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Crítica | Desejo Sombrio – 1ª Temporada

A novela erótica e empoderada da Netflix.

por Felipe Oliveira
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Não seria surpresa dizer que vez e outra a Netflix experimenta dar uma apimentada em seu catálogo, trazendo até mesmo uma penca de controvérsias, como o caso do polêmico longa polonês 365 Dias. Porém, também não é muito difícil uma produção cair no TOP global dos mais vistos da plataforma, bastando um fator e outro que o coloque como sensação popular, sendo um exemplo muito recente, o filme de ação Alerta Vermelho. Sendo Gal Gadot, Dwayne Johnson e Ryan Reynolds os elementos necessários para garantir o sucesso da produção a ponto de duas sequências entrarem em desenvolvimento, trazer Maite Perroni, grande estrela de novelas mexicanas como protagonista de uma série adulta, se tornaria um fenômeno indiscutível. Assim, estreava em julho de 2020 a primeira temporada de Desejo Sombrio, atração de suspense erótico e criminal, indo além das expectativas para quem só queria uma trama quente, costurando em meio a promessa de sexo, segredos e traição, críticas sociais pertinentes. 

Aqui Perroni vive Alma Solares, uma prestigiada professora de direito focada em violência de gênero, onde vê a aparente linha perfeita de seu casamento desalinhar ao se envolver amorosamente com Darío (Alejandro Speitzer), que para incrementar esse romance, se revela um de um de seus alunos. Não podendo as coincidências pararem por aí, uma onda de crime e mistério arrasta a protagonista para descobertas cada vez mais chocantes.

Convenhamos. Descrever Oscuro Deseo (no original) se torna inevitável a sensação de que não há muito o que esperar, além de um enredo corriqueiro pronto para entregar umas cenas hots aqui e ali, mas quando Maite parecia ter outra cena emblemática se chocando contra um carro, a estrela mexicana mostra que a novela é outra. Desenvolvida por Leticia López Margalli, a atração prova a grande aposta de sua protagonista ao centralizar desde o primeiro momento os dilemas que a rodeiam e que permeiam o seu título. A dica inicial é o casamento fragilizado com o respeitado juiz Leonardo (Jorge Poza), nisso, a hesitação quanto a fidelidade do marido é evidente, a ponto do convite da melhor amiga Brenda (María Fernanda Yepes) para irem a uma festa, não poderia ser menos oportuno, sendo o ápice desse impulso, o encontro com o provocante Darío; o frescor que o cônjuge não lhe tem proporcionado.

Esse convite vai se apresentando ainda mais tentador do que curtir uma festa, e arde para ser consumido. Nesse envoltório, entra o sentido por trás do título da premissa, “desejo sombrio”; quando o dilema da vontade rebate na imagem como a mulher que Alma “deveria” manter no que ela se sente acuada, acusada, culpada em ceder ao tesão, com o sombrio agindo como se tivesse algo sujo, escandaloso, vulgar quando a mulher se permite além do papel que esperam dela, seja no falar, vestir, andar, sentar; o que se torna ainda mais exigente para Alma que é esposa, mãe e detém uma sólida carreira como professora. Bem, o nome já denuncia, Alma se compromete com essa vontade, o que é só o pontapé para o desenrolar do suspense e caos, sendo o segundo tópico central a morte de Brenda.

Dezoitos episódios foram lançados, e não precisou ir muito longe para Margalli estabelecer suas discussões sobre realidades femininas em Obscuro Deseo, e o que poderia ser aspecto para um drama batido, as aulas e palestras de Alma sobre violência de gênero funcionam como uma regência da própria criadora ao contextualizar colocações, dados e frases reflexivas sem parecer que está destoando da premissa com altos monólogos espalhados. O ponto chave foi a festa, a morte de Brenda um ato chocante que assume a direção dos acontecimentos, e o terceiro fator que define a dramaturgia, é o envolvimento de Zoe (Regina Pavón), filha de Alma. Com três protagonistas, o show transita sobre discussões de como a mulher é afetada pela cultura do patriarcado, e como isso se estende e reverbera em relacionamentos abusivos e feminicídio, mantendo a coerência do seu diálogo para um enredo que, infelizmente, se perde em meio ao potencial.

Foram quase vinte capítulos de menos de quarenta minutos de duração, e também o suficiente para Desejo Sombrio fazer o que era mais temido — e esperado — desde que foi anunciada: virar um tremendo novelão. A série cumpriu as expectativas em ser ousada, picante e novelesca, mas também surpreendeu ao traçar um caminho inesperado de discussão além das coincidências e mistério que promovia, mas ainda assim, não evitou o pior dilema que foi cair no excesso de coincidências, “tensão” e reviravoltas, onde, literalmente, cada episódio se colocava a chocar a audiência. O que bem, em algum momento foi um exercício interessante, termina como um lembrete pretensioso de sua fórmula.  Simultaneamente ao arco erótico de Alma, o trágico destino de sua melhor amiga se alinhava a narrativa como consequência de onde tudo começou, e ter este formato como guia e característica da história foi se desgastando e se perdendo no que a direção de Kenya Marquez e Pitipol Ybarra entregava momentos cada vez mais menos inspirados e mirabolantes, tudo para satisfazer a lógica que a série estava quebrando as impressões e entregando um resultado além das aparências.

No fim do seu primeiro ano, Desejo Sombrio foi renovada para a segunda e última temporada — com mais dezoito ou o dobro de capítulos, quem sabe —, promovendo um retrato erótico, discussões pertinentes e protagonismo feminino centrado. Mas apesar de tantos acertos, foi uma pena “esquecer” do potencial e sufocar os tópicos e representações por um formato calejado de querer surpreender com reviravoltas.

Desejo Sombrio – 1ª Temporada (Oscuro Deseo – México, 2020)
Criação: Leticia López Margalli
Direção: Kenya Marquez, Pitipol Ybarra
Roteiro: Leticia López Margalli
Elenco: Maite Perroni, Alejandro Speitzer, María Fernanda Yepes, Erik Hayser, Regina Pavón, Jorge Poza
Duração: 30 a 38 min (18 episódios, cada)

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