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Crítica | Diabólica, de Nelson Rodrigues

Um dos contos mais sombrios, também paradoxalmente humorado, do escritor Nelson Rodrigues.

por Leonardo Campos
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Dramaturgo, cronista e contista das hipérboles, Nelson Rodrigues sempre trouxe em suas publicações, temáticas polêmicas que o deixaram com a alcunha de tarado. Como descrito em uma das edições da coletânea A Vida Como Ela É, as suas produções trazem personagens em volúpias incestuosas, casas que abrigam cunhados e primos e irmãos, uma cidade sem motéis e encontros onde a paixão e a moral digladiam-se em prol dos desejos. O pecado, então, de tão complicado, torna-se uma obsessão em seus contos, como podemos contemplar no trágico, mas não menos humorado e sarcástico, Diabólica, narrativa sobre uma ninfeta que devasta a vida da família após transformar o seu cunhado um alvo de sua obsessão sexual.

Escrito numa época onde a hipocrisia e as tradições caminhavam juntas, pela superfície da sociedade, numa conjuntura de seres humanos acossados pelos seus anseios mais profundos, Diabólica é um conto com acontecimentos chocantes, publicado no jornal A Última Hora num contexto onde a vida sexual era consumada depois do cumprimento de uma exigência básica: o pacote que incluía o vestido de noiva e o anel de compromisso. Mas, como os críticos bem disseram e o próprio Nelson Rodrigues delineou, neste cenário, existiam os casais perfeitos, compostos pelo marido, sua mulher e o (a) amante. E é assim que contemplamos o desenvolvimento desta narrativa que termina em dor e morte, mas libertações.

Tudo começa no dia do noivado de Dagmar e Geraldo. Eles trocam as alianças, alguns momentos de afeto, mas num rompante, a moça dá o seu golpe errado: para ela, não existe homem fiel. Por isso, sabe que no futuro casamento, a traição é uma possibilidade. Algo quase certo. Insegura, ainda reforça. Geraldo pode trai-la com qualquer mulher do Rio de Janeiro, menos Alicinha, a sua irmã, uma jovem com aura angelical, considerada sagrada para Dagmar. O moço, até então, não havia despertado para a cunhada adolescente, mas depois da fala da noiva, começa a despertar um desejo contido com toda força, antecipação para a inevitável traição que culminará na morte de um dos personagens e na destruição da família.

Alicinha seduz o quanto pode, leva o cunhado para a cama e começa exigências que tornam o cotidiano de Geraldo insuportável. O que seria uma aventura curiosa e fugaz se transforma num desejo obsessivo da garota em transformar o cunhado em seu amante fixo, situação que culmina no assassinato da jovem com um punhal. Sim, Nelson Rodrigues descreve com habilidade o assassinato, um crime que deveria ser contemplado com assombro por Dagmar, numa reversão de expectativas em seu desfecho, com a noiva a clamar pela delegacia agradecendo ao companheiro pela morte de sua irmã, um anjo maligno que ameaçava o seu casamento. Com humor e desenvolvimento sádico, o escritor narra com habilidade jornalística os fatos e nos entrega um de seus melhores contos, transformado em uma das histórias do longa-metragem Traição, bem como num dos episódios da série televisiva A Vida Como Ela É.

Diabólica — Brasil, 1958
Autor: Nelson Rodrigues
Editora: Nova Fronteira
05 páginas

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