Home TVEpisódio Crítica | Doctor Who – 5X01: The Eleventh Hour

Crítica | Doctor Who – 5X01: The Eleventh Hour

por Rafael Lima
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Em uma discussão nos comentários do Plano Crítico, um leitor perguntou por onde começar a assistir Doctor Who. Enquanto a maioria naturalmente apontou para a 1ª temporada da Nova Série, um usuário sugeriu que a 5ª Temporada seria um bom ponto de partida, o que foi visto por muitos como uma sugestão absurda. Afinal, como assim começar a assistir uma série pela 5ª Temporada? Mas ao observarmos a série, percebemos que de tempos em tempos, ela se renova de tal forma, que cria portas de entrada para um novo público. A Série Clássica fez isso ao menos uma vez, com Spearhead From Space. É também o caso de Rose, que deu início à Nova Série. E é o caso de The Eleventh Hour, o início do mandato de Steven Moffat como Showrunner, e da era do 11º Doutor de Matt Smith. O episódio acompanha o Doutor recém-regenerado fazendo um pouso forçado em uma cidade inglesa, onde recebe a ajuda de uma menina chamada Amelia Pond, que está assustada com uma estranha rachadura na parede de seu quarto. O Doutor promete ajudá-la assim que fizer alguns reparos em sua TARDIS, mas quando o Time Lord retorna, Amelia, agora atendendo pelo nome de Amy, já é uma mulher. Além disso, um fugitivo alienígena escapou pela rachadura na parede do quarto da moça, o que põe em risco todo o planeta.

Ainda que parta do ponto em que The End Of Time: Part Two terminou, The Eleventh Hour funciona como a sua própria história, praticamente não tendo amarras com o passado recente da série, excetuando, o fato de que o 11º Doutor passa a maior parte do episódio vestindo os farrapos de seu antecessor. A história apresenta não só um novo Doutor, mas também uma nova Companion, dando assim a sensação de renovação para a série. Isso não significa que Moffat ignora os primeiros anos, afinal, diferente de seu antecessor, o novo showrunner não precisa ter a preocupação primordial de reapresentar a premissa e a mitologia do programa para toda uma nova geração que nunca havia visto um episódio de Doctor Who na vida. Mas a Premiere coloca o passado da Nova Série na mesma caixa que a Série Clássica, como fica claro quando vemos o 11º Doutor surgir com o seu novo figurino através de uma projeção que mostra cada um de seus antecessores. O roteiro assim define que a série tem um passado para quem quiser conhecê-lo, mas que esse é um capítulo completamente novo da história do show.

Mas existe um esforço para fazer essa transição ser a mais suave possível, já que como a maioria das Premieres da era Davies, temos uma aventura situada na Inglaterra contemporânea, calcada no humor. Não podemos esquecer que o próprio Moffat foi parte importante do mandato de seu antecessor, e ecoa o que havia construído, já que o conceito que guia a relação de Amy e do Doutor do “amigo imaginário” de uma menina, que retorna para a vida dela na vida adulta, remete a The Girl In The Fireplace, escrito por Moffat,. Mas se trabalha com familiaridade, The Eleventh Hour também demonstra a nova abordagem de Moffat para a série. A aura de fábula, tão presente nos episódios que ele já havia escrito para o show, é explorada pelo status de amigo imaginário assumido pelo Doutor. Da mesma foram, os medos infantis caros ao roteirista também são tratados tanto dentro do contexto do episódio quanto na trama central do novo ciclo.

A trama do episódio é uma desculpa para estabelecer a dinâmica entre o novo Doutor e sua Companion. Ainda assim, o texto constrói de forma inteligente o crescendo das apostas dramáticas em torno do antagonista, e a resolução, que vê o 11º Doutor derrotando o vilão da trama, apenas para fazer os Atraxi fugirem com a menção de sua história, dá um peso extra a esse Doutor. Diferente de seu antecessor, Moffat não tem interesse nos detalhes do cotidiano da vida da Companion antes de se juntar ao Doutor. Não que Amy seja desconectada da vida normal, mas diferente de Rose ou Donna, ela não está fugindo do tédio do cotidiano, mas sim de um rito de passagem que necessita de maturidade e coragem. Este é um ponto vital da visão de Moffat, pois a influência do Time Lord na vida de Amy é menos sobre como a jovem enfrenta ameaças cósmicas, e mais sobre como ela acha a coragem para lidar com questões mais íntimas, como as suas inseguranças em relação ao seu amadurecimento, simbolizadas no casamento.

