Home QuadrinhosArco Crítica | Deadly Hands of Kung Fu #4 a 13

Crítica | Deadly Hands of Kung Fu #4 a 13

por Davi Lima
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O presente compilado traz as 9 edições da revista Deadly Hands of Kung Fu após a crítica de 3 edições feita pelo escritor Luiz Santiago. A série foi originalmente publicada entre os anos de 1974 e 1977, ao longo de 33 edições. Continuando as edições anteriores, acompanhamos as aventuras de Shang Chi, Mestre do Kung Fu, que fizera a sua estreia naquele mesmo ano de 1974, nas páginas da Special Marvel Edition #15 e 16. Dentre as críticas abaixo, a ausência da edição #10 acontece porque essa edição da revista é focada apenas no personagem Punho de Ferro, e a edição #8 não foi publicada em território brasileiro. Além disso, as edições #12 e #13 são parte de um mesmo arco de 6 edições, quando no Brasil o lançamento foi conjunto em Kung Fu n°27 (Bloch, 1978) apenas das 3 primeiras partes.

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O Círculo do Sangue da Serpente

Circle of Serpent’s Blood

Shang Chi continua sofrendo na mão de Fu Manchu, seu pai, sofrendo por ser uma lenda herdada de um ser maligno. Nesta edição o desafio é como o protagonista enfrenta a mentira, revelando sua inocência e ainda mais a maleficência de Fu Manchu, e a preocupação histórica da HQ na década de 70 com a preservação da natureza. Após a entrada de Doug Moench no argumento na história do Mestre do Kung Fu, Shang Chi cada vez mais reflete sobre sua posição de crenças quanto ao equilíbrio do Yin Yang e como isso é estranho para outras pessoas. Fora as lutas bem articuladas na cinética de movimentos do Kung Fu, a parte mais interessante dessa edição é como a cultura chinesa se envolve com Los Angeles e Nova Iorque.

O momento em que Shang Chi pega carona com os hippies em direção a Los Angeles para impedir que o pai poluísse a água da cidade é tão especial que até a diagramação preserva o movimento da van até parar no quadrinho que o protagonista está na estrada parado dando sinal. O que mais caracteriza como diferencial essa edição e essa entrada do novo roteirista são as convergências culturais, como a parte em que os hippies oferecem um baseado para Shang Chi e ele recusa com várias inspirações filosóficas do Kung Fu, se apartando para meditar. Mas junto a isso ele tem que lutar para salvar o casal de hippies, logo depois, dos chamados porcos, sejam policiais ou anti-hippies em geral. Fu Manchu pode até enganar e torturar capangas que tentam o enganar quando mentem que mataram Shang Chi, e até mesmo mentir sobre seus planos para o filho, mas tudo isso vale pelo momento pequeno de Woodstock do Mestre do Kung Fu.

Deadly Hands of Kung Fu #4 (EUA, outubro de 1974)
No Brasil:
Kung Fu n°3 (Ebal, 1974)
Roteiro: Doug Moench
Arte: Mike Vosburg
Arte-final: Al Milgrom
Letras: Artie Simek
Editoria: Tony Isabella
15 páginas

O Caminho para a Glória

Two Goals to Seek, One Path to Glory

Metalinguagem cinematográfica dentro da HQ, quando os dublês viram assassinos de verdade, ou são verdadeiros mestres de Kung Fu importados. Quando Shang Chi chega a Los Angeles a história não perde tempo contemplar na edição a reação do protagonista com o cinema retratando Kung Fu, bem popularizado na década de 70 com Bruce Lee e com o fervor do cinema de Hong Kong que Hollywood importava aparências para reproduzir filmes com artes marciais. E aí que a história vira metalinguagem quando um ator de cinema é na verdade um antigo treinado por Fu Manchu que treinava com Shang Chi, que se chamava Kwai Loo. Assim como o pai de Shang Chi busca matá-lo, o fujão Kwai Loo também é perseguido.

Nesse conflito é que a HQ ganha forma, tanto em unidade de história quando e linguagem visual. Para relacionar os filmes de ação com a passagem de Shang Chi por Los Angeles, e toda a descoberta dos bastidores desses filmes, o drama de ação da narrativa de Shang Chi, que quer salvar Kwai Loo, que ele se proteja, e toda essa ação perigosa se torna uma ambiguidade o que é real e o que é se verdade na mente do diretor de cinema nas últimas páginas. E são nelas que os quadrinhos se deformam, efetivando a ação perigosa, ao mesmo tempo que na transição da história há uma dúvida de fato se é falso, em que os dublês não estão atacando Kwai Loo, ou realmente estão matando-o. A grande força dessa edição é essa, dando voz ao que dá voz a Deadly Hands of Kung Fu que é essa popularização do Kung Fu e dramatizando no uso da metalinguagem.

