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Crítica | De Carona, com Nitro, de Luís Dill

Romance de estrutura fragmentada narra os perigos da juventude inconsequente no trânsito.

por Leonardo Campos
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Deus dá a estrada e você faz o caminho. É com esta epígrafe que o escritor Luís Dill preambula pelos primeiros passos nesta publicação sobre os impactos das tragédias de trânsito que não acometem apenas as vítimas, aqui delineada por jovens inconsequentes que assume a direção, mas dos familiares, do sistema econômico, em linhas gerais, em todo entorno quando um sinistro estabelece em cena vítimas fatais ou sobreviventes enlutados e incapacitados de continuar a vida da maneira que levavam antes da submissão ao trágico evitável. Ao longo de suas 125 páginas, De Carona, Com Nitro, nos revela o quão tais situações da mobilidade urbana podem ser evitadas, haja vista a necessidade de se seguir adequadamente as convenções do Código de Trânsito, desconsideradas por muitos condutores que se deixam levar pela emoção e acabam criando transtornos para si e para aqueles que gravitam em torno de suas posturas inadequadas.

Luís Dill, escritor gaúcho que se revela apaixonado por aventuras automobilísticas, destaca que durante as pesquisas para a sua publicação, não tinha interesse de criar uma novela moralista, tampouco delinear o que é certo ou errado, mas sugerir uma reflexão mais aventurada para as tragédias de trânsito que ceifam muitas vidas a cada ano, mesmo com as mudanças no campo das leis e propostas eficientes em educação para o trânsito. O seu foco é a educação não apenas pelo viés estatal, municipal ou por meio de instituições, mas aquilo que se faz e aprende dentro de casa, a exposição de valores e autoconsciência dos condutores contemporâneos, muitos deles, jovens emocionados com o primeiro carro, intencionados ao buscar impressionar seus pares românticos ou amizades, fixados no banco do motorista sem a dose necessária de responsabilidade para compreender que ali há um complexo sistema que requer respeito, atenção e seriedade, não apenas para proteger a si, mas para resguardar o outro.

Dividido em três partes, o livro começa com o mais extenso capítulo 07 de Outubro, Sábado, trecho de apresentação fragmentada dos personagens. Conhecemos brevemente Bruno, Ricardo, Isadora, Vitória e Nicole, bem como os seus familiares. Cada um é destacado por suas atividades cotidianas: sessões de filmes no conforto do lar, ida ao cabelereiro, bate-papo sobre seus interesses sexuais, dentre outras coisas que demarcam o dia que antecederá a tragédia. Na escrita, o autor busca sempre descrever um mesmo horário e apresentar ao leitor o que os personagens estão fazendo, numa observação que lembra a estratégia da montagem alternada cinematográfica. Assim, compreendemos as necessidades de cada um deles, os seus perfis sociais, físicos e psicológicos, todos expostos em cena como pessoas que desejam algo que o futuro recente vai ter que tirar de suas agendas, tendo em vista o grave sinistro que os acometerá no dia seguinte. É um sábado com festa e a noite promete muito álcool, drogas e diversão.

Paralelo a estes jovens, temos um casal que surge na história para colidir com os festeiros após a saída de uma festa badalada. Grávida, a esposa do condutor comemora a nova etapa no casamento quando são surpreendidos, já em 08 de Outubro, Domingo, segundo capítulo, mais curto. Uma infração envolvendo o avanço diante do sinal vermelho, somado aos efeitos do álcool e do barulho do som no automóvel dos jovens destrói vidas e causa caos na trajetória de outras pessoas, como o pai bastante protetor de uma delas, desesperado diante da cena violenta que contempla quando precisa prestar socorro aos envolvidos. Em seu tom didático, De Carona, Com Nitro traz em sua estrutura fragmentária, sinal dos nossos tempos frenéticos e dispersivos, uma interessante abordagem dos problemas que envolvem os sinistros de trânsito não apenas no Brasil, mas com um apelo mundial. Funciona como literatura independente do uso específico como recurso tomado por didatismo, incomodando apenas por algumas partes de seu design.

Publicado em 2009, o livro traz ilustrações diferenciadas e instigantes de Joãocaré, também responsável pelo design da publicação, gerenciado pelo projeto gráfico de Juliana Dischke. Algumas passagens com fontes inadequadas para a cor impressa no papel atrapalham demasiadamente a leitura e tornam a travessia um pouco acometida por obstáculos tranquilamente transponíveis, mas que podem dispersar o leitor menos envolvido, mas que deseja ir até o desfecho. O excesso de fragmentação também extrai as chances de um desenvolvimento mais orgânico dos personagens, mas não é algo que impeça a publicação de ter o seu valor literário médio, além da já mencionada perspectiva pedagógica. No desfecho, o material de apoio intitulado De Carona com a Informação, embasado pelas pesquisas de Nóia Kern, traz alguns dados estatísticos e sugestões para um bom comportamento na direção. São informações valiosas, dispostas de maneira atrativa, apesar de também ser acometido pelos problemas na ordem da visualidade de seus conteúdos em determinados trechos. Para pais, responsáveis, jovens e experientes condutores, o livro é uma lição interessante que deve ser lida e conhecida por aqueles que desejam um trânsito mais fluente e pacificado.

De Carona, Com Nitro (Brasil, 2009)
Autor: Luís Dill
Ilustrações: Joãocaré
Editora: Artes e Ofícios
Páginas: 128

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