Mas o importante em uma aventura de estreia de um Doutor é estabelecer as bases para o novo protagonista, e isso Matt Smith faz muito bem. O ator traz uma energia maníaca para o 11º Doutor ao longo do episódio, construindo um personagem que raramente fica parado em cena. Smith ainda carrega certa influência da leitura de David Tennant do personagem, mas percebemos os sinais que tornariam o 11º Doutor único. Entre estes sinais, estão os nuances mais infantis e atrapalhados que o ator concede para a sua versão do Gallifreyano, e que seriam ainda mais explorados nos episódios seguintes, ainda que este ainda seja um Doutor que sabe ser ameaçador quando precisa, como percebemos na brilhante cena em que Smith assume de vez a alcunha do Doutor.

 O Time Lord de Smith encontra na Amy Pond de Karen Gillan a parceira de cena perfeita, com a química da dupla sendo espontânea. Gillan vive Amy de forma grandiloquente, de modo que a sua energia de cena combine com a entregue por Smith. A atriz dá à companion uma personalidade forte e atrevida, que contrasta com a postura mais bobona do 11º Doutor. Ao mesmo tempo, a atriz articula as características mais ácidas da garota com uma vulnerabilidade que sugere que Amy ainda carrega as suas inseguranças de infância. Lembremos que essa é a Companion que ficou conhecida como a garota que esperou, fazendo de Amy uma personagem marcada pelo Doutor antes mesmo de pôr os pés na TARDIS, o que pode ser visto no trabalho de Gillan.

O episódio é dirigido por Adam Smith, que faz um trabalho competente em transmitir a sensação de maravilhamento diante do fantástico proposto pelo roteiro, ao mesmo tempo em que trabalha bem os tempos cômicos do episódio. Ainda nos aspectos técnicos, destacam-se a fotografia, que abraça o tom de fantasia perseguido por essa era, especialmente nas sequências noturnas; e a trilha de Murray Gold, que também acompanha essa proposta de fábula e reinventa as composições da série, ao trazer melodias que evocam uma atmosfera de fantasia. Vale destacar o novo design da Sala de Controle da TARDIS, na primeira mudança do interior da nave promovida pela Nova Série, que traz um ambiente mais espaçoso, que parece apropriado para um Doutor que trabalharia bastante com o humor físico, ao mesmo tempo em que os detalhes Retro adicionados ao painel pela direção de arte, sugerem uma ciência mais mágica do que propriamente voltada para a ficção científica mais tradicional.

The Eleventh Hour é uma ótima primeira aventura para o 11º Doutor, construindo de maneira eficiente as bases do novo protagonista, e da sua relação com a sua nova companheira. O roteiro introduz de forma sutil a trama central da temporada, além de estabelecer o tom que a série iria adotar nos próximos anos, com um flerte cada vez maior com a fábula de fantasia. Trata-se de uma Season Premiere que ao mesmo tempo em que traz elementos familiares para o público da Nova Série, aponta para uma abordagem nova e distinta para Doctor Who. O que nos leva a questão que discutimos na introdução desta resenha. The Eleventh Hour traz basicamente o mesmo programa que o público acompanhou nos primeiros anos da Nova Série, mas também é um programa diferente, que não exige necessariamente um conhecimento prévio para que se possa assisti-lo. É o que eu chamo de porta de entrada, e nesse caso uma ótima porta de entrada.

Doctor Who- 05X01: The Eleventh Hour (Reino Unido, 03 de Abril de 2010)
Direção: Adam Smith
Roteiro: Steven Moffat
Elenco: Matt Smith, Karen Gillan, Arthur Dervall, Caitlin Blackwood, Nina Wadia, Marcello Magni, Annete Crosbie, Tom Hopper, Arthur Cox, Olivia Colman, David de Keyser, William Wilde
Duração: 65 Minutos.

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