos em pouco tempo. E não de uma maneira legal.

Juntam-se à xerife o xamã-gavião Katar; o misterioso caçador John Jones; a arma mais rápida do Oeste, Kid Flash (Wallace West, acusado de matar [vocês sabem quem] e caçado pelo agente Guy Gardner ou Kid Baltimore); o apostador dissidente Gladiador Dourado e o radical inventor Besouro. O time é muito bem equilibrado mas é pena que o autor não faça com que eles tenham maior uso de poderes/habilidades solo, caminhando diretamente para uma demonstração em conjunto. Por mais interessante que seja este ajuntamento e a luta que terão pela frente, o grande evento não recebe o tratamento que deveria ou que a história inteira nos preparou para ver, dando uma sensação de anticlímax. Isso não quer dizer que a batalha contra Lord seja ruim ou que a chegada do grupo a Helldorado não satisfaça uma parte das expectativas. Mas certamente cabia algo mais neste cenário.

A arte de J.H. Williams III e a finalização de Mick Gray se adequam com bastante facilidade às exigências do tempo e ambiente, começando da diagramação das páginas, cujas margens são todas decoradas com símbolos indígenas. A fluidez na narrativa visual também é notável, colocando em cena quadros, círculos, retângulos e painéis que se ligam à ação de maneira objetiva, sem invenções desnecessárias (algo coerente para o tempo representado) mas sem prender-se a um padrão simplista. Os desenhos dos personagens também merecem nota, embora a arte carregue um pouco dos tropeços do roteiro, evitando destacar os personagens solo e explorando pouco os quadros do conjunto inteiro, preferindo apenas pequenos times, o que não é algo ruim, apenas um fato a ser observado. O trabalho de Lee Loughridge nas cores é aplaudível, conseguindo uma ótima caraterização de atmosferas, tanto em ambientes claros quanto na escura cidade de Helldorado.

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CHOO CHOO MOTHERFUCKERS!

A linha metalinguística da história vem com uma excelente sacada de Chuck Dixon no final, embora mostre algo que já havia sido citado por Guy Gardner assim que ele chega à cidade onde sua caça, Kid Flash, estava. Ele diz para uma criança que Clark Kent “exagerava nas histórias que escrevia sobre ele“. Após os Cavaleiros da Justiça vencerem Lord e [não vencerem, mas acreditarem que venceram] Félix Fausto, eles se separam e, como na boa tradição do Velho Oeste, a grande batalha se torna lenda. Há uma leve sugestão de O Homem Que Matou o Facínora (1962) neste final, especialmente pela sugestão de narração que caiu como uma luva para o desfecho. Clark faz, inclusive, a “editoria” da história, não citando no texto o Dominador aprisionado por Lord e levado embora por Jones, pois, segundo ele, isso era “fantasioso demais“.

A máxima do “publique-se a lenda” vem ao fim de Cavaleiros da Justiça com um misto de saudade e cumplicidade pela aventura que acabamos de ver versus a versão alternativa que sabemos que será publicada. Um pouco de esperança também surge ao notarmos Fausto novamente vivo. Talvez esta seja a deixa para que no futuro tenhamos novamente este grupo (ou uma versão deste grupo) em atividade, combatendo bandidos poderosos demais para uma pessoa só. Por hora, somos deixados com as cores quentes do crepúsculo na pradaria, olhando as lendas em seus cavalos seguirem caminhos diferentes, imaginando o que cada um fará dali para frente. A velha e bem-vinda solidão dos cavaleiros solitários acena e, por fim, desaparece com eles no horizonte.

DC Elseworlds: Cavaleiros da Justiça (Justice Riders) — EUA, 1997
DC Comics

Roteiro: Chuck Dixon
Arte: J.H. Williams III
Arte-final: Mick Gray
Cores: Lee Loughridge
Letras: Bill Oakley
Capa: John Van Fleet
Editoria: Ruben Diaz
67 páginas

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