Home TVEpisódio Crítica | Doctor Who – 5X11: The Lodger

Crítica | Doctor Who – 5X11: The Lodger

Dividindo um apartamento com o Doutor.

por Rafael Lima
462 views

Ao assumir o comando de Doctor Who, o showrunner Steven Moffat foi rápido em estabelecer o Doutor como um amigo imaginário; um ser de fantasia que trazia aventuras fantásticas para pessoas comuns, inspirando-as a se tornarem as melhores versões de si mesmas. Em primeira instância, não é algo tão distinto do que a Nova Série fez em seus anos anteriores, onde gente comum tornava-se capaz de atitudes de bravura que salvavam mundos após conhecerem o Doutor; entretanto, a Era Moffat trataria dessa questão de forma um pouco diferente. Essa abordagem torna-se clara nos episódios que contam com a participação do personagem Craig, vívido por James Corden, onde as ameaças alienígenas que ele involuntariamente enfrenta ao lado do 11º Doutor são apenas uma ponte para que este homem enfrente os desafios de sua própria vida.

Na trama de The Lodger, o Doutor fica ilhado na cidade de Colchester, no ano de 2010, após uma tentativa fracassada de pousar a TARDIS. Com Amy presa na nave em um Loop de materialização, o Doutor precisa descobrir o que impediu a TARDIS de se materializar, se quiser salvar a sua amiga e ter a sua máquina do tempo de volta. Para isso, ele se torna inquilino do simpático Craig Owens, um tímido morador da cidade que acaba acidentalmente envolvido na investigação de seu novo colega de apartamento, que vira a sua vida de cabeça para baixo. Escrito por Gareth Roberts, The Lodger adapta a história em quadrinhos homônima escrita pelo próprio roteirista para a Doctor Who Magazine, que via o 10º Doutor indo morar com Mickey Smith após também ficar preso na Terra do século XXI. Assim como na HQ, a história de Roberts é orientada principalmente pela comédia, ao criar uma série de situações cômicas que trabalham a total inadequação social do Time Lord e os constrangimentos que isso provoca no pobre Craig, que fica cada vez mais consternado com o comportamento esquisito de seu novo inquilino.

O roteiro trabalha bem com os tropos do colega de quarto inconveniente, um clichê típico em comédias que é articulado de forma competente com os próprios elementos e mitologia da série. Mas mais do que situações cômicas, o texto cria um bom arco de desenvolvimento para Craig, que precisa reunir coragem para confessar a sua paixão pela amiga Sophie. É um arco simples, mas muito bem conduzido, além de trazer uma interessante articulação com o principal antagonista do episódio. O computador de bordo que está sobre a casa de Craig tem selecionado vítimas que buscam a mudança ao manifestarem o desejo de sair de Colchester, o que coloca a mudança como um fator de risco. É por isso que Craig nunca se torna um alvo da máquina em primeira instância, já que não deseja se mudar, e embora queira muito, também não consegue mudar o seu relacionamento com Sophie. É irônico, portanto, que o desejo de permanecer do casal que derrota o vilão só é fortalecido quando ambos confessam os seus sentimentos, assumindo assim o risco da mudança em seu relacionamento.

Amy tem uma participação menor na trama, passando a maior parte da narrativa confinada na TARDIS. Apesar disso, não podemos considerar The Lodger um Companion Lite (histórias com participação mínima da companion), tendo em vista que a companheira se mantém presente ao longo de toda a trama, tentando com pouco sucesso lidar com os controles da nave na ausência do Doutor. Ainda que não tenha o mesmo espaço que seus colegas de elenco nesse episódio, Karen Gillan e a direção conseguem manter os blocos estrelados por Amy divertidos o suficiente para não soarem deslocados do resto. 

A premissa do episódio também permite que Matt Smith exercite como nunca a natureza alienada e infantil de sua versão do Doutor, gerando passagens hilárias; como aquela onde o Time Lord joga futebol com os amigos de Craig, ou a construção de uma máquina para rastrear a anomalia que prende a TARDIS feita com objetos coletados no lixo. Ao mesmo tempo, é tocante o afeto genuíno que o viajante do tempo passa a nutrir por Craig, mesmo que como em toda comédia de colega de quarto, isso o leve a ser muitas vezes invasivo. Mas se o Senhor do Tempo de Smith brilha exibindo a sua ingenuidade cômica, muito disso se deve ao suporte oferecido por James Corden, que faz de Owen um personagem absolutamente identificável, cujas reações incrédulas ao comportamento do 11º Doutor são vitais para a efetividade dessas passagens.

O episódio é comandado por Catherine Morshead em sua última direção para a série até o momento (2022), que sabe valorizar muito bem o timing cômico de seus atores, mesmo que não faça um trabalho tão acurado quanto o que realizou em Amy’s Choice. Ainda nos quesitos técnicos, vale destacar o trabalho de edição, que sabe potencializar muitas das ideias apresentadas pelo roteiro, como a sequência do jogo de futebol, ou a montagem paralela que contrapõe duas conversas telefônicas ocorridas entre o Doutor e Amy, e Craig e Sophie.

The Lodger é um episódio muito divertido, e que abraça sem medo a sua natureza cômica, ao introduzir um dos mais carismáticos e relacionáveis personagens a surgir na era do 11º Doutor. Além disso, o episódio escancara de vez a forma como a era Moffat enxerga o Doutor como essa figura de conto de fadas que entra na vida de pessoas comuns para através de desafios fantásticos, mostrar que elas possuem a força e a coragem de enfrentar os desafios assustadores da vida normal.

Doctor Who – 5X11: The Lodger (Reino Unido, 12 de Junho de 2010)
Direção: Catherine Morshead
Roteiro: Gareth Roberts (Baseado em sua própria HQ)
Elenco: Matt Smith, Karen Gillan, James Corden, Daisy Haggard, Owen Donovan, Babatunde Aleshe, Jem Wall, Karen Seacombe, Kamara Bacchus
Duração: 43 Minutos.

Você Também pode curtir

Este site usa cookies para melhorar sua experiência. Presumimos que esteja de acordo com a prática, mas você poderá eleger não permitir esse uso. Aceito Leia Mais