Deadly Hands of Kung Fu #5 (EUA, outubro de 1974)
No Brasil:
Kung Fu n°26 (Bloch, 1977)
Roteiro: Doug Moench
Arte: Keith Pollard
Arte-final: Bob McLeod
Letras: Tom Orzechowski
Editoria: Tony Isabella
15 páginas

A Lição do Gafanhoto

Lesson of the locust!

Continuando nas preocupações civis e como Shang Chi se sai na sociedade americana com sua filosofia chinesa, essa edição é marcada pelos estereótipos narrativos de uma boa briga de dois homens por uma mulher após uma intriga no famoso drive-in, ou lanchonete americana. Ao mesmo tempo que o leitor pode facilmente associar aos imaginários que os EUA tanto propagou de sua cultura briga de gangue em Grease, West Side Story e até mesmo no recente Teen Beach Movie, ou seja, violência urbana, como a revista Deadly Hands of Kung Fu propagam aprendizados da Nova Era do orientalismo, Yin Yang, e todo o pacifismo engrenado pelos hippies no Paz e Amor, Shang Chi é o personagem perfeito para refletir sobre isso e combater o estereótipo quando ele é aderido.

Ao longo da história Shang Chi e seus recordatórios são enfáticos sobre a estranheza de como uma mulher, Genie, parece se apaixonar por ele, e ao mesmo tempo os homens que ela andam, uma gangue, provocam nele a violência que ele aprendeu a controlar. A raiva que o Mestre do Kung Fu enxerga em toda essa situação de ciúme dos baderneiros, que encurralam o protagonista, acaba afetando-o,  mas ele lembra e repete como o Kung Fu é para a defesa, não matar ou atacar alguém. Tudo tem um término muito melancólico que deixarei o leitor imaginar, especialmente lembrando do que acontece no mínimo realismo dessas brigas, como em West Side Story. Difícil não pensar nesse filme.

Deadly Hands of Kung Fu #6 (EUA, outubro de 1974)
No Brasil:
Kung Fu n°28 (Bloch, 1978)
Roteiro: Doug Moench
Arte: Mike Vosburg
Arte-final: Bob McLeod
Letras: Charlotte Jetter
Editoria: Tony Isabella
15 páginas

Os Assassinos

The Past-Assassins

A descrição perfeita para essa edição é o que Shang Chi fala: “It has been a bad night”. Não que a história seja ruim, na verdade ela é boa pelo grande desastre que o protagonista se mete, porque chega-se ao ponto que já não bastasse Fu Manchu, o pai dele, segui-lo a todo canto, de maneira que seu quimono com o Yin Yang nas costas virar uma mira constante, o Mestre do Kung Fu é especialista em se meter em encrencas entre São Francisco e Los Angeles, um grande andarilho. Nessa história Shang é atordoado pelo seu passado recente de Deadly Hands Kung Fu #2, quando uma academia de Kung Fu Karate foi destruída pela sua presença sendo sempre um alvo, e uma mulher reaparece com tapa olho a mando de Fu Manchu para atraí-lo. Mas o grande problema mesmo é mexer com um gangster ao proteger um restaurante de uma ameaça de cobrança.

Dessa forma, numa tacada só, Shang Chi já encrencado é relembrado de suas antigas encrencas, cria outra, e ainda cria quase uma guerra civil entre assassinos chineses e gangsters. Não é a toa que o final a conclusão é uma má noite, em que o fujão, vigiado pelo pai a todo momento, vai virando justiceiro e descobrindo até quando ele pode suportar seu estilo de vida entre cidades, em busca de um espiritualidade positiva.

Deadly Hands of Kung Fu #7 (EUA, outubro de 1974)
No Brasil:
Kung Fu n°24 (Bloch, 1977)
Roteiro: Doug Moench
Arte: Mike Vosberg
Arte-final: Al Migrom
Letras: Charlotte Jetter
Editoria: Don McGregor
15 páginas

A Hatred for All Seasons

Uma pena que essa edição não tenha sido publicada no Brasil, ao mesmo tempo que é possível entender quais desculpas, provavelmente de censura, ou até mesmo de encaixe cultural, que se poderia investigar para saber mais sobre as dificuldades de ser traduzido para terras tupiniquins. O grau de violência, a denúncia contra a polícia, a regeneração de um assassino, tudo isso consta-se nesse história de Shang Chi na cidade de São Francisco nos EUA. Em verdade é uma história altamente dramática, com um tiquinho de suspense e bastante investigação para se terminar numa luta, claro, que mais regenera do que machuca.  Desde da primeira página a arte de Vosburg divide por inteira um grande quadro que mostra Shang Chi caminhando nas ruas íngremes de São Francisco e ajudando uma idosa, sendo bonzinho e resolvendo tudo na conversa, sem violência, mesmo um homem cuspindo nele e agindo com preconceito. Enquanto isso acontece no lado esquerdo de uma sequência de páginas mostra um grandalhão malvado do lado direito fazendo maldades com crianças, e algumas pessoas debochando dele, até o grandalhão fazer um assassinato.

Esse é o estopim para que a narrativa toda tenha esse encontro dos dois personagens, que socialmente um representa a paz e outro a violência. Após uma luta na piscina e a maneira com Shang Chi não mata, nem mesmo busca violentar com maldade o grandalhão, ele esmorece. Essa descrição não consta nem metade do impacto que a arte de Mike Vosburg consegue captar, em que com simplicidade, e uma história dramaticamente clichê de Doug Moench, ao mesmo tempo se torna imprevisível em como é crível, e o drama precisa-se de crença para realmente acreditar que o grandalhão é consequência de uma infância maltratada e bullying durante a vida. A bondade de Shang Chi desarma o homem grande, mas como uma boa HQ de Shang Chi, ou até do Homem-Aranha, nunca acaba bem. Não contarei o que acontece, mas por muitas vezes a polícia nos EUA atira antes de falar, essa é a dica.

Deadly Hands of Kung Fu #8 (EUA, outubro de 1974)
Roteiro: Doug Moench
Arte: Mike Vosburg
Arte-final: Jack Abel
Letras: Charlotte Jetter
Editoria: Don McGregor
15 páginas

A Luta pela Verdade

A Contest of Truth

Depois de tanto tempo Shang Chi sendo o moralista em relação ao meio civil, sendo o justiceiro e confrontando defeitos sociais ao longo do roteiro escrito Doug Moench, dessa vez a moral do protagonista também pode ser confrontada por questões pessoais, de como ele quer impressionar uma criança e ajudá-la. Ainda assim, uma mentira é uma mentira, embora pensando em relação a justiça, virtude e ética é uma discussão bastante filosófica que de certa forma Doug não parece muito bem dramatizar. Por isso, quando o Mestre do Kung Fu encontra um oponente a altura, um rival civil que também luta kung fu, há um conflito diferente com relação as outras edições, algo mais pessoal com Shang Chi.

Por mais que isso seja positivo, e cria grandes histórias, ao mesmo tempo problematiza todo o percurso moral que o Mestre, o Mestre (repetição intencional) está ensinando enquanto percorre as cidades dos EUA. Talvez seja nesse tipo de edição que a conflito ocidental e oriental entra em cisão mais profunda, mesmo que não aparente. Qual base que Shang Chi tem para mentir? Se nas primeiras edições as construções do personagem muito se baseia em suas ações, uma justificativa para a mentira torna o herói em outro caminho até aqui trilhado.

Deadly Hands of Kung Fu #9 (EUA, outubro de 1974)
No Brasil:
Kung Fu n°12 (Bloch, 1976)
Roteiro: Doug Moench
Arte: Mike Vosburg, George Pérez
Arte-final: Jack Abel
Letras: Charlotte Jetter
Editoria: Don McGregor
15 páginas

Uma Lição Diferente

A Different Lesson in Blood Unchanged

O clímax da década de 70, os movimentos sociais em voga, o auge nos EUA da busca por direitos, por liberdade, e toda uma crítica a cultura violenta dos EUA, da polícia e dos militares, ainda calculando as relações da Guerra do Vietnam e as consequências disso socialmente para o país. Shang Chi, pensando apenas em popularização do Kung Fu parece nada ter a ver com isso, mas o protagonista em si é um protesto, só talvez mais pacífico do que as emoções verbais e físicas que ocorriam quando manifestantes se encontravam com a polícia.  Nisso que Doug Moench parece que sempre quis chegar com o personagem ao longo das edições que escreveu do Mestre do Kung Fu em Deadly Hands of Kung Fu.

A história toda é sobre justiça, de quem julga violência, como o próprio Shang julgou quando lutava com gangues e outras pessoas. “Higher Autority” é a expressão da narrativa, o gatilho que questiona o pacifismo do protagonista. Desse jeito, claro, não seria uma edição que resolveria todos os problemas de um protesto e suas complexidades envolvidas com justiça e violência, mas sem dúvida é uma baita história que revela a interação social da Marvel na época e como se posicionava.

Deadly Hands of Kung Fu #11 (EUA, outubro de 1974)
No Brasil:
Kung Fu n°12 (Bloch, 1976)
Roteiro: Doug Moench
Arte: Mike Vosburg
Arte-final: Jack Abel
Letras: Dave Hunt
Editoria: Tony Isabella
15 páginas

Sangue do Dragão Dourado

Blood of the Golden Dragon

Após muito viajar por questões sociais, quase literalmente, já que Shang Chi viajou muito pelos EUA, a série para num confronto, ou uma narrativa de conflito realmente “chinesa”, ao menos no estereótipo ocidental de luta e mais luta. Juntando inspirações do cinema de ação, em que o Mestre do Kung Fu agora foge em perseguição com uma mulher bonita dirigindo um carro para ele, esse arco sobre o Dragão Dourado foge bastante das temáticas sociais, mesmo preservando o mesmo roteirista. A arte muda, o que realmente diferencia a ação.

Ruby Nebres coloca muito mais sombramento, que por um lado enriquece os detalhes, mas inchar os quadrinhos. Junto a isso, a diagramação não desafoga uma narrativa que além de muito sombreamento tem muitos balões longos. Doug Moench já parece seguir outra linha editorial que Archie Goodwin propôs, em vista que a temática social dá lugar a história macguffin do título e tons de espionagem com prioridade na ação desde a primeira página. Isso dá uma cara interessante para como Shang Chi precisa ser mais esperto, em que ele é ludibriado ela mulher bonita chamado Shareen e discussões sobre o comunismo chinês é colocado em pauta num diálogo, algo que era bem mais centrado no confronto cultural nos EUA. São essas diferenças que iniciam o arco bem mais lúdico e menos temático social.

Deadly Hands of Kung Fu #12 (EUA, outubro de 1974)
No Brasil:
Kung Fu n°27 (Bloch, 1978)
Roteiro: Doug Moench
Arte: Rudy Nebres
Arte-final: Rudy Nebres
Letras: Marcos Pelayo
Editoria: Archie Goodwin
15 páginas

Sangue do Dragão Dourado (parte 2)

The Dragon Dies at Midnight

Mais urbano impossível e muito mais ARTES MARCIAIS, a parte dois do primeiro arco sobre Dragão Dourado não para de ter cenas de ação cada vez mais absurdas em ambientes cada vez mais difíceis de imaginar que se veria uma luta de Kung Fu. Não há muito conteúdo a que se falar fora a trama mais direta e pouco potente sobre um objeto desejado, à la macguffin, mas sem dúvida tem uma das melhores cenas de ação em sequência dentro de um mesmo arco.

Seguindo a primeira parte do arco, Shang Chi e Shareen fazem dupla em lutas e perseguições, agora com uma forte intensidade, também, pela base cultural que a estátua do Dragão Dourado é explicada nos recordatórios iniciais da parte da edição posta para a história do Mestre do Kung Fu. Observa-se tanta pressão na ação que as sequências soam mais diagramadas, mesmo que no preto e branco o detalhismo dos sombreamentos ainda colocam muita poluição do que realismo, ou profundidade que alguns quadrinhos representam em traço. O drama é melhor, uma crescente, mas mantém uma linha simplista de narrativa e com fragmentações de impulsão na ação pela ação, sem oscilar em qualidade da primeira parte do arco.

Deadly Hands of Kung Fu #13 (EUA, outubro de 1974)
No Brasil:
Kung Fu n°27 (Bloch, 1978)
Roteiro: Doug Moench
Arte: Rudy Nebres
Arte-final: Rudy Nebres
Letras: Marcos Pelayo
Editoria: Archie Goodwin
15 páginas